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Jesuíta português levou descobertas de Galileu até à China

Em 1615, cinco anos depois de Galileu Galilei ter anunciado as suas descobertas em livro, o jesuíta português Manuel Dias publicou na China o seu livro Tien Wen Lueh. Foi através deste livro que as novidades científicas do astrónomo florentino chegaram pela primeira vez ao conhecimento dos intelectuais chineses. A obra está a ser estudada por dois portugueses

O livro é um diálogo entre um ocidental e um chinês. Às perguntas do oriental, o primeiro fala de astronomia e de cosmografia e relata, no fim, em pormenor, as descobertas de um grande sábio ocidental, com um "maravilhoso instrumento", que mostra "a Lua mil vezes maior". O livro, escrito em chinês, tem por título Tien Wen Lueh (Tratado de Questões sobre os Céus) e foi publicado na China, em 1615. O seu autor chamava-se Manuel Dias e era um jesuíta português. Foi pelo seu punho que a China tomou conhecimento, pela primeira vez, das descobertas realizadas por Galileu, cinco anos antes, graças às observações com telescópios.

"Este é um episódio central da ciência portuguesa, no que ela produziu de disseminação do conhecimento no mundo", explica o físico Henrique Leitão, investigador do Centro de História das Ciências da Universidade de Lisboa que, juntamente com o sinólogo português Rui Magone, do Instituto Max Planck de História da Ciência, em Berlim, está a fazer o primeiro estudo detalhado sobre aquela obra de Manuel Dias e as suas repercussões no Oriente.

Certamente um dos primeiros episódios de globalização do conhecimento e de descobertas científicas - praticamente em tempo real, já que uma viagem entre a Europa e a China demorava naquela época cerca de um ano - a publicação de Tien Wen Lueh não era ignorada. "O livro estava referenciado, mas o seu conteúdo científico nunca tinha sido lido e analisado, como estamos a fazer", conta Henrique Leitão.

O estudo dos dois investigadores portugueses, que já têm novidades para contar, será publicado ainda este ano, em inglês, e disponibilizado online, no âmbito de um projeto do Instituto Max Planck. O objetivo é pôr na Internet, ao longo dos próximos anos, vários textos científicos escritos na China por autores portugueses. Tien Wen Lueh, de Manuel Dias, e o seu estudo crítico serão os primeiros.

Mas o que pode já dizer-se daquela obra do jesuíta português?

Apesar de conhecida a sua existência, a sua leitura por historiadores da ciência nunca tinha sido feita. Por isso, neste momento, já é possível afirmar que, em Tien Wen Lueh, Manuel Dias fala de todas as descobertas que o próprio Galileu tinha anunciado, apenas cinco anos antes, em 1610, no seu livro Siderius Nuncius. Estão lá as novidades de que a Lua tem promontórios e depressões, que Vénus tem fases, como a Lua, que há muito mais estrelas no céu do que aquelas que se vêem a olho nu, que Júpiter tem duas pequeninas estrelas ao lado (os seus satélites) e que Saturno tem uma configuração estranha, com um corpo de cada lado - Galileu não percebeu que eram anéis. O jesuíta português não menciona, no entanto, o nome de Galileu, talvez porque isso não fosse relevante para os leitores chineses.

A publicação do seu livro na China, essa sim, foi relevante. "Até ao século XVIII, foram feitas várias edições para as bibliotecas imperiais, o que demonstra a sua importância junto dos intelectuais chineses", conclui Henrique Leitão.

 

O percurso de Manuel Dias

Manuel Dias nasceu em Castelo Branco, em 1574. Tornou-se jesuíta e, em 1601, partiu para o Oriente como missionário. Durante três anos viveu na Índia e, daí, rumou a Macau, onde ficou durante mais seis anos, como professor de filosofia e teologia, no colégio local da ordem.

Em 1613 está em Pequim e é por volta dessa altura que começa a trabalhar no livro Tien Wen Lueh, de acordo com o físico Henrique Leitão, que reconstituiu os passos do missionário português. Com a assistência de chineses convertidos, Manuel Dias concluiu o livro, em 1614, e publicou-o no ano seguinte, tudo indica que, em Pequim.

Sem um treino formal em matemática, como o que tinham na época os jesuítas matemáticos especializados nesta ciência, Manuel Dias poderá, no entanto, ter tomado contacto com noções de cosmografia durante os seus anos de estudo, como era comum na altura, nas escolas da ordem, explica Henrique Leitão. Seja como for, os conhecimentos que revela no livro sobre fases da Lua, eclipses ou latitudes (TienWen Lueh é o primeiro texto escrito em chinês que fala de latitudes) mostram que estava familiarizado com a astronomia da época.

A rapidez, para a altura, com que as descobertas de Galileu chegaram até ele, à China, atesta por outro lado a eficácia da rede de conhecimento que os jesuítas também possuíam. Em Lisboa, o Colégio de Santo Antão era um dos seus expoentes.

 

Filomena Chaves
In Diário de Notícias (1) (2)
05.04.09

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Matteo Ricci, jesuíta italiano, astrónomo







































































 


 

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