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Cinema: "De cabeça erguida"

Imagem Cartaz (det.) | D.R.

Cinema: "De cabeça erguida"

Malony é uma criança problemática. A mãe (Sara Forestier) abandona-o aos seis anos, largando-o num futuro caracterizado por contínuas decisões da juíz de menores (Catherine Deneuve).

Já adolescente, Malony (Rod Paradot) recusa toda a convenção social, a sua raiva é impossível de conter, a sua existência joga-se permanentemente num precário equilíbrio entre uma liberdade impossível de gerir e a reclusão em centros de recuperação e prisões para menores.

A sua cabeça é a de um pássaro que caiu (mal) do ninho. Com uma perturbadora acuidade, a realizadora (e atriz) Emmanuelle Bercot mostra o percurso da delinquência.

Malony é um adolescente nervoso, incapaz de enfrentar a mais pequena contrariedade, sem nenhuma paciência para terminar um projeto, aterrorizado pelos gestos de verdadeira ternura, falho de vocabulário que lhe permita exprimir os seus tormentos. Resta-lhe o desconforto do presente, a agressividade e os insultos que o afundam cada vez mais na repressão judicial. Entra no gabinete do juíz aos seis anos e é lá que o encontramos na véspera dos seus 18 anos.

Nesse longo período em que, além da permanência no sistema penal, transita entre lares de acolhimento, não cessam as infrações idiotas, as violências incontroláveis e um mal estar mal escondido sob o capuz e a ironia verbal como mecanismo de fuga. Tudo faz para agravar a sua situação.

Alternando as cenas onde a violência explode face à incompreensão ou à cólera e aquelas onde Malony consegue momentaneamente extirpar-se deste círculo vicioso, "De cabeça erguida" é o percurso esgotante de todos aqueles que o desejam ajudar.

A esperança de um amanhã melhor está nas mãos do magistrado que o viu crescer, de um assistente social que no rapaz revê a sua adolescência problemática (Benoît Magimel) e de uma rapariga (Diane Rouxel) que, sem qualquer preconceito, o saberá amar.

"De cabeça erguida" insere-se no já profundo sulco traçado pela cinematografia francófona habitado por Truffaut, Bruno Dumont, os irmãos Dardenne, exemplos altíssimos a que é impossível não fazer referência quando se trata de aproximar a câmara ao desconforto e às dificuldades do mundo juvenil.

Com argumento da cineasta, o filme explora habilmente a imagem do seu protagonista, verdadeiramente credível no saber expressar o caos de um indivíduo abandonado pelos afetos mas ao mesmo tempo incapaz de "restituir" o que quer que seja a quem, de todas as formas, lhe procura estender a mão.

Bercot tenta traduzir estes contínuos e constantes estados de alma, acompanhando a narrativa com incessantes sonoridades rap, intervaladas pela quietude de uma melodia mais reconfortante (o "Trio op. 100" de Schubert), presente em alguns momentos do filme, quase como que suspender - pelo menos durante alguns segundos - a inexorável nova queda de Malony.

Para o personagem principal, a passagem à idade adulta será forçada e inevitável: uma nova vida que se abre à esperança mas que, simultaneamente, conduz à escolha, talvez um pouco forçada, de expedientes narrativos vagamente "consoladores".

Além da personalidade própria de Malony e da sua família biológica, o filme mostra também uma fratura da sociedade: aqueles que dominam o discurso e o raciocínio são também aqueles que melhor dominam os seus sentimentos, as suas emoções, o seu percurso. Para o protagonista e os seus semelhantes, vindos dos meios mais desfavorecidos, a violência é o meio de expressão mais corrente, mais acessível.

Perturbador e emocionante, "De cabeça erguida" é um filme audacioso pela escolha do seu tema, encenação rigorosa e interpretação luminosa do primeiro papel do jovem ator Rod Paradot.

 

Valerio Sammarco / Cinematografo.it, Magali Van Reeth / Signis.net
Trad. / edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 01.07.2016

 

Título: De cabeça erguida
Realizadora: Emmanuelle Bercot
Interpretação: Rod Paradot, Catherine Deneuve, Sara Forestier, Benoît Magimel, Diane Rouxel, Elizabeth Mazev, Anne Suarez, Christophe Meynet, Catherine Salée
Género: Drama
Origem, ano: França, 2015
Duração: 119 min.
Classificação etária: M/14
Estreia em Portugal: 30.6.2016

 

 
Imagem Cartaz | D.R.
O filme explora habilmente a imagem do seu protagonista, verdadeiramente credível no saber expressar o caos de um indivíduo abandonado pelos afetos mas ao mesmo tempo incapaz de "restituir" o que quer que seja a quem, de todas as formas, lhe procura estender a mão
Aqueles que dominam o discurso e o raciocínio são também aqueles que melhor dominam os seus sentimentos, as suas emoções, o seu percurso. Para o protagonista e os seus semelhantes, vindos dos meios mais desfavorecidos, a violência é o meio de expressão mais corrente, mais acessível
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