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«O diabo entra sempre pelo bolso», «fujam do carreirismo»: Conselhos para padres que também fazem bem a leigos

«O diabo entra sempre pelo bolso», «fujam do carreirismo»: Conselhos para padres que também fazem bem a leigos

Imagem PYB/Bigstock.com

Formar-se supõe ser capaz de aproximar-se com humildade do Senhor e perguntar-lhe: qual é a tua vontade? Que queres de mim? Sabemos a resposta, mas talvez nos faça bem recordá-la, e para isso proponho as três palavras do "Shemá" [Escuta] com que Jesus respondeu ao levita: «Amarás o Senhor com todo o coração, com toda a tua alma, com todas as tuas forças» (Marcos 12, 30).

Amar de todo o coração significa fazê-lo sem reservas, sem duplicidades, sem interesses espúrios, sem procurar-se a si mesmo no êxito pessoal ou na carreira. A caridade pastoral supõe sair ao encontro do outro, compreendendo-o, aceitando-o e perdoando-o de todo o coração. Isso é caridade pastoral. Mas sozinhos não é possível crescer nessa caridade. Por isso o Senhor chamou-nos para ser uma comunidade, de modo que essa caridade congregue todos os sacerdotes com um especial vínculo no ministério e na fraternidade. Para isso necessita-te da ajuda do Espírito Santo, mas também o combate espiritual pessoal. Isto não passou de moda, continua a ser tão atual como nos primeiros tempos da Igreja. Trata-se de um desafio permanente para superar o individualismo, viver a diversidade como um dom, buscando a unidade do presbitério, que é signo da presença de Deus na vida da comunidade. Presbitério que não mantém a unidade, de facto, expulsa Deus do seu testemunho. Não é testemunho da presença de Deus. Lança-o fora. Dessa maneira, reunidos em nome do Senhor, especialmente quanto celebram a Eucaristia, manifestam, inclusive sacramentalmente, que Ele é o amor do seu coração.



Não se podem contentar com ter uma vida ordenada e cómoda, que lhes permita viver sem preocupações, sem sentir a exigência de cultivar um espírito de pobreza radicado no Coração de Cristo



Segundo: amar com toda a alma. É estar dispostos a oferecer a vida. Esta atitude deve persistir no tempo e abarcar todo o nosso ser. (...) Por isso a formação de um sacerdote não pode ser unicamente académica, ainda que esta seja muito importante e necessária, mas tem de ser um processo integral, que abarque todas as facetas da vida. A formação há de servir-lhes para crescer e, ao mesmo tempo, para se aproximar de Deus e dos irmãos. Por favor, não se conformem com conseguir um título, mas sejam discípulos a tempo inteiro para «anunciar a mensagem evangélica de modo credível e compreensível ao homem de hoje». Neste momento é importante crescer no hábito do discernimento, que lhes permita valorizar cada instante e moção, inclusive o que parece oposto e contraditório, e filtrar o que vem do Espírito; uma graça que devemos pedir de joelhos. Só a partir desta base, através das múltiplas tarefas no exercício do ministério, poderão formar os demais nesse discernimento que leva à Ressurreição e à Vida, e lhes permite dar uma resposta consciente e generosa a Deus e aos irmãos. Dizia que a formação de um sacerdote não pode ser unicamente académica e conformar-se só com isso. Daí nascem todas as ideologias que empestam a Igreja, de um sinal ou de outro, do academismo clerical. Quatro são as colunas que a formação deve ter: formação académica, formação espiritual, formação comunitária e formação apostólica. E as quatro atuam entre si. Se falta uma delas, a formação já começa coxa e o padre acaba paralítico. Deste modo, por favor, as quatro juntas e interagindo entre si.



O beato Domingo y Sol dizia que para socorrer a necessidade devia-se estar disposto a «vender a camisa». Eu não vos pedirei tanto: padres descamisados não, simplesmente que sejam testemunhas de Jesus, através da simplicidade e austeridade de vida, para chegarem a ser promotores credíveis de uma verdadeira justiça social



Finalmente, a terceira resposta de Jesus, amar com todas as forças, recorda-nos que onde está o nosso tesouro está o nosso coração, e que é nas nossas pequenas coisas, seguranças e afetos, é onde jogamos o ser capazes de dizer que sim ao Senhor ou virar-lhe as costas como o jovem rico. Não se podem contentar com ter uma vida ordenada e cómoda, que lhes permita viver sem preocupações, sem sentir a exigência de cultivar um espírito de pobreza radicado no Coração de Cristo que, sendo rico, se fez pobre por nosso amor ou, como diz o texto, para nos enriquecer. Pede-se-nos adquirir a autêntica liberdade de filhos de Deus, numa adequada relação com o mundo e com os bens terrenos, segundo o exemplo dos apóstolos, a quem Jesus convida a confiar na Providência e a segui-lo sem pesos nem ataduras. Não se esqueçam disto: o diabo entra sempre pelo bolso, sempre. Além disso, é bom aprender a dar graças pelo que temos, renunciando generosa e voluntariamente ao supérfluo, para estar mais próximo dos pobres e dos frágeis. O beato Domingo y Sol dizia que para socorrer a necessidade devia-se estar disposto a «vender a camisa». Eu não vos pedirei tanto: padres descamisados não, simplesmente que sejam testemunhas de Jesus, através da simplicidade e austeridade de vida, para chegarem a ser promotores credíveis de uma verdadeira justiça social. E, por favor - e isto como irmão, como pai, como amigo -, por favor, fujam do carreirismo eclesiástico: é uma peste. Fujam disso.



 

Papa Francisco
Discurso ao Pontifício Colégio Espanhol de S. José, Roma
Vaticano, 1.4.2017
Trad. / edição: SNPC
Publicado em 01.04.2017

 

 
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