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Para que os velhos votos de Natal sejam novos todos os dias

Imagem Domenico Ghirlandaio | D.R.

Para que os velhos votos de Natal sejam novos todos os dias

Questionamentos, com tons de aridez e desânimo, podem brotar no coração humano em plenas festas natalícias. É tempo do Natal, de novo, e onde está a novidade? Ao avaliar os últimos anos, ou mesmo a década que passou, o que mudou para melhor? Talvez as análises sejam marcadas pelo pessimismo, concluídas com uma afirmação melancólica: de novo, é tempo do Natal. Os votos natalícios, que ocupam a pauta dos meios de comunicação, os cumprimentos entre pessoas e os cartões enviados podem parecer mera repetição. Isto porque, dias depois, tudo parece voltar a uma rotina que tem o seu peso próprio. Os votos de Natal podem tornar-se apenas «palavras pronunciadas ao vento», sem nenhuma força de transformação e mudança.

Em vez disso, cada pessoa deve aproveitar o tempo do Natal como oportunidade para capacitar-se para o novo.

A novidade que se experimenta não se esgota nas indispensáveis inventividades do comércio ou na criatividade de estrategas para alcançar ganhos, sair de crises, conseguir novas respostas económicas, inclusive para superar os cenários de exclusão que envergonham a sociedade. O novo do tempo do Natal está na fonte plantada bem no centro da história, perto de cada homem e mulher, no mistério insondável e inesgotável da encarnação do Verbo, Jesus Cristo, o Filho de Deus. A fonte do novo que não envelhece está entre nós e é o cântico do tempo do Natal. Está aí a novidade procurada pelo coração humano, como necessidade amorosa que alimenta o sentido da vida.

A liturgia na Igreja católica constrói este caminho experiencial com singularidade e riqueza preciosas, além de uma incontestável força pedagógica. Essa força é transformadora, com incidência na vida de quem percorre o caminho rumo ao mistério do Natal do Senhor. Indispensável é livrar-se das exterioridades que ancoram os corações na superficialidade. São pesados fardos que não permitem avanços na experiência do encantamento que o mistério do Natal opera na história da humanidade e na vida de cada pessoa.

Santo Agostinho, tocado no mais íntimo do seu ser por este mistério, expressa, de maneira admirável, a sua profundidade e o seu alcance quando diz: «Celebremos este dia de festa, em que o grande e eterno Dia, gerado pelo Dia grande e eterno, veio a este nosso dia temporal e tão breve». Esta reflexão permite compreender melhor a novidade, sempre atual, que deve acompanhar os votos de feliz Natal. Ao alcançar esse entendimento, de modo profundo, supera-se a rotina que promove esterilidade, são superados desencantos que deprimem e fazem tantos caírem, não se deixa exaurir a força dos que combatem em muitas frentes, especialmente as que buscam a paz, a solidariedade e a justiça.

Santa Terezinha do Menino Jesus, sempre muito tocada pelas festas do Natal, em diálogo com Maria, a Mãe do Salvador, pergunta, em meditação profunda: «Terei inveja dos anjos que cantam o nascimento do Salvador? Não, porque o Senhor deles é meu irmão!» Esta verdade é a fonte da esperança que garante a novidade tão almejada pelo coração humano. Não há outra realidade comparável ao encontro do novo que está sempre guardado no coração de Deus. Tudo o que está fora desta fonte é repetição, não raramente enfadonha, sem força de modular os corações no amor que alimenta lógicas transformadoras, corrige os descompassos das arbitrariedades, elimina as amarguras que comprometem a fraternidade, supera as indiferenças que retardam o remédio urgente da solidariedade entre pessoas, culturas, povos e nações.

A vivência do Natal pode e deve ser a inteligente oportunidade para escrever um capítulo novo na história da sociedade, da vida pessoal e familiar. Esta tarefa é urgente, pois existe uma lista de intermináveis desafios a serem superados - da corrupção endémica (...), passando pelas disputas e manipulações que encobrem malfeitos e arrogâncias de todo o tipo, até a perda lamentável do encantamento e da ternura, que sustentam o respeito pelo outro, em todas as circunstâncias. Os votos de Natal produzem efeitos, particularmente, quando o coração humano os traduz em propósitos a serem verdadeiramente assumidos, especialmente aqueles que corrigem os descompassos que fragilizam instituições, conturbam a família, desfiguram a vivência da fé na Igreja e perpetuam os tons de selvajaria nas relações interpessoais.

Na especialidade deste tempo, de tamanha densidade, que os votos de Natal criem a oportunidade para a reconciliação entre pessoas, classes e povos; inspirem a lista dos propósitos pessoais para qualificar a vivência do Ano Novo, fecundem o encantamento por Deus e o respeito pelo semelhante, principalmente pelo mais pobre. Estes são os votos de Natal.

 

D. Walmor Oliveira de Azevedo
Arcebispo de Belo Horizonte, Brasil
In Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
Publicado em 31.12.2014

 

 
Imagem Domenico Ghirlandaio | D.R.
Indispensável é livrar-se das exterioridades que ancoram os corações na superficialidade. São pesados fardos que não permitem avanços na experiência do encantamento que o mistério do Natal opera na história da humanidade e na vida de cada pessoa
Não há outra realidade comparável ao encontro do novo que está sempre guardado no coração de Deus. Tudo o que está fora desta fonte é repetição, não raramente enfadonha, sem força de modular os corações no amor que alimenta lógicas transformadoras
Os votos de Natal produzem efeitos, particularmente, quando o coração humano os traduz em propósitos a serem verdadeiramente assumidos
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