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Pierre Soulages e a luz refletida

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Pierre Soulages e a luz refletida

«Le geste véhicule généralement des états d’âme» («o gesto transporta geralmente os estados de alma») (Pierre Soulages, 2002).

No livro "Pierre Soulages. Noir Lumière. Entretiens avec Françoise Jaunin" (2002), Soulages (1919) afirma-se como o pintor do negro. Mas o seu material primeiro é a luz - "negra luz". O negro de Soulages faz nascer o espaço e a poética da luz.

E pintar, o que significa?

Para Soulages, pintar existe para dar sentido à vida daquele que cria e daquele que frui. Entende os seus quadros como objetos capazes de receber o que cada um está pronto a projetar. E só compreende o que procura no momento em que pinta.

A sua pintura é, assim, um espaço físico de questionamento e de meditação, onde o sentido que lhe é atribuído pode ser simultaneamente feito e desfeito. Porque o objeto criado vive sobretudo do olhar que lhe é transferido.

Soulages não cessa de afirmar que a pintura é o estado da ausência de palavras e que aquilo que se produz não pertence ao domínio da linguagem. O pintor é aquele que possui o verbo claro, concreto e preciso. E a pintura é o resultado da relação trina que se estabelece entre o sujeito que pinta, o objeto pintado e o sujeito que frui.

Concebe ainda Soulages que a pintura não se consegue através de ideias preconcebidas – o ato de pintar é um exercício de liberdade. No entanto, o ato de pintar e a reflexão estão intimamente ligados. Há uma pulsão e um desejo que precedem a ação. Mas tudo se concretiza em simultâneo. É preciso saber estar sempre recetivo ao desconhecido. E a pintura de Soulages está totalmente enraizada na matéria, e por isso não vive só no domínio da imaginação.

A realidade da pintura, ao ser concreta, é bem mais rica do que todas as ficções que se fazem à priori acerca dela – «Je ne représent pas, je présent» («eu não represento, eu apresento») (Pierre Soulages, 2002).

Para Soulages, toda a pintura implica um gesto; porém, o que é importante é a forma produzida, e não o gesto em si. O gesto, ao formar, suscita o desejo de aprofundar, intensificar e de complexificar. Forma é o resultado de superfície, cor e matéria. E é feita de modo a produzir tensões, concentrações, acentuações, pontos fortes, dinamismo, peso, profundidade e luz.

Soulages considera que a pintura abstrata dá expressão e liberdade às proporções, cores, espaço e ritmos. Na sua pintura coexistem questões que controla e fatores que desconhece. Alternam-se períodos de maturação lenta com períodos de revelação instantânea. As suas pinturas são como que músicas sem palavras cantadas. O aleatório e o acidental não interessam a Soulages, na medida em que o importante é o esforço da procura – e procura implica uma abertura ao desconhecido, ao inesperado e ao desconcertante.

«J’aime les causses, les déserts, les arbres nus. J’aime ce dépouillement qui nous ramène à l’essentiel» («eu gosto dos planaltos, dos desertos, das árvores nuas. Eu gosto desse despojamento que nos leva ao essencial») (Soulages, 2002).

Segundo Soulages, o negro é a cor das primeiras pinturas pré-históricas conhecidas. É uma cor violenta mas é aquela que encoraja a internalização, abrindo um campo mental próprio. Negro é gravidade, evidência e autonomia. É ao mesmo tempo cor e não cor. O negro contém em si a ausência da dimensão e da forma – a sua força concretiza-se na densidade e na textura. Inclui todas as outras cores, mas no entanto é a que está menos presente na natureza. Por isso, o negro tem o grau mais elevado de abstração.

O negro, na perceção de Soulages, tem a capacidade de aclarar as cores sombrias, de criar contrastes muito fortes, e assim que a luz se reflete no negro, ela transforma-o, conferindo-lhe uma qualidade emocional muito particular.

O negro é usado na pintura de Soulages não no sentido da monocromia mas sim para pôr em evidência a luz refletida e transformada pelas suas estrias e texturas. Soulages esclarece que a sua pintura propõe a contemplação, o silêncio, a concentração e a interioridade.





 

 

 

Ana Ruepp
Publicado em 16.02.2015 | Atualizado em 18.04.2023

 

 
Imagem Pierre Soulages | D.R.
O aleatório e o acidental não interessam a Soulages, na medida em que o importante é o esforço da procura – e procura implica uma abertura ao desconhecido, ao inesperado e ao desconcertante
O negro é usado na pintura de Soulages não no sentido da monocromia mas sim para pôr em evidência a luz refletida e transformada pelas suas estrias e texturas. Soulages esclarece que a sua pintura propõe a contemplação, o silêncio, a concentração e a interioridade
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