Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura - Logótipo
secretariado nacional da
pastoral da cultura
Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura - Logótipo
secretariado nacional da
pastoral da cultura

“Quando Ele nos abre as Escrituras”: Novo livro de D. António Couto oferece viagem aos textos bíblicos

Imagem Capa (det.) | D.R.

“Quando Ele nos abre as Escrituras”: Novo livro de D. António Couto oferece viagem aos textos bíblicos

Proporcionar «uma viagem e uma visita guiada» aos textos bíblicos proclamados nos domingos e solenidades e festas do ano litúrgico B, que começou há três semanas, é o propósito do novo livro do bispo de Lamego, D. António Couto.

Em “Quando Ele nos abre as Escrituras”, editado pela Paulus, o biblista que preside à Comissão Episcopal da Missão e Nova Evangelização propõe reflexões «com tempero teológico, literário, simbólico, cultural, histórico e arqueológico».

«É a estrada bela, e é andando nela que se encontra repouso para a vida (Jr 6,16). Encontramos lume e sentido, para voltar à estrada dos dois de Emaús, a quem já ardia o coração (Lc 24,32). É a estrada que desce de Jerusalém para Gaza. A estrada é no deserto (At 8,26), como a de Isaías 35,8; 43,19, mas pode sempre encontrar-se nela o sentido e a água (At 8,35-36). É a estrada de Damasco, em que podemos sempre cair de nós abaixo e ouvir chamar o nosso nome de uma forma nova e diferente (At 9,4; 22,7; 26,14). É a estrada que se abre à nossa frente, sempre que ouvimos Jesus dizer: “Segue-me!” ou “Vai”», convida D. António Couto na introdução.

Os textos estão divididos pelo Advento, Natal, Quaresma, Semana Santa, Páscoa de Cristo, Tempo da Páscoa, Tempo Comum, e solenidades e festas.

«Pensei sobretudo naqueles que, domingo após domingo, têm a responsabilidade de abrir as Escrituras à compreensão dos homens e mulheres, jovens e crianças, que, domingo após domingo, entram nas nossas igrejas», explica o prelado.

D. António Couto, que às reflexões acrescenta uma «introdução ao Evangelho segundo Marcos», o mais proclamado nos domingos e solenidades do ano litúrgico, conclui a introdução com um desejo: «Desejo ao leitor bom apetite. Já se sabe que nem só de pão vive o homem».

Apresentamos um dos textos deste livro, correspondente ao próximo domingo, 21 de dezembro, o último do Advento.

 

Deixar o céu falar… e adorar
D. António Couto

1. Este Domingo IV do Advento deixa-nos à beirinha do Natal do Senhor. O Evangelho neste dia proclamado (L" 1,26-38) é um tecido sublime, que as Igrejas do Ocidente conhecem por «Anunciação», e as do Oriente por «Evangelização». Do céu chega a Alegria incandescente a casa de Maria: «Alegra-te, Maria» [= «Chaîre Maria»; «Ave Maria»], «o Senhor está contigo» (Lc 1, 28), não tenhas medo» (Lc 1,30), diz a Maria o anjo enviado por Deus. Alguns anos mais tarde, as mulheres que vão ao túmulo de Jesus ouvirão também a mesma música divina: «Alegrai-vos» (Mt 28,9), «não tenhais medo» (Mt 28,5). E nós, Assembleia Santa que hoje se reúne para celebrar os mistérios do seu Senhor e também de Maria, Mãe de Deus e nossa Mãe, estamos também permanentemente a ouvir esta divina melodia. Portanto, irmãos amados em Cristo, Alegrai-vos, não tenhais medo, o Senhor está no meio de nós!

2. O centro da cena é de Maria, que podemos ver em alta sintonia com a Palavra de Alegria que lhe chega de Deus. Ao contrário da nossa muito ocidental maneira de ver e de sentir, note-se bem que Maria não esboça qualquer reação à presença do anjo, que tão-pouco é narrada. Ela fica perturbada é com a Palavra que lhe cai nos ouvidos e no coração (Lc 1,29). «Conceberá no ventre» o Filho de Deus (Lc 1,31-33). «Conceber no ventre» é um pleonasmo intencional só dito de Maria por duas vezes (Lc 1,31 e 2,21), claramente para a pôr em pura sintonia com o Deus do «ventre das misericórdias» (Lc 1,78). Note-se como, na sequência do texto, de Isabel só se diz que «concebeu» (Lc 1,36). Surge então a esperada objeção de Maria: «Como será isso, se não conheço homem?» (Lc 1,34). O anjo explica que essa conceção terá a ver com a intervenção de Deus, pois se trata do Filho de Deus (Lc 1,35). Já atrás Maria tinha sido apresentada como «virgem casada» (“parthénos emnêsteuménê”) (Lc 1,27). Não se trata de uma subtileza, mas de um estatuto jurídico em que as pessoas consagravam a Deus a sua virgindade e se dedicavam completamente a Deus. Casavam-se, não em ordem à procriação, mas à proteção mútua. Este estatuto jurídico, não sendo usual no mundo judaico do seu tempo, está, porém, solidamente documentado nos últimos séculos antes de Cristo e depois de Cristo.

3. Ultrapassada a objeção, Maria responde: «Eis a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua Palavra» (Lc 1,38). Na Bíblia, apenas os grandes chamados (Moisés, Josué, David) são denominados «Servos do Senhor», sendo Maria a única mulher assim denominada. Deus chama, mas não impõe. A Maria, e a cada um de nós. Podemos sempre aceitar Deus ou esconder-nos de Deus. Deixar Deus entrar ou fechar-lhe a porta. Maria aceitou, e, por isso, todas as gerações a proclamarão bem-aventurada. É o que estamos hoje e aqui a fazer: Feliz és tu, Maria, pioneira de um mundo novo, porque acreditaste em tudo quanto te foi dito da parte do Senhor! Feliz também aquele que ouve a Palavra de Deus e a põe em prática!

4. Memorial desta beleza incandescente é a Basílica da Anunciação, em Nazaré. Esta grandiosa basílica, em três planos, foi inaugurada a 25 de março de 1969 e foi visitada, ainda as obras estavam em curso, em 1964, pelo Papa Paulo VI. Escavações feitas antes desta grandiosa construção puseram a descoberto, e podem ver-se ainda hoje, os majestosos pilares de uma catedral levantada em 1099 pelo príncipe cruzado Tancredo, bem como o pavimento em mosaico de uma igreja bizantina, que pode ser datada do ano 450. Mas, descendo mais fundo, até às entranhas da atual basílica, acede-se à Gruta da Anunciação, sob cujo altar se lê a inscrição “Verbum caro hic factum est” [«Aqui o Verbo se fez carne»], e a outros lugares de culto antigos, talvez já do século II. Numa grafite antiga foi encontrada a gravação XE MAPIA, abreviação de Chaîre Maria, a primeira Ave-Maria da história.

5. Em consonância com a música do Evangelho, o Segundo Livro de Samuel documenta, no extrato lido hoje (7,1-16), o desejo de Deus vir habitar no meio de nós. Não num Templo de pedra, mas num Templo de tempo, podendo assim caminhar connosco sempre, como já fez com David, e quer continuar a fazer connosco. É usual, de resto, dizer-se que nós construímos o espaço, enquanto os judeus construíram o tempo!

6. Aí está também São Paulo a expor-nos, no final da Carta aos Romanos (16,23-25) a grande teologia bíblica do Mistério (“mystêrion”) do Amor de Deus, Mistério escondido eternamente em Deus (Rm 16,25; Ef 3,9; Cl 1,26), mas já presente e atuante na história dos homens desde a Criação (Jo 1,3; Cl 1,16) e agora dado a conhecer (“gnôrízô”) em Cristo (Rm 16,25-26; Ef 1,9; 3,3.10; Cl 1,27), tornando-se, portanto, Mistério conhecido (!), Revelação divina gratuita, doação do Dom e dicção do Dito, totalmente entregue aos homens, para a viverem totalmente. Este «para nós» do Mistério do Amor de Deus é o Propósito (“próthesis”) eterno divino (Rm 8,28; Ef 1,11), a Vontade (“thélêma”) eterna divina (Gl 1,4; Ef 1,5.9.11) – em Deus, pensamento, expressão, comunicação, efeito, Alfa e Ómega, são simultâneos e coeternos – de elevar a nossa humanidade a viver por graça ao nível da sua divindade (2Pd 1,4; 1Jo 3,2). Ao contrário do significado usual que damos à palavra «mistério», na Bíblia, como se vê, «mistério» não é o que não se sabe, mas o que Deus, por graça, nos dá a saber. E é tanto e adorável, e, visto apenas do nosso pequeno patamar, impensável!

7. É por isso que a hora é de cantar. O tema é, claro está, a bondade e a graça de Deus, que desceu até nós numa história que também foi e vai tecendo por amor. O Salmo 89 insinua-se-nos nas cordas do coração e não nos deixa parar de cantar!

 

Edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 14.12.2014

 

Título: Quando Ele nos abre as Escrituras - Domingo após domingo
Autor: D. António Couto
Editora: Paulus
Páginas: 400
Preço: 20,00 €
Título: 978-972-301-822-6

 

 
Imagem Capa | D.R.
Pensei sobretudo naqueles que, domingo após domingo, têm a responsabilidade de abrir as Escrituras à compreensão dos homens e mulheres, jovens e crianças, que, domingo após domingo, entram nas nossas igrejas
Podemos sempre aceitar Deus ou esconder-nos de Deus. Deixar Deus entrar ou fechar-lhe a porta. Maria aceitou, e, por isso, todas as gerações a proclamarão bem-aventurada. É o que estamos hoje e aqui a fazer: Feliz és tu, Maria, pioneira de um mundo novo, porque acreditaste em tudo quanto te foi dito da parte do Senhor!
Ao contrário do significado usual que damos à palavra «mistério», na Bíblia, como se vê, «mistério» não é o que não se sabe, mas o que Deus, por graça, nos dá a saber. E é tanto e adorável, e, visto apenas do nosso pequeno patamar, impensável!
Relacionados
Destaque
Pastoral da Cultura
Vemos, ouvimos e lemos
Perspetivas
Papa Francisco
Teologia e beleza
Impressão digital
Pedras angulares
Paisagens
Umbrais
Evangelho
Vídeos