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Leitura: "Tarkovsky - A memória das origens em 'Nostalgia' e 'O sacrifício'"

Imagem Capa (det.) | D.R.

Leitura: "Tarkovsky - A memória das origens em 'Nostalgia' e 'O sacrifício'"

O conflito provocado pelo exílio da «terra espiritual», marcada pelo cristianismo ortodoxo, por parte do cineasta russo Andrei Tarkovski (1932-1986), em particular nos seus dois últimos filmes, "Nostalgia" e "O sacrifício", está no centro de um novo livro, assinado por Rui Manuel Brás, que a Universidade Católica Editora terá disponível em breve.

«Forçado a exilar-se nos primeiros anos da década de 80 do século passado, [Tarkovski] realizou dois filmes onde o tema da memória, sempre presente na sua obra, se conjuga com a problemática do desenraizamento e da forma de lidar com o trauma da perda da pátria», refere o autor, na introdução.

A primeira parte de "Tarkovsky - A memória das origens em 'Nostalgia' e 'O sacrifício'", «versão ligeiramente alterada» da tese de doutoramento em Estudos de Cultura realizada por Rui Manuel Brás na Universidade Católica Portuguesa, é «dedicada à contextualização» da obra do realizador dentro da tradição cultural russa.

Tarkovsky foi «de certa forma obrigado a sair do seu país», mas a «exposição ao mundo ocidental a partir de princípios dos anos 80 não implicou necessariamente a separação dos seus hábitos e das suas crenças. Pelo contrário, o exílio fez com que a sua reflexão sobre a Rússia se acentuasse e repercutisse nos seus filmes».

«Os valores da cultura russa, em especial os valores de uma espiritualidade com raízes na fé cristã ortodoxa que a todo o momento emergem na sua obra, guiaram Tarkovsky não apenas enquanto indivíduo, mas como um intelectual que tentou partilhar a sua vida com o universo. O conflito ("agón") que nele se desenvolveu motivado pelo abandono da sua "terra espiritual" e pela oposição aos valores dominantes no Ocidente é, assim, o tema valorizado nesta parte do livro», explica o investigador.

O segundo capítulo é dedicado à «análise do sentimento de perda, um sentimento denso ("pathos") tratado de formas diferentes em "Nostalgia" e "O sacrifício", filmes em que «a memória das origens é particularmente evidente e está associada à situação de exílio em que Tarkovsky vivia».

«Na sua última entrevista, afirmou: "Sendo ortodoxo, considero a Rússia como a minha terra espiritual. Nunca renunciarei a ela, mesmo que não a possa voltar a ver"»,

Por estar «afastado para sempre da sua "terra espiritual"», a memória de Tarkovski «levará à criação de uma pátria imaginária, uma pátria interior que, necessariamente, não corresponderá à "pátria material". Esta será a função terapêutica da memória e dedica-se algum espaço à análise do modo como se desenvolve nos dois filmes».

A derradeira secção do livro «retoma os conceitos de memória, trauma e exílio, mas numa análise mais centrada no sacrifício como catarse ("katharsis"), para a qual serão importantes os conceitos de sacrifício (autoimolação), violência, sagrado e bode expiatório».

«A ideia de sacrifício está fortemente ligada aos valores cristãos presentes em toda a obra de Tarkovsky e a questão do sagrado e a degradação dos valores no mundo moderno não são novidades em "Nostalgia" e "O sacrifício". Bastaria ver o filme dedicado ao pintor de ícones russo Andrei Rublev, a problemática central de "Stalker" ou mesmo "Solaris", para percebermos como esses são temas recorrentes em toda a filmografia de Tarkovsky», acentua Rui Manuel Brás.

O autor sustenta que «o significado do(s) sacrifício(s) nos dois filmes em estudo será o da expiação catártica motivada pela necessidade de repor a ordem do universo perturbada pela secundarização da fé e da capacidade de dádiva dos indivíduos no mundo moderno, no qual o ato sacrificial é visto como escândalo precisamente pelo egoísmo a que o materialismo moderno condenou as pessoas».

Rui Manuel Brás leciona "Géneros Cinematográficos" na licenciatura de Comunicação e Cultura da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa e é membro do Centro de Estudos de Comunicação e Cultura. Além da obra de Andrei Tarkovsky, tem desenvolvido investigação sobre cinema russo contemporâneo e géneros cinematográficos.

 




 

Rui Jorge Martins
Publicado em 17.05.2016

 

Título: Tarkovsky - A memória das origens em "Nostalgia" e "O Sacrifício"
Autor: Rui Manuel Brás
Editora: Universidade Católica Editora
Páginas: 272
Preço: 14,50 €
ISBN: 978-972-540-506-2

 

 
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A ideia de sacrifício está fortemente ligada aos valores cristãos presentes em toda a obra de Tarkovsky e a questão do sagrado e a degradação dos valores no mundo moderno não são novidades em "Nostalgia" e "O sacrifício". Bastaria ver o filme dedicado ao pintor de ícones russo Andrei Rublev, a problemática central de "Stalker" ou mesmo "Solaris"
O significado do(s) sacrifício(s) nos dois filmes em estudo será o da expiação catártica motivada pela necessidade de repor a ordem do universo perturbada pela secundarização da fé e da capacidade de dádiva dos indivíduos no mundo moderno
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