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30.12.2009

Poderá haver maior prova de amor, do que tornar-se o Verbo de Deus tão humilde como a erva do campo? “Senhor, que é o homem para que Vos lembreis dele, para que Vos preocupeis com ele?” Compreenda assim o homem até que ponto Deus tem cuidado dele; reconheça bem o que Deus pensa e sente a seu respeito. Não perguntes, ó homem, porque tens de sofrer tu; pergunta antes porque sofreu Ele. Por aquilo que Ele fez por ti, reconhece quanto vales para Ele e compreenderás a sua bondade através da sua humanidade. Quanto mais pequeno Se fez na sua humanidade, tanto maior Se revelou na sua bondade; quanto mais Se humilhou por mim, tanto mais digno é agora do meu amor.

S. Bernardo

 

 

29.12.2009

Não tivesses tu simplicidade, como poderia
acontecer-te o que agora a noite enche de luz?
Vê, o Deus que sobre os povos em ira ardia
torna-se manso e em ti ao mundo vem Jesus.

Terias imaginado maior esse Menino?

O que é a grandeza? Através de toda a medida
pela qual Ele passa, se traça o Seu vertical destino.
Nem mesmo um astro tem uma rota assim erguida.
Vês, estes reis são grandes, imponentes,

diante de ti depositam presentes

que tomam por tesouros sem par,
e talvez te assombre a oferenda que aí está:
mas para as pregas dos teus panos dirige teu olhar,
vê como Ele tudo supera já.

Todo o âmbar que se envia para a distância

Todas as jóias de ouro e especiaria do ar,
que turvando-se nos sentidos se vêm envolver:
tudo isto rapidamente veio a terminar,
e por fim todos se vieram a arrepender.

Mas, hás-de ver, Ele enche de alegria toda a ânsia.

Rainer Maria Rilke
(A Vida de Maria)

 

 

26.12.2009

 

 

 

25.12.2009

Imagem

Para rezar junto à Manjedoura

Bem-aventurados os que no coração se reconhecem pobres
pois é deles tudo o que há-de vir

Bem-aventurados os que existem mansamente
pois a terra os escolherá para herdeiros

Bem-aventurados os que rompem o muro das implacáveis certezas
pois são outros os caminhos da consolação

Bem aventurados os que sentem, pela justiça, fome e sede verdadeiras:
não ficarão por saciar

Bem-aventurados os que estendem largos os gestos de misericórdia
pois a misericórdia os iluminará

Bem-aventurados os que se afadigam pela paz:
isso torna os mortais filhos de Deus

Bem-aventurados os que não turvam seu olhar puro
pois no confuso do mundo verão passar o próprio Deus

Texto: José Tolentino Mendonça
Desenho: Rui Aleixo

 

 

24.12.2009

do visível ao invisto

alvoroço será a palavra que (con)vém
para dizer o nascimento?
fechando a porta
ouviremos a fonte de onde corre
o Verbo feito carne?

quem sacudirá a grande sintagmática
em que dorme o mundo
a comodidade
em que nos deitamos e acordamos
o “assim é” difuso
que justifica a inacção, o niilismo?

não o visível
mas a fragilidade da evidência
o drama do visível
os sapatos de guerra da economia
que reduziu a justiça
a uma geometria moral
o desejo mimético
que ignora a apocalíptica do desejo

o Anjo entrou no quarto entreaberto
e saudou a nudez que nos esconde
não é o sangue o arquitecto desta hora

o Anjo mostra a transgressão do visível
o invisto
o olho ventral
que controla mesmo a sombra
o apetite voraz
do sagrado vigiado

que vemos, vendo o outro
senão o abismo da origem
a revelação do que se não desvela?
o olhar não são os olhos
o visual nada tem de puramente óptico
a natalidade é o milagre
que salva o mundo do domínio do negócio humano
da ruína normal

deixai fora a cínica recomendação do Poder:
ficar em casa, não sair
a encarnação não é o mergulho na telepresença
nem o neotribalismo nos defende
dos fantasmas da identidade
mergulhemos no lodo do silêncio
a água vem do alto
inscreva-nos o Filho na carne do presente
a carne do verbo é vocativa
uma lâmpada tremeluz no escuro
o bafo da divina Presença nos aqueça

josé augusto mourão op

 

 

23.12.2009

A noite é núbil. Alta.
De uma lisura antiga
que a rotação decanta
e imobiliza.

Núbil e antiga. Narra
mais do que o seu prodígio,
como ver vem da alma
tão cristalino.

Ou como acaba a noite
naquela ausência núbil
por onde a alma fosse
aro de eclipse às luzes.

Fernando Echevarría (n. 1929)

 

 

15.12.2009

Mais dia menos dia, a morte virá. A sabedoria deste mundo diz que as separações serão sem retorno. Se assim for, as alegrias que vamos tendo – por mais autênticas que sejam – acabam por servir, apenas para enganar uma tristeza sem apelo. Creio, pelo contrário, que em Deus há memória e coração para todos, redenção para todos os injustiçados da terra. Mais ainda: acredito que teremos um novo, misterioso e bom contacto com tudo e com todos, mesmo com aqueles que nunca conhecemos e com todos os mundos que nunca vimos. Paulo tem razão: comecemos já a viver e a sonhar com a alegria.

Fr. Bento Domingues, o.p.
In Público, 13.12.2009

 

 

14.12.2009

Chama de amor viva

Oh chama de amor viva,
que ternamente feres
da minha alma o mais profundo ponto!,
já que não és esquiva,
acaba já, se queres;
rasga o tecido deste suave encontro.

Oh cautério suave!
Oh deleitosa chaga!
Oh toque delicado! Oh mão querida,
que à vida eterna sabe,
toda a dívida paga!,
matando, a morte transformaste em vida.

Oh lâmpadas de fogo,
em cujos resplendores
as profundas cavernas do sentido,
escuro e cego, logo
com estranhos primores
calor e luz dão junto ao seu querido!

Quão manso e amoroso
acordas em meu seio,
onde em segredo, solitário, moras;
e em teu aspirar gostoso,
de bem e glória cheio,
quão delicadamente me enamoras!

S. João da Cruz (1542-1591)

 

 

2.12.2009

Rimance de S. José

Escutai todos que cousa
tão maravilhosa é esta:
um Marido sem esposa
e uma casada Donzela.
Um Pai, que não há gerado
um Filho que um Outro gera;
um Filho maior que o Pai
e um Casado com pureza.
Um homem que dá alimentos
àquele que o alimenta;
quem o criou, ele cria,
e, ao que o sustenta, sustenta.
Manda em seu próprio Senhor;
e ao seu filho Deus respeita;
tem uma Escrava por Ama
e Rainha por Mulher.
Ciúmes teve e confiança:
teve certeza e suspeitas,
perigos e riquezas.
Teve, enfim, todas as cousas
que podem pensar-se belas:
pois é, de Maria, esposo
e, de Deus, o Pai na terra.

Soror Juana Inês de La Cruz
Trad.: António Manuel Couto Viana

 

 

25.11.2009

O pranto de Nossa Senhora

Mensageiro:
Vinde, cordialidade e silêncio,
mansidão das criaturas,
vinde às ruas!
Nosso Senhor, Teu Filho, é flagelado.
Desce o Seu Sangue, Senhora.
Vinde às ruas! Vem, menina do Paraíso,
as Tuas mãos, não já flébeis, mas frescas,
o líquido dos Teus pés, nós, Filha, to pedimos.
Vem!

Maria:
Eis agora que salto, ao encontro do meu Amado,
ao Filho meu e do Pai,
ao corço do Cântico;
os peitos do mundo solicitam-se,
oiço vozes. É a hora do Pão.

Mensageiro:
Senhora, foi já vendido. Hoje.
Bebemos?
Só Tu, talvez, o sabes.

Maria:
Acode, Madalena,
castigam o meu Filho;
nimbam o espírito dos rios, descem vozes.

Mensageiro:
Vem, ágil figura do Sião,
rarefacção dos montes,
vem soprar a Face.
Pesa-lhe o casario e os seus cuidados.

Maria:
Ó Pilatos, deixa-me mostrar-te
o coração povoado,
o rumor do sol,
as uvas contemplativas.

Povo:
Crucifige! Crucifige!
Morte ao Rei dos ladrões!

Maria:
É a dor da filha do Líbano,
Jerusalém, Jerusalém.

Mensageiro:
Ei-lo que vem entre ladrões,
traz manhãs frias nos olhos,
Noé da Aliança dos dias.

Povo:
O Rei dos Espinhos!
O Rei dos Espinhos!

Maria:
A minha boca Te envolve,
alaúde dos campos,
cordeiro da ubiquidade.
O teu Sangue será a nossa infância.

Mensageiro:
Chega a Cruz
(Virgilianos entram nos bosques,
rubor dos anjos!)
Eras a giesta,
o semeador... o vinho dos esposos...
as aves do céu...

Maria:
E tu, Cruz,
polpa deste fogo,
leda avelaneira,
ficarás para as núpcias?
Deixai-me olhá-lo, agora: Água e Sangue,
o suor ds pinhais,
o deleite no rio,
a caruma do mar...

Mensageiro:
Ó boca de ânfora,
silêncio e desejo,
desce, a vossa união está mais intima.
Ele chama já pelo tempo,
pelas espigas, Senhora e Filha,
serás na Missa dos dias.

Maria:
Corpo velido,
Filho, no Teu Sangue!

Cristo:
Começa o choro da visibilidade!

Maria:
Filho, pai e marido,
quem Te há ferido e desnudado?

Cristo:
Mãe,
os antílopes vão morrer ao mar!
Junta, na Mesa, os amigos,
os cuidados,
filhinhos,
que o Pai deseja Um.
Dorme no meio,
és o templo da aragem incalculável.

Maria:
Filho branco,
volta,
vem,
pela boca da lua,
nos cornos dos peixes,
nos gritos das acácias,
no hálito dos marujos.
Deixa-me subir para as núpcias.

A partir de Jacopone da Todi (1230-1306)

M.S. Loureço (1936-2009)

 

 

18.11.2009

Solo

O hebraico das escrituras sagradas tem um vocabulário reduzido, pouco mais de cinco mil vocábulos. Esta escassez contém uma intensidade de sentido que muitas vezes se pede nas traduções, quando um único verbo hebraico vem desmembrado em diversos sinónimos, traduzido em diferentes significados. Os verbos do trabalho e do cuidar a terra avàd e shamàr, são os mesmos, terrivelmente os mesmos, do serviço devido a Deus. Para a antiga escritura trabalhar a terra e servir a terra são a mesma palavra, a mesma solicitude que é devida ao servido sagrado.

A terra está ao cuidado de Deus. As regras do repouso sabático, um dia por semana, um ano em cada sete, insistem em a proteger da exploração insensata. Dizem que esta não pertence à espécie de Adão, que é inquilino e não proprietário do solo «Porque minha é a terra» (Levítico 25,23), estabelece a voz que transmite a Moisés a grandiosa legislação sagrada. E se existe uma diferença entre os dois serviços, sobre a terra e sobre o altar, está numa premissa do coração; em relação a Deus está escrito: Amar vosso Elohìm e servi-lo com todo o vosso coração e todo o vosso espírito». Deus tem necessidade desta explosão de entusiasmo amoroso para ser servido, algo que não é pedido para o trabalho-serviço da terra.

E se esta coincidência é pouca, ei-la repetida no segundo versículo, shamàr, que as traduções apresentam como «guardar» quando se trata da terra e «observar» quando se refere aos mandamentos de Deus. O hebraico antigo insiste contudo em manter juntos céu e terra, sagrado e solo, através de um verbo que os contém a ambos. A terra é confiada como a escritura é transmitida. Transmite-se alimento e sacramento com o mesmo verbo, são ambas as mesas preparadas graças ao cuidado das gerações precedentes. Têm a marca e o respirar das orações de acção de graças.

Acabámos longe daquela escritura. Não voltaremos ao solo com os verbos iguais àqueles que são devidos a Deus.

Dissociámos avàd e shamàr para poder desfrutar da terra sem pensar na nossa condição de pulgas parasitas do planeta, fazendo-nos seus senhores. Foi seguramente bom para o lucro, mas se alguém tiver vontade de se perguntar onde é que nos afastámos do sentimento sagrado de habitantes de um solo, pode voltar aos dois verbos hebraicos e sentir o rasgão com o qual separámos o céu da terra. Ler a sagrada escritura, lê-la devagar, é sentir a própria respiração dizer avàd e shamàr e voltar a cozer em si mesmo, por um momento, este abismo de distância.

Erri de Luca (n. 1950)

 

 

17.11.2009

A pergunta sobre o motivo da rejeição das “novas escolas de arte” (e com que veemência às vezes!) é fácil de responder: é que o olho acostumado às “receitas” do antigamente não sabe assimilar à primeira vista as “receitas” recém-descobertas. Isso requer tempo. Eu chamar-lhe-ia “conservadorismo dos olhos”.

Wassily Kandinsky (1866-1944)

 

 

11.11.2009

S. Domingos

A luz
atrás
da cruz

Vejo
a luz
porque vejo
a cruz

Vejo
a cruz
porque vejo
a luz

Sem
a cruz
a luz
cega

Sem
a luz
a cruz
é medonha
mete medo

Adília Lopes (n. 1960)

 

 

10.11.2009

A luz nos guie do teu rosto. Apenas
ela nos seja, mesmo à noite, dia.
E a abundância de dias enriqueça
esta velhice desprendida,
de forma a os frutos lúcidos da terra
dispensarem maior sabedoria.
E reunirem. Serem porta aberta
que a chegada dos outros endominga.
Como o domingo se endominga à mesa
com os frutos polícromos do dia.
E sobre todos esses frutos se erga
o teu rosto de luz, mesmo que o enigma
da sua claridade ainda só seja
a que há-de vir. E já desponta. E vinga
como o esplendor, depois da noite hesterna,
que recupera terra mais antiga.

Fernando Echevarría (n. 1929)

 

 

09.11.2009

Deus vem buscar o homem. A beleza não é mais do que Deus que vem buscar o homem.
Tudo aquilo que é beleza no mundo é como uma encarnação. Em tudo aquilo que nos dá o puro sentimento do belo, há presença real de Deus.
A beleza é esta presença de Deus entre nós.

Simone Weil (1909-1943)

 

 

23.10.2009

Amor ardente de Deus, não me abandones
Quando te afastas, por pouco que seja
pensamentos obscuros assaltam
a paz das moradas

Amargas lágrimas são o choro
prolongado de minha alma

Silvano de Athos (1866-1953)

 

 

21.10.2009

Marés e marinheiros

A vida hoje afastou-nos da natureza: as paisagens urbanas, com as suas florestas de betão, encerram a vida entre paredes eficazes, super-cómodas, é certo, mas o ar que respiramos por alguma razão se chama “ar condicionado”.

O que acredito é que precisamos de amplitude, de campos vastos a perder de vista, de viagens mais profundas que as da rotina. Precisamos perceber o silêncio das coisas, cúmplice do silêncio da nossa alma.

Precisamos da liberdade leve dessas horas inapreensíveis que passamos junto ao mar.

Há um poeta que diz: “Deus anda à beira d’água”. Não me admiro nada. A imensidão, o nome límpido, a alegria azul do mar são luares onde Deus deixou o Seu toque.

Os caminhos marítimos para os outros continentes estão descobertos. Falta, talvez, (re)descobrir o caminho marítimo para o porto secreto de cada coração.

José Tolentino Mendonça

 

 

20.10.2009

Outono

Folhas vermelhas de Outono

O sol despede-se lentamente nos dias cada vez mais breves de finais de Setembro. Esmaecem os doirados cabelos de Apolo. E as vinhas, os milheirais, os grandes plátanos dos jardins das cidades amolecem em tons amarelados e sanguíneos.

É o tempo das colheitas. Das vindimas e da apanha da fruta. Arrancam-se as batatas dos lameiros. Debulham-se os cereais. Descasca-se a amêndoa e secam-se os figos. A terra entrega generosamente ao homem o resultado do seu trabalho. Chegam as primeiras chuvas e despedem-se as aves migratórias. Límpidos horizontes. O mar, desocupado, exprime agora toda a brancura das suas ondas. Um cão vadio que corre atrás das gaivotas. Um par de namorados sentados na areia da praia. Avança o outono por Outubro. Desprendem-se as primeiras folhas. Pelos campos queimam-se as ramas secas. E o fumo levanta-se numa liturgia final de um ciclo que se encerra. Terminaram as últimas romarias do ano. Depois de Nossa Senhora dos remédios de Lamego, é a Feira das Colheitas em Arouca e S. Mateus em Viseu. Vem aí Novembro com as castanhas e o vinho novo. As árvores cada vez mais despidas. Os insectos entontecidos. E os primeiros frios de uma noite que se torna mais longa e ávida.

Revolvemos os armários em busca de roupa quente. O sono aumenta. Depois das beladonas, florescem os crisântemos e acorremos ao cemitério para recordar os nossos mortos. Chove muito. E lembro-me muito de ti ao cair da tarde. Não consigo evita este roxo, esta ansiedade, este advento que me conduz a Dezembro e ao nascimento de uma luz que auguramos desde o princípio do mundo.

Deslizamos por outono docemente e na verdade esta convulsão meteorológica e natural parece afinar-nos a sensibilidade. Os amanheceres breves e límpidos, com fiapos de nuvens avermelhadas atravessados pelo primeiro sol, são inesquecíveis, como aquela árvore cor de fogo, hirta e soberana que parecia reunir toda a luz do entardecer e que eu te pedi que fotografasses, naquela viagem para o longínquo norte.

Manuel Hermínio Monteiro (1952-2001)
Foto: BSPI/Corbis

 

 

19.10.2009

NE: Miojo: massa alimentícia pré-cozida preparada apenas com a adição de água a ferver.

 

 

 

 

 

13.10.2009

Mostrai que sois Mãe dos pobres,
de quem morre de fome e sem assistência na doença,
de quem sofre injustiças e afrontas,
de quem não encontra trabalho, casa nem abrigo,
de quem é oprimido e explorado
de quem desespera ou em vão procura o repouso longe de Deus.
Ajudai-nos a defender a vida, reflexo do amor divino,
ajudai-nos a defendê-la sempre,
desde o alvorecer ao seu ocaso natural.

Mostrai-vos a Mãe da unidade e da paz.
Cessem por todo o lado a violência ea injustiça,
cresça nas famílias a concórdia e a unidade,
e entre os povos o respeito e o diálogo;
reine sobre a terra a paz, a paz verdadeira!
Ó Virgem Maria, dai ao mundo Cristo, nossa paz!
Que os povos não reabram novos fossos de ódio e vingança;
que o mundo não ceda à ilusão de um falso bem-estar
que avilta a dignidade da pessoa
e compromete para sempre os recursos da criação.

Mostrai-vos a Mãe da esperança!
Velai sobre a estrada que ainda nos espera.
Velai sobre os homens e sobre as novas situações dos povos
ainda ameaçadas por riscos de guerra.
Velai sobre os responsáveis nas Nações
e sobre todos os que regem os destinos da humanidade.
Velai sobre a Igreja, sempre tentada pelo espírito do mundo. (...)
Totus tuus!

João Paulo II, Fátima, 13.05.1991

 

 

12.10.2009

Entardecíamos em Deus. No doce
apuro da sua dádiva.
Era um Outubro cúmplice, por onde
o lúcido licor vinha às palavras
Explicitar-se. E ao seu lume a pôr-se
no júbilo do espírito e das águas.
Decantava-se sermos o suporte
desse momento. Da doçura amarga
que altíssima subia pela morte
e dava em vida. Que só Deus nos dava.

Fernando Echevarria (n. 1929)

 

 

08.10.2009

«Deixa que os mortos sepultem os seus mortos. Quanto a ti, vai anunciar o Reino de Deus» (Lucas 9,60)

O discípulo queria enterrar o seu pai. Não está escrito «Honra teu pai e tua mãe»? O funeral não é a última honra concedida a quem nos pôs no mundo? Dir-se-ia que as palavras ásperas de Jesus chocam pela falta de sensibilidade humana. O profeta de Nazaré anuncia uma mudança radical. O reino de Deus subverte a sociedade e os seus hábitos, mesmo nas suas práticas mais sagradas. Jesus violou o repouso do sábado, que no entanto tinha sido ordenado por Deus. A este discípulo que O quer seguir, exige que renuncie à vida arrumada que levava, que vá ao ponto de desobedecer ao mandamento divino de honrar o seu pai e a sua mãe.
Seremos capazes de seguir Jesus até esse extremo? Porque haveríamos de o fazer, em nome de quem? Proclamar o reino de Deus é criticar o situacionismo, em palavras e em actos. Se Deus deve reinar, é porque aquilo que reina actualmente – a nossa rotina e mesmo as nossas devoções – nos distanciam de Deus e da felicidade que Ele promete, em Jesus.
Aceitar uma palavra dura é consentir na revisão total da nossa vida. Seguir Jesus, é renunciar a uma vida normal, mediana e, de certa maneira, morta. Os mortos enterram os seus mortos. Os discípulos de Jesus anunciam a vida que nos transtorna, que vem de Deus e nos surpreende. A escolha é nossa.

Rodolfo Felices Luna
Biblista (Universidade de Sherbrooke, Canadá)

 

 

28.09.2009

Ainda vou fugir.
Quero ir para longe, para um país onde se fale uma língua estranha à minha percepção.
Em terra alheia, ouvindo sem entender o fluir de palavras desconhecidas,
adivinharei uma outra fala.
Aprenderei a dizer e a escutar, a escrever e a ler outras sonoridades.
Com ardor e paciência, transmitirei um dialecto sem impostura à língua do meu nascimento.
Dar-lhe-ei uma intimidade atenta e firme,
a transparência do vidro puro.

J. Alberto de Oliveira

Imagem

 

 

25.09.2009

Antes da noite
cega
a luz do poente
como poalha de oiro
debruando os cúmulos
vem encher-nos de graça.

Maria Vitalina Leal de Matos

 

 

10.09.2009

Foi por falta de túmulos no Egipto que nos trouxeste para morrermos no deserto? O que é isto que nos fizeste, fazendo-nos sair do Egipto? (Êxodo 14,11)
Deus fez sair os escravos israelitas do Egipto, mas o Faraó lançou-se na sua perseguição. No meio das dificuldades, os fugitivos começaram a ter saudades da escravatura, culpando Moisés por os ter feito sair da opressão.
Temos a tendência de nos acomodar à infelicidade familiar, em vez de arriscar uma felicidade incerta. Deus pode abrir a porta das nossas prisões e dos nossos túmulos, mas cabe a nós sair e abrirmo-nos à liberdade.
Esta audácia aprende-se! Deus está presente na nossa longa marcha para a terra prometida. Ele ampara-nos e guia-nos para auroras felizes, mas não pode pôr um pé diante do outro em nosso lugar: é a nós que pertence caminhar para a alegria.

Rodolfo Felices Luna

 

 

09.09.2009

Pai-Nosso revisitado

Ó CRISTO
Filho muito amado do Pai
que está nos céus,
em Ti, o seu nome é santificado,
em Ti, é feita a sua vontade
na terra como no céu.
Tu, Tu dás-nos o pão
e Tu mesmo és esse pão.
És também perdão das nossas ofensas,
nosso suporte na tentação,
nossa libertação do Mal.
A Ti, o reino, o poder e a glória
pelos séculos dos séculos.
Tu, o verdadeiro Ámen.

Pastor Daniel Bourguet

 

 

08.09.2009

This text will be replaced

Por vezes é preciso mais que medicação.

Vídeo: Pfizer 

 

 

07.08.2009

A Igreja não poderá condenar-se ao silêncio, quando estiver convencida de que deve combater, não já por causas confessionais, mas para defender o mínimo de eticidade que é indispensável à condição humana e que poderia e deveria ser evidente já em princípio; refiro-me, por exemplo, à inviolabilidade da vida humana ou à questão da estrutura familiar em relação a outras possíveis formas de convivência. Se a Igreja pretender que este mínimo de eticidade, que ela representa, encontre ainda espaço nas legislações, não se pode limitar a produzir argumentos de tipo religioso, mas deve esforçar-se por demonstrar que as suas posições possuem uma evidência universal. Por isso, de acordo com a situação histórica em que se encontra para actuar, a Igreja deverá diferenciar a sua abordagem perante a opinião pública. Mas nunca poderá ser inteiramente neutra perante as estruturas éticas de uma determinada sociedade.

Card. Joseph Ratzinger (Bento XVI)

 

 

06.08.2009

Este é um grande mistério para a vida da Igreja, pois não se deve pensar que a transfiguração se realizará só no além, depois da morte. A vida dos santos e o testemunho dos mártires ensinam-nos que, se a transfiguração do corpo se realizará no final dos tempos com a ressurreição da carne, a do coração verifica-se agora nesta terra, com a ajuda da graça.

Podemos perguntar-nos: como são transfigurados os homens e as mulheres? A resposta é sublime: são os que seguem Cristo na sua vida e na sua morte, que se inspiram n'Ele e se deixam inundar pela graça que Ele nos dá; são aqueles, cujo alimento é cumprir a vontade do Pai; os que se deixam guiar pelo Espírito; os que nada antepõem ao Reino de Cristo; os que amam o próximo até derramar por ele o seu sangue; os que estão dispostos a oferecer tudo sem nada exigir em troca; os que em poucas palavras vivem amando e morrem perdoando.

João Paulo II (1920-2005)

 

 

04.08.2009

Toda a nossa religião não é senão falsa, e todas as nossas virtudes não são senão fantasmas, e não somos senão hipócritas aos olhos de Deus se não temos uma caridade universal para todo o mundo, para os bons como para os maus, para os pobres como para os ricos, para todos os que nos fazem mal como para aqueles que nos fazem bem.

Não, meus irmãos, não há melhor virtude do que a caridade para saber se somos filhos do bom Deus. A obrigação de amar o nosso próximo é tão grande, que Jesus Cristo fez dela um mandamento, que colocou a logo seguir àquele em que nos determina que o amemos de todo o coração. Ele diz-nos que toda a lei e todos os profetas são encerrados no mandamento do amar ao próximo.

Sim, meus irmãos, devemos olhar esta obrigação como a mais universal, a mais necessária e a mais essencial à nossa salvação. Ao cumprir este mandamento, cumprimos todos os outros. S. Paulo diz que os outros mandamentos nos defendem do adultério, do roubo, das injúrias, dos falsos testemunhos. Se amamos o nosso próximo, não lhe faremos nada disso, porque o amor que temos por ele não admite que lhe façamos mal.

S. João Maria Vianney (1786-1859)

 

 

03.08.2009

O que ouvimos e aprendemos e os nossos antepassados nos transmitiram (Salmo 78,3)

Como o salmista, tive a felicidade de ouvir da boca dos meus pais as maravilhas de Deus. Hoje, sinto-me privilegiado por ter escutado a narrativa dos prodígios do Senhor. Aqueles que me deram a vida, transmitiram-me igualmente o gosto de viver, a admiração perante a criação, o reconhecimento por tantos benefícios. E isso contribuiu para fazer de mim uma pessoa que vive na esperança.

Quando dermos a vida aos nossos filhos, não nos esqueçamos de lhes descrever o mundo em que vão viver. Essa narrativa, podemos escolhê-la. Este pode ser um mundo maldito, cruel e insensato, ou pode ser um mundo melhor em gestação, um mundo abençoado por um Deus amoroso e misericordioso. Temos a escolha das palavras. Com essas palavras, criamos o cenário no qual se desenrolará a aventura da próxima geração. Eles serão sempre livres de criar a sua própria história. Mas dêmos-lhe ao menos uma oportunidade, oferecendo-lhes palavras repletas de sentido e de esperança.

Rodolfo Felices Luna
Biblista. Universidade de Sherbrooke, Canadá

 

 

31.07.2009

Nunca devemos adiar uma boa obra, ainda que seja modesta, pensando em realizar mais tarde algo maior. É uma tentação frequente colocar diante de nós a perfeição das coisas futuras, menosprezando as do presente.

Santo Inácio de Loyola (1491-1556)

 

 

30.07.2009

Era uma vez um menino ou uma menina, quem lê é que escolhe, que ia por uma floresta ou uma rua ou um deserto com céus mais que gigantes. Era noite fria lá nesse lugar. Uma noite fria e bonita mas também meio triste, porque tudo é triste se estamos tristes, e as coisas bonitas então são as mais tristes, e o menino ou menina não estava contente. Ia sozinho ou sozinha sem companhia ou coragem para ir assim por ali, na floresta ou na rua ou no deserto dos céus. A noite caindo, um silêncio bem mau, e ele ou ela a tremer. O menino ou menina é mesmo igual a nós. Estrangeiro ou estrangeira, pequeno ou pequena, muito fraco ou fraca e sem nada saber. Vai agora na estrada toda feita de escuro ou chuva ou vento ou talvez tempestades. Ao longe, uma luz. E o menino ou menina sofre um medo terrível. E de repente essa luz afinal é uma casa e de repente essa casa afinal é a nossa e de repente o medo é afinal alegria. Uma alegria-alegria ou qual outra palavra? Quem lê é que escolhe, quem lê é que escolhe.

Jacinto Lucas Pires (n. 1974)

 

 

29.07.2009

Que o nosso grão seja tão abundante que nos esqueçamos dele na terra e o deixemos cair ao longo dos caminhos. Pois tanto e tanto será ele, que para o ano que vem, quando formos a semear, os campos e caminhos estejam já cobertos de trigo que desponta!

Khonds (Tribo da Índia)

 

 

15.07.2009

Oração pelas férias

Dá-nos, Senhor,
depois de todas as fadigas
um tempo verdadeiro de paz.

Dá-nos,
depois de tantas palavras
o dom do silêncio
que purifica e recria.

Dá-nos,
depois das insatisfações que travam
a alegria como um barco nítido.

Dá-nos,
a possibilidade de viver sem pressa,
deslumbrados com a surpresa
que os dias trazem pela mão.

Dá-nos
a capacidade de viver de olhos abertos,
de viver intensamente.

Dá-nos
de novo a graça do canto,
do assobio que imita
a felicidade aérea
dos pássaros,
das imagens reencontradas,
do riso partilhado.

Dá-nos
a força de impedir que a dura necessidade
esmague em nós o desejo
e a espuma branca dos sonhos
se dissipe.

Faz-nos
peregrinos que no visível
escutam a melodia secreta
do invisível.

José Tolentino Mendonça

 

 

14.07.2009

 

 

10.07.2009

Seo Raul tem uma calça azul-pavão
e atravessa a rua de manhã
pra dar risada com o vizinho.
Negro bom.
O azul da calça de seo Raul
parece pintado por pintor;
mais é uma cor que uma calça.
Eu fico pensando:
o que é que a calça de seo Raul
tem que ver com o momento
em que Pilatos decide a inscrição
JESUS NAZARENUS REX JUDEORUM.
Eu não sei o que é,
mas sei que existe um grão de salvação
escondido nas coisas deste mundo.
Senão, como explicar:
o rosto de Jesus tem manchas roxas,
reluz o broche de bronze
que prende as capas nos ombros dos soldados romanos.
O raio fende o céu: amarelo-azul profundo.
Os rostos ficam pálidos, a cor da terra,
a cor do sangue pisado.
de que cor eram os olhos do centurião convertido?
A calça azul de seo Raul
para mim
faz parte da Bíblia.

Adélia Prado

 

 

09.07.2009

 

Este filme foi inteiramente filmado com um telemóvel nas ruas de Nova Iorque e Sidney.

“A humanidade não é uma ilha.”

esta história é sobre duas cidades
divididas por um grande mar
unidas pela esperança

fome
por entre os teus olhos

a nossa cidade é famosa feliz
podes sentir o coração

amo Sidney
amo Nova Iorque

mas o que é que amamos hoje
as pessoas ou o lugar

é pelas esmolas
que medimos a empatia?

eu hoje estou ao teu lado
desvio sempre o olhar

casacos botas bem usadas

é proibido permanecer

olharemos por ti
diz a nossa cidade

a tua família não te reconhece
o teu pai miúdos mãe irmãos
quando os viste pela última vez

não há destino que condescenda
não há flores arco-íris felicidade 

eu hoje estou ao teu lado
não desviei o olhar

uma história de todas as esquinas

a amável arte de ouvir
a tua verdade pensamento espírito interior
não é indiferente para mim

é isto a liberdade?

a humanidade não é uma ilha

Fim

Realizador e produtor: Jason Van Genderen
Co-produtor: Shane Emmett
Música: John Roy

obrigado
aos sem abrigo de Nova Iorque e Sidney

 

 

06.07.2009

Voz: Luís Miguel Cintra 

 

 

03.07.2009

Num velho livre topei com uma palavra escrita,
Que como um choque me marcou e ilumina toda a minha vida:
E quando me entrego ao prazer embotante,
E à essência prefiro a aparência, a mentira e o falso semblante,
Quando, de ânimo leve, a mim mesmo me engano com pequenos nadas,
Como se fosse clara a escuridão, como se a vida não tivesse mil portas brutalmente fechadas,
E repito palavras cuja vastidão nunca senti,
E agarro coisas cujo sentido profundo não vivi,
Quando, com mãos aveludadas, o sonho bem-vindo me acaricia
E de trabalhos e dias me alivia,
Alienado do mundo, estranho à minha própria consciência,
Então ergue-se em mim essa palavra: Homem, torna à tua essência!

Ernst Stadler (1883-1914)

 

 

01.07.2009

Amo toda a sabedora, toda a verdade, toda a fome de justiça, todo o trabalho que dá felicidade, toda a alegria.

Amo a alegria dos amantes. Amo sumptuosamente a vida e danço por entre mundos inimagináveis.

Eu sou o fogo. Eu sou a luz. Sou o um antes de todo o número. Sou o outro antes de toda a diferença. Eu sou o dia. Eu sou a noite: Sou a sombra, o abismo, a voragem, a fonte original, o fundo dos fundos, o poço, o oceano: eu sou o dia.

Sou a palavra, o nome, o verbo, a razão para além da razão, a força geradora, as primeiras palavras, o começo antes de todos os começos: em mim tudo é nascimento.

Amo toda a loucura, todo o desejo desmedido de justiça a, toda a esperança sem razão, toda a perseverança insensata, todo o ir para além dos limites impostos.

Amo a cólera, a grandeza, a magnificência, a força, o poder nu do Criador. Eu sou a paz. Em mim só há doçura. Creio, espero e suporto tudo. Eu sou o amor. Amo a alegria e a dor do amor.

Qual é o meu sinal? Um certo cambiante da ternura, um matiz no tom mais subtil da ternura humana, um nada, um não sei quê, o amor louco na sua discrição perfeita.

Aceito tudo. Aceito o grito, aceito o horror e o silêncio e o esquecimento e a porta que se fecha sobre mim e as trevas e as loucuras. Aceito a carne morta, o coração de fel, os pensamentos podres. Aceito a oferta insignificante, o ramo de urtigas, o pedaço de côdea, o prato de lentilhas ressequidas. Aceito tudo.

Eu sou as lágrimas. Eu sou a paz. Eu sou a dor do mundo.

Eu sou o nada, o nada, o ausente, o inatingível. Sou o vazio no vazio, o nada do nada. Sou para além das palavras, para além do mundo, para além de tudo.

E sou os olhos, a mão, a carne. Sou o pão, o vinho, o óleo e a água e os pés do caminhante infatigável divagando fora de todos os caminhos sobre o grande lago amargo.

Eu sou a alegria pura, a alegria celeste, sou a glória, a respiração, a carne viva, a aurora da iluminação, a presença inviolável, a génese permanente do espanto.

Qual é o meu sinal? Um não sei quê entre as mãos, no rosto, nos lábios, quando desponta do coração a primeira bondade, o grande respeito, o amor que se esquece a si mesmo.

Eu sou a paciência, sou o tempo, sou o amontoar de histórias sucessivas, sou a continuação, sou o começo, sou o tudo. Sou o mais distante, o horizonte dos horizontes, o esquecido, o inacessível.

Sou o imaginário. Sou a treva dos sentidos. Sou a noite do espírito. Sou a criança, o jogo, o prado verde onde sabe bem rebolar. Sou a idade, a antiguidade, o tesouro enterrado há muito tempo. Sou a infância e a juventude do mundo.

Sou o esplendor de tudo. A plenitude, a recapitulação, a recuperação, a soma, a esfera, o tudo em todos. Eu sou o ínfimo, a brecha imperceptível, o desvio que não se vê, a diferença esquecida, o desconhecido, a pedra abandonada pelos construtores, o rebotalho, o homem atirado para fora da cidade, o caixote do lixo dos supliciados.

Eu sou o pai e a mãe. Sou nascimento. Sou o vencedor da morte, mais que o eros e mais que o desejo. Sou a violência tão doce que fulmina. Sou o terapeuta infatigável. Sou a maior loucura, sou a loucura extrema, a penetração da noite, o dar à luz da aurora, a génese do impensável. Sou o espírito da carne, a alma do mundo. Sou o inacessível, o inadmissível, o impossível.

Sou a fraqueza absoluta, a miséria, a fome, o luto, o abandono, a glória. Sou o que dá a vida, o que dá a glória, o que dá o dom, o pai bom, a mãe cheia de ternura.

Sou o ouro puro, a pérola rara, o sétimo céu, a vida sem fim. Eu sou o homem. ecce homo.

Maurice Bellet (n. 1923)

 

 

30.06.2009

 

 

29.06.2009

Assim ele tinha a paixão dos objectos,
conchas, rodas, ramos secos, utensílios,
coisas aparentemente desmembradas e soltas,
que encontrava ao acaso em ferros-velhos,
pequenas lojas escuras, vãos de porta, recantos poeirentos,
ou apanhava do chão quando passava,
entre vagos montões de sucata ou de lixo,
e depois se transformavam
quando ele lhes encontrava na casa um local certo,
porque conhecia a sua identidade profunda,
o rosto oculto que elas não revelavam facilmente.
Deixava-as vir devagar à superfície de si próprias,
as suas mãos eram sempre pacientes com as coisas,
e também o olhar que descobria a sua intimidade
e a partir delas as combinava, porque nem todas se entendiam entre si,
era preciso estar atento às suas afinidades ou
disparidades, mesmo às menos evidentes.
Mas ele tinha o segredo da harmonia.

Teolinda Gersão (n. 1940)

 

 

26.06.2009

 

 

 

 

25.06.2009

Pequeno poemário de Sophia, por Eurico Carrapatoso (excerto)

 

 

24.06.2009

Que seja o caminho a vir ao teu encontro.
Que o vento sopre sempre a teu favor.
Que o brilho do sol aqueça o teu rosto
a chuva caia suave nos teus campos

e, até que nos voltemos a encontrar,
que Deus te guarde na palma da Sua mão.

Bênção irlandesa

 

 

19.06.2009

Sophia de Mello Breyner sobre D. António Ferreira Gomes

 

 

18.06.2009

A 15.ª Pedra: Diálogo entre Manoel de Oliveira e João Bénard da Costa

 

 

 

 

16.06.2009

Os exames atacam o tempo.
Ocupam. Preocupam.
Tomam os nossos dias todos,
como um miúdo mimado
que não gosta de repartir guloseimas.
Obrigam a viver por detrás
das persianas.
«Desculpem hoje não vou.»
«Desculpem hoje não estou.»
Os exames trazem outros ritmos.
Empilham-se textos. Desfilam leituras.
Acho que já sei. Acho que nada sei.
Não há, por aí, quem ajude?

Os exames atacam o tempo.
Ocupam tudo.
Acontece, talvez por isso,
tropeçarmos mais vezes em nós.
«O que ando a fazer aqui?»
«Estou bem?»
«Gosto do que estudo?»
«Gosto do modo como estudo?»
«Para que serve tudo isto?»
Atenção: estas perguntas valem tanto como as que vêm no teste.

Os exames atacam o tempo.
Põem-nos longe dos outros.
Há que tempo não os vemos.
Acontece, talvez por isso,
os sentirmos, afinal, mais perto,
Chegados ao coração.

Nos exames damos por nós a pensar,
mais vezes em Deus.
Não só porque troveja.
Mas porque pensar n’Ele faz-nos bem.
Dizemos-Lhe coisas. Pedimos ajuda.
Que Ele nos dê a «ajuda»
de compreender
como Ele nos apoia sempre.

José Tolentino Mendonça

 

 

15.06.2009

Escrevi teu nome no vento

A voz de Carminho filmada por João Botelho

 

 

09.06.2009

Feliz aquele que cedo se levanta para procurar a Sabedoria
Encontra-a sentada à sua porta

Feliz aquele que se consagra ao inútil e ao gratuito
Entra na liberdade na casa de Deus

Feliz aquele que perde o tempo de simplesmente existir
Encontra o Autor do sétimo dia

Feliz aquele que mergulha nas raízes do seu ser
Sente a Fonte a brotar em si

Feliz aquele que se reconhece mendigo de Absoluto
Dá o nome à fome do seu grito

Feliz aquele que descobre o seu rosto interior
Tropeça na alegria

Feliz aquele que até esquece os seus pecados
Conhece o repouso do Amor

Feliz aquele que olha o outro como Deus o vê
Torna-se aquilo que contempla

Jacques Gauthier

 

 

08.06.2009

Amo-te, ó lei mais suave,
na qual amadurecemos, quando com ela em luta estávamos;
ó grande saudade que não dominámos,
ó floresta da qual nunca saída encontrámos,
ó canção que em cada silêncio cantámos,
ó rede de obscuridade,
em que nossos sentimentos presos abrigávamos.

Tão infinitamente grande te começaste,
naquele dia em que nos começaste,
e tanto amadurecemos nos sóis de tuas horas,
tanto nos alargámos e nos plantámos profundamente,
que em Homens, Anjos e Nossas Senhoras
agora te podes cumprir descansadamente.

Deixa a tua mão na encosta dos céus pousar
e tolera em silêncio o que te estamos na sombra a preparar.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)
In «O Livro de Horas», ed. Assírio & Alvim

 

 

02.06.2009

Se eu tivesse crescido num lugar
onde os dias são mais leves e as horas mais esguias,
inventado teria uma grande festa para te celebrar
e as minhas mãos não te prenderiam assim, frias,
como muitas vezes te prendem, assustadas e duras.

Nesse lugar teria ousado te esbanjar,
ó Presença sem lonjuras.
Como uma bola
ter-te-ia lançado até alcançar
toda a alegria que rola,
para que alguém te apanhasse e, ao teu cair,
saltasse de mãos erguidas para te agarrar
ó coisa das coisas a existir.

Ter-te-ia feito relampejar
como lâmina de espada a reluzir.
E mandaria teu fogo cercar
com o anel de ouro de procedência pura,
e ele havia de mo guardar
sobre mão de alvura.

Não te teria na parede pintado,
no próprio céu, de lado a lado,
e como um gigante te teria formado
como monte, como incêndio a arder,
como vento venenoso da areia dos desertos a crescer…

ou
também pode ser que já alguma vez
te tenha achado…

Meus amigos longe estão,
ainda mal os oiço ao longe rir;
e tu do teu ninho caíste para o chão,
és um passarinho de garras amarelas sem porvir
e de olhos grandes e fazes-me pena então.
(É demasiado grande para ti a minha mão.)
E com o dedo vou uma gota da fonte haurir
e fico à escuta de te ouvir beber,
e sinto o teu e o meu coração bater,
ambos por temer.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)
In «O Livro de Horas», ed. Assírio & Alvim

 

 

01.06.2009

Pede-se a uma criança: Desenhe uma flor! Dá-se-lhe papel e lápis. A criança vai sentar-se no outro canto da sala onde não há mais ninguém.
Passado algum tempo o papel está cheio de linhas. Umas numa direcção, outras noutras; umas mais carregadas, outras mais leves; umas mais fáceis, outras mais custosas. A criança quis tanta força em certas linhas que o papel quase que não resistiu.
Outras eram tão delicadas que apenas o peso do lápis já era de mais.
Depois a criança vem mostrar essas linhas às pessoas: uma flor!
As pessoas não acham parecidas estas linhas com as de uma flor!
Contudo, a palavra flor andou por dentro da criança, da cabeça para o coração e do coração para a cabeça, à procura das linhas com que se faz uma flor, e a criança pôs no papel algumas dessas linhas, ou todas. Talvez as tivesse posto fora dos seus lugares, mas são aquelas as linhas com que Deus faz uma flor!

Almada Negreiros (1893-1970)

 

 

29.05.2009

Referes-te à humildade. Rostos apaziguados
em silencioso teu entendimento inclinados.
Assim andam jovens poetas ao entardecer
nas áleas dos jardins mais afastados.
Assim ficam os camponeses à volta do corpo em prece
quando na morte uma criança se perdeu,
e é ainda a mesma realidade que acontece:
algo desmedido sucedeu.

Quem de ti pela primeira vez se apercebe
pelo vizinho e pela hora é incomodado,
anda sobre o teu rasto inclinado
e como carregado dos anos que recebe.
Só mais tarde se aproxima da natureza
e pelos ventos e as distâncias é tocado
ouve-te, sussurrado pelo campo com beleza,
vê-te, pelas estrelas cantado,
e não mais te pode esquecer,
e tudo é apenas o teu manto a se estender.

Para ele és novo e próximo e bom rapaz
e como uma viagem maravilhoso,
que ele em silenciosos barcos ditoso
num grande rio faz.
O país é amplo, envolto em ventos, aplanado,
a grandes céus abandonado
e a antigas florestas submetido.
As pequenas aldeias que se vão aproximando,
de novo como repicar de sinos desaparecendo
e como um ontem e um hoje vivido
e como tudo o que fomos vendo.
Mas junto ao curso deste rio enorme
sempre cidades se estão a levantar
e vêm como em bater de asas conforme
à viagem festiva se juntar.

E por vezes o barco a sítios vem,
que solitariamente, sem aldeia nem cidade,
algo esperam junto às ondas, com serenidade,
aquele que pátria não tem…
Para esses aí pequenos carros há
(cada um com três cavalos à frente já),
que sem fôlego correm para o entardecer
num caminho que acabou por se perder.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)
In «O Livro de Horas», ed. Assírio & Alvim

 

 

28.05.2009

Tu és o futuro, aurora imensa
sobre as planícies da eternidade.
Tu és o cantar do galo depois da noite da temporalidade,
o orvalho, a missa de alva e a mocidade,
o desconhecido, a mãe e a morte tensa.

Tu és a figura a se transformar,
do destino sempre solitária a se erguer,
que permanece por exaltar e por lamentar
e como floresta selvagem por descrever.

Tu és das coisas o cúmulo mais profundo,
que cala a última palavra do seu ser
e que aos outros sempre diferente se vai mostrando:
ao navio costa e à terra navio a aparecer.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)
In «O Livro de Horas», ed. Assírio & Alvim

 

 

27.05.2009

Sou eu, não temas. Não me ouves quebrar
em ti todos os meus sentidos?
O meu sentir que asas veio a encontrar,
voa, branco, à volta da tua face sem ruídos.
Não vês a minha alma de silêncio vestida
mesmo frente a ti aparecida?
Não amadurece minha oração em flor
no teu olhar como numa árvore de suave odor?

Eu sou o teu sonho, se sonhador fores.
Sou a tua vontade, se velar quiseres
e apodero-me da magnificência sem par
e arredondo-me como um silêncio estelar
sobre a estranha cidade do tempo a passar.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)
In «O Livro de Horas», ed. Assírio & Alvim

 

 

25.05.2009

Belo é o estado da Igreja, quando em ninguém, mais que em Deus, se fia.

Pascal (1623-1662)

 

 

22.05.2009

Deus só fala a cada um antes de o moldar,
depois vai com ele em silêncio da noite sair.
Mas as palavras, antes de cada um começar,
estas nubladas palavras a ele se vão dirigir:
Pelos teus sentidos enviado,
vai até ao limite da saudade;
dá-me vestes de todo o lado.
Cresce atrás das coisas como incêndio de verdade
de modo que suas sombras, extensamente,
sempre me cubram totalmente.
Deixa que tudo te aconteça: beleza e terror.
Apenas é preciso avançar: não há sentimento de mais longo teor.
Não te deixes de mim apartar.
Perto está o chão,
a que vida costumam chamar.
É certo que o irás encontrar
e reconhecer pela seriedade maior.
Dá-me a tua mão.

Rainer Maria Rilke (1875-1926)

 

 

21.05.2009

Espírito de Deus nós te damos graças pelo oriente. Nós te louvamos. Mostra-te a nós no esplendor do sol nascente. O leste aponta a direcção dos caminhos da criação e da criatividade, é o lugar em que o dia começa a despontar, o lugar do nascimento e do renascimento. Ilumina as nossas palavras de verdade, ilumina os nossos caminhos. Lembra-Te que nos dás de presente cada dia. Dá-nos a força de ultrapassar a tristeza e de recomeçar em cada dia.

Espírito de Deus nós te damos graças pelo sul. Nós te louvamos. Nós Te damos graças por todas as pessoas e por todas as coisas que nos aquecem o coração. Envia-nos as brisas quentes e apaziguadoras do sul. Enche-nos de compaixão para derreter o gelo que se possa ter formado em volta do nosso coração. Dá-nos, como à Terra, o teu vento quente e acariciador para que possamos aproximar-nos de Ti cheios de ardor. O sul marca o ritmo da vida, o lugar do coração, ele é fonte de generosidade, de sensibilidade e de amor. Ensinaste-nos que, para ser forte é preciso ser também generoso, que para ser sábio, é preciso fazer justiça com clemência e que para ser valente é tão precisa a compaixão como a coragem.

Espírito de Deus nós te damos graças pelo ocidente. Nós te louvamos. Ó Criador, sopro de vida, nós estamos virados para o oeste, para o pôr-do-sol. Faz-nos lembrar que cada instante, cada dia e cada ano, é um presente que nos ofereces, e que virá o momento em que o nosso sol se deitará definitivamente. Nós Te damos graças pelos inúmeros pôr-do-sol vermelhos e cor de malva, e ainda pelo termo da nossa vida. Não nos deixes esquecer que importa deixarmo-nos fundir em ti. O sol põe-se no oeste e faz apelo à nossa maturidade espiritual. Ajuda-nos a compreender que o termo é mais grandioso que o começo. Para o nosso declínio dá-nos cores magníficas, dá-nos um céu soberbo, de modo que quando chegar o momento de Te encontrar nos aproximemos de Ti cheios de brilho.

Espírito de Deus nós te damos graças pelo norte. Nós te louvamos. Nós Te damos graças por este caminho de trevas. A neve lembra-nos os cabelos brancos dos nossos antepassados. Obrigada pelos mais velhos que nos guiam e nos aconselham. Obrigada pelo belo manto de neve que, no inverno, cobre a Terra. Esse manto protege os novos rebentos de árvores, os animais pequenos e a Terra dos ventos glaciares. Ó Criador, enche-nos com a força do norte. Dá-nos a coragem de resistir aos ventos frios. Nós temos necessidade do Teu vigor para suportar o rigor, a dor, tudo o que nos faz ranger os dentes. Faz de modo a que possamos viver uma vida boa e a que estejamos prontos a aceitar o que vem do norte.

Enfim, Espírito de Deus, nós Te damos graças por nos teres dado os quatro pontos cardeais. Colocaste-nos no centro do universo e ensinaste-nos que pertencemos todos à mesma família. Todos os seres humanos emergem da Terra mãe e voltam para o seu seio quando morrem. Ó Criador, ajuda-nos a compreender que os problemas deste mundo decorrem da nossa inabilidade em reconhecer os laços que nos ligam e nos unem uns aos outros e à Terra nossa mãe. Ajuda-nos a cuidá-la e a partilhar com equidade os bens que nos deste. e em restabelecer a nossa relação com todo o planeta e com os nossos semelhantes. Nós Te damos graças pela Tua misericórdia, por nos teres dado a esperança e o sonho. Anima-nos com o teu sopro e unge-nos com a tua força para recomeçar em cada novo dia, com coragem para resistir aos ventos frios, com sensibilidade e generosidade, com compaixão e vigor, com o sentido da urgência pelo cuidado do planeta e de toda a família humana.

Oração de tradição ameríndia
ML

 

 

19.05.2009

Aprendiz de viajante

Hoje sei que o viajante ideal é aquele que, no decorrer da vida, se despojou das coisas materiais e das tarefas quotidianas. Aprendeu a viver sem possuir nada, sem um modo de vida. Caminha, assim, com a leveza de quem abandonou tudo. Deixa o coração apaixonar-se pelas paisagens enquanto a alma, no puro sopro da madrugada, se recompõe das aflições da cidade.
A pouco e pouco, aprendi que nenhum viajante vê o que outros viajantes, ao passarem pelos mesmos lugares, vêem. O olhar de cada um, sobre as coisas do mundo, é único, não se confunde com nenhum outro.
Viajar, se não cura a melancolia, pelo menos, purifica. Afasta o espírito do que é supérfluo e inútil; e o corpo reencontra a harmonia perdida - entre o homem e a terra.
O viajante aprendeu, assim, a cantar a terra, a noite e a luz, os astros, as águas e a treva, os peixes, os pássaros e as plantas. Aprendeu a nomear o mundo.
Separou com uma linha de água o que nele havia de sedentário daquilo que era nómada; sabe que o homem não foi feito para ficar quieto. A sedentarização empobrece-o, seca-lhe o sangue, mata-lhe a alma - estagna o pensamento.
Por tudo isto, o viajante escolheu o lado nómada da linha de água. Vive ali, e canta - sabendo que a vida não terá sido um abismo, se conseguir que o seu canto, ou estilhaços dele, o una de novo ao Universo.

Al Berto (1948-1997)

 

 

13.05.2009

O Segredo de Fátima

À medida que o tempo passa, acredito mais no Segredo de Fátima. Nesse Segredo que desassossega, que nos arranca de casa, dos livros, da cidade e nos lança, anualmente, para a imensidão das estradas. Eu acredito num «não sei quê» que esse Segredo derrama em nós: uma porção de confiança, de abandono e de aventura. Uma vontade de tornar a vida mais que tudo verdadeira. De tornar generosos os projetos e fecundos os laços que nos ligam aos outros. De tornar absoluta a nossa sempre frágil Esperança.
À medida que o tempo passa, vou conhecendo pessoas cujo tesouro interior foi descoberto, ampliado nos caminhos de Fátima. Pessoas que contam histórias simples, misturadas com sorrisos e lágrimas. Histórias de um Encontro tão parecido ao que teve uma rapariga da Judeia, de nome Maria.
Que têm os peregrinos de Fátima? Têm o vento por asas e a lonjura por canto. Têm a conversão por caminho e a prece ardente por mapa. São filhos de uma promessa que se cumpre dentro da vida.
Gosto dessa frase de Vitorino Nemésio que diz: “em Fátima, a Humanidade inteira passou a valer mais”. Gosto, porque nos caminhos longos, imprevistos e profundos de uma peregrinação isso nos é ensinado como uma evidência humilde e apaixonante.

José Tolentino Mendonça

 

 

23.04.2009

Comunguei um dia de tal intimidade que cada palavra de um era recolhida pelo outro sem deturpação. Acontecia o mesmo com cada silêncio. Não se tratava daquela fusão que no início os amantes conhecem e que é um estado irreal e destruidor. Havia, na amplitude do laço que se criara, algo de musical e estávamos simultaneamente juntos e separados como as asas diáfanas de uma libélula. Por ter conhecido esta plenitude, sei que o amor nada tem a ver com o sentimentalismo que perpassa nas canções, nem tão pouco com a sexualidade de que o mundo faz a principal mercadoria - a que permite vender todas as outras.
O amor é o milagre de sermos ouvidos, mesmo estando em silêncio, e de ouvirmos em troca com igual acuidade a vida em estado puro, tão leve como o ar que sustém as asas das libélulas e se alegra com os seus bailados.

Christian Bobin (n. 1951)

 

 

17.04.2009

Receais que eu seja humano, demasiado humano? Desconfiai desse receio; por essa via, podereis derivar para o desumano, acreditando que assim vos aproximais de mim, ou mesmo que falais em meu lugar.
Engano total.

Se quiserdes estar próximos de mim,
tornai-vos tão humanos quanto possível.
É essa a vossa maior proximidade.

Porque a minha distância está para além de toda a distância que vos é dado criar ou compreender.

Permanecei, pois, no vosso lugar.
É aí que Eu estou.

Maurice Bellet (n. 1923)

 

 

16.04.2009

Existe para cada um de nós uma determinada hora em que o conhecimento inconsolável nos invade a alma e a despedaça.
É à luz dessa hora, já chegada ou não, que todos nós nos deveríamos falar, amar, e se possível, rir juntos...
Perante a morte, estaremos como na altura do nosso nascimento, radicalmente privados de qualquer poder.
É a esta nossa fraqueza que, para todo o sempre, o amor se deveria dirigir.

Christian Bobin (n. 1951)

 

 

15.04.2009

Tudo o que sei do céu me vem do espanto que experimento perante a bondade inexplicável desta ou daquela pessoa, à luz de uma palavra ou de um gesto tão puros que me revelam bruscamente que nada no mundo poderia ser a sua origem. (...)
Há almas nas quais Deus vive sem que elas disso se apercebam. Nada deixa supor essa presença sobrenatural, senão a grande naturalidade que inspira aos gestos e às palavras daqueles em que habita.

Christian Bobin (n. 1951)

 

 

14.04.2009

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Os bombeiros salvaram a imagem de Nossa Senhora da igreja de Paganica. O templo está risco de ruina devido ao sismo e às réplicas que ocorreram na região de Abruzzo, Itália.

Fotografias: Reuters/ANSA

 

 

13.04.2009

Nós não vemos a vida – vemos um instante da vida. Atrás de nós a vida é infinita, adiante de nós a vida é infinita. A primavera está aqui, mas atrás deste ramo em flor houve camadas de primaveras de oiro, imensas primaveras extasiadas, e flores desmedidas por trás desta flor minúscula. O tempo não existe. O que eu chamo a vida é um elo, e o que aí vem um tropel, um sonho desmedido que há-de realizar-se. E nenhum grito é inútil, para que o sonho vivo ande pelo seu pé. A alma que vai desesperada à procura de Deus, que erra no universo, ensanguentada e dorida, a cada grito se aproxima de Deus. Lá vamos todos a Deus…
Toda a vida está por explorar: só conhecemos da vida uma pequena parte – a mais insignificante. E o erro provém de que reduzimos a vida espiritual ao mínimo, e a vida material ao máximo. (...)
Deus é eterno… A alma há-de acabar por se exprimir, Deus, que olha pelos nossos olhos e fala pela nossa boca, há-de acabar por falar claro.
Siga a vida seu curso esplêndido. Sabe a sonho e a ferro. É ternura e desespero. Leva-nos, arrasta-nos, impele-nos, enche-nos de ilusão, dispersa-nos pelos quatro cantos do globo. Amolga-nos. Levanta-nos. Aturde-nos. Ampara-nos. Encharca-nos no mesmo turbilhão. Mas, um momento só que seja, obriga-nos a olhar para o alto, e até ao fim ficamos com os olhos estonteados. Eu creio em Deus.

Raul Brandão (1867-1930)

 

 

08.04.2009

Ter sede, ter sede, simplesmente, e abrir os peitos: o vazio que a fé nos trouxe, a graça o cumpre e o enche.

São Cipriano

 

 

07.04.2009

Orar nos dias de angústia

Quando Cristo conhece a solidão, a angústia, quase o abandono do Pai, uma palavra brota dos seus lábios: «Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste?» (Mt. 27, 46) Não é um abandono total, mas Cristo experimenta o sofrimento e a angústia que moram muitas vezes no coração do homem.
Tal é a psicologia do sofrimento: sentir-se só, pensar que ninguém nos compreende, crer-se abandonado. É por causa desta solidão que o Cristo nos deixou a sua palavra como oração, como religião, como fé no verdadeiro Deus.
Não digamos: Deus não respondeu àquele meu pedido, portanto não rezarei mais. Deus existe e ele existe quanto mais tu estás longe dele; Deus encontra-se ainda mais perto de ti quando tu o crês mais longe e surdo à tua oração…
Possa este grito do Cristo nos ensinar que Deus é sempre nosso Pai, que ele jamais nos abandona e que nós estamos mais perto dele do que julgamos.

D. Oscar Romero (1917-1980)

 

 

06.04.2009

Passando das Palmas e dos Ramos, festa divina, para uma festa ainda mais divina, corramos para a venerável e salutar solenidade dos sofrimentos de Cristo; vê-lo-emos submeter-se por nós à sua paixão voluntária e dar a sua vida como resgate de todo o universo. Na nossa gratidão, cantemos um hino, dizendo: Fonte de Misericórdia, ó porta da salvação, Senhor, Glória a Ti.

Liturgia Bizantina

 

 

02.04.2009

“Salvou os outros e não conseguiu salvar-Se a Si mesmo”, comentava-se junto Daquele crucificado, sem perceber nada da sua história.
Na verdade, a história mais simples do mundo, mas por vezes complicamos tanto a simplicidade do mundo! Comprometemos a transparência da vida com o nosso excesso de razões!
No entanto, aquela história, a de Jesus, conta-se assim: «Era uma vez o Amor...». O amor, essa entrega de nós para lá do cálculo e da retenção, a ponto de não conseguirmos viver para nós próprios.
O amor, essa descoberta de que ou nos salvamos com os outros (porque aceitamos o risco de viver para os outros) ou gastamos inutilmente o nosso tesouro.
O que se comentava junto da cruz, naquele dia, não era um insulto, mas o maior dos elogios feitos a Jesus.
Compreender isso é, de alguma maneira, acolher o sentido verdadeiro da Páscoa.

José Tolentino Mendonça

 

 

31.03.2009

Vós sois a verdade e em toda a parte sois presente para responder aos que vos pedem conselho, e em toda a parte e em todo o tempo respondeis aos pedidos que vos fazem. Claramente nos respondeis, mas nem todos claramente ouvem. Pedem o vosso conselho sobre as coisas que querem; mas nem sempre as vossas respostas são as que eles querem. Os mais delicados e fiéis são aqueles que se ocupam menos de vos ouvir no que querem, que em quererem o que de vós ouvem.

Santo Agostinho

 

 

26.03.2009

Os Samaritanos

O vento agita os palmeirais distantes.

Eis chegam de Sicar os habitantes,
ouvindo que está perto a Vida Eterna, a buscar o Rabi, junto à cisterna,
que é perto de Sicar em Samaria.
Voam pombas no azul, ao fim do dia.
O Rabi fala a todos, mansamente.

- «Como é que o Rabi trata com tal gente?»,
rosnam baixo os que o seguem, aturdidos.
- «Não são estes uns homens pervertidos,
uns entes asquerosos, repelentes,
desprezados dos Povos e das Gentes,
alcunhados de imundos pela Lei?»

- «Não são homens sem cultos e sem rei»
- murmuram baixo, torvos, furibundos,
na treva, os Anciãos - «estes imundos
e sórdidos ateus Samaritanos?
Como é que pois fala a tais profanos?
Como é que os ouve e toca, sem receio?»

- Mas o Rabi, tranquilo, vai no meio,
calado, a pé, o manto sobre os ombros,
sem fazer caso algum dos seus assombros,
tratando bem o vil e o miserável,
igual ao Sábio calmo e inquebrantável.,
e ao Sol justo, ao Sol grande e protetor:
- para os quais são iguais o sapo e a flor.

Gomes Leal (1848-1921)

 

 

25.03.2009

As dores da Virgem Santíssima

Onde esconder-te, filho meu, que não te encontrem os malvados?
Em qual das ilhas do Oceano, em qual dos picos desolados?
Não te ensinarei a falar para que contra o mal te eleves.
Sei que terás um coração tão doce, tão afeiçoado,
que nos laços da cólera estarás te retorcendo em breve.

Terás um corpo delicado, terás os olhos azuis.
Vou-te guardar do mau-olhado, te guardar do tempo ruim,
do primeiro susto ao despertar do juvenil ardor.
Não nasceste para as lutas, não nasceste para a cruz.
És um pequeno senhor, não um escravo ou delator.

Levantarei de noite e na ponta dos pés, devagarinho,
me inclinarei para ver-te respirando, passarinho.
Amornarei teu leite, a camomila cheirosa,
e mais tarde, da janela flita, te verei a caminho
da escola: numa das mãos a lousa, na outra o lápis de ardósia.

E se alguma vez o Senhor do céu com a verdade – brilho
de raio – te ferir a mente, não digas nada, filho.
Os homens não podem, feras, o brilho da luz suportar.
Só a verdade do silêncio é cristal; as outras vidrilho.
Se nasceres mil vezes, mil vezes te irão crucificar!

Kóstas Várnalis (1884-1974)

 

 

24.03.2009

Bernardo Sassetti

 

 

23.03.2009

Mais vale ser-se cristão sem o dizer que dizê-lo sem o ser. É bom que ensinemos, mas é melhor que pratiquemos o que ensinamos. Temos um único Senhor, o que disse e tudo se fez; as próprias obras cumpridas em silêncio são dignas do Pai. O que compreendeu verdadeiramente a palavra de Jesus pode ouvir até o seu silêncio; então será perfeito; porque age pela sua palavra, porque se manifesta pelo seu silêncio.

Santo Inácio de Antioquia (67-110)

 

 

03.03.2009

“Adquirir a sua alma na paciência". Quando juntamos as palavras e ponderamos como é que um homem as pode pôr em prática, então a primeira coisa que se requer é que tenha paciência para compreender que não se possui a si mesmo; que tenha paciência para compreender que uma aquisição da sua própria alma na paciência é uma obra da paciência e que, portanto, não deve atender à paixão que, com razão, só pensa que pode crescer na impaciência. O enunciado inculca-o de duplo modo, por, na sua brevidade, compreender uma repetição que reduplica. Ele exorta a adquirir a sua alma "na paciência" e exorta a "adquiri"-la. Esta última expressão  compreende só por si uma exortação à paciência. Ela não diz: agarra a tua alma, como se fosse obra de um instante, como se a alma passasse à sua frente e se tratasse de agarrar o instante e a alma, mas com isso ficasse tudo ou perdido ou conquistado. Também não diz: salva a tua alma, uma expressão que a Escritura, de resto, muitas vezes utiliza com a sua santa seriedade. E é igualmente certo que aquele que adquire a sua alma também a salva. Mas a expressão "salvar a alma" não fixa assim o espírito na paciência e poderia facilmente fazer pensar numa pressa em que tudo tivesse de ser decidido. Pelo contrário, adquirir a sua alma inclina logo o espírito para a tranquila, mas incansável, ação.

Søren Kierkegaard (1813-1855)

 

 

 

02.03.2009

Thomas Merton (1915-1968) 

 

 

 

27.02.2009

A Tentação do Deserto

Num deserto misterioso,
orando, Jesus, em paz,
foi num rochedo anguloso
tentado por Satanás.

Quarenta dias orava,
dos jejuns sofrendo o açoite.
No abismo as horas contava
Satã, Príncipe da Noite.

Os grandes olhos noturnos
do azul sombrio e calado
davam, clarões taciturnos
ao pefil do Fulminado.

Lia-se em todo o seu tosto
de tristeza sem remédio,
não sei que oculto desgosto,
feito de Desdém e Tédio.

Sobre a rocha culminante,
cerrou as asas e o olhar,
como um abutre gigante,
que já não pode voar.,

E a Jesus, num riso misto,
feito de Orgulho e Irrisão,
clamou: «Se acaso és o Cristo,
faze destas lajens pão!»

Como risadas contidas,
as notas da Voz Estranha
reboaram repetidas
pela sinistra montanha.

Mas Cristo, olhando o infinito,
onde mil astros se somem,
tornou: «Satã, está escrito:
- nem só de pão vive o Homem!»

Então Satã, sobre o cume
mais alto, escuro, profundo,
mostrou-lhe quanto resume
vãs pompas, reinos do mundo.

E disse: «Dou-te vaidades,
mirras da Arábia, aloés,
chaves de impérios, cidades,
se me caíres aos pés!»

Mas Cristo, olhando o infinito
de estrelas, cheio de paz,
tornou: «Satã, está escrito:
- Só teu Deus adorarás!»

Então levando o Rabi
do templo sobre as alturas:
- «Se és Cristo, cai do alto ali
sobre aquelas lajens duras.

Porque, se rolares do alto
do templo de Salomão,
não deves ter sobressalto:
os Anjos te ampararão!»

Mas Cristo, olhando o infinito,
e depois a Satanás,
tornou: «Satã, está escrito:
- Teu Senhor não tentarás!»

Então, insultando a larga
esfera do azul sem fim,
com uma risada amarga,
caiu o Maldito enfim.

Mas, ao tombar, com rir fero,
e palavras chocarreiras:
- «Adeus, rabi!... Lá te espero
no Jardim das Oliveiras!»

Gomes Leal (1848-1921)

 

 

 

26.02.2009

Anselm Kiefer
Monumenta 2007, Paris
 

 

 

 

25.02.2009

Meu Deus, aqui me tens aflito e retirado,
Como quem deixa à porta o saco para o pão.
Enche-o do que quiseres. Estou firme e preparado.
O que for, assim seja, à tua mão.
Tua vontade se faça, a minha não.

Senhor, abre ainda mais meu lado ardente,
Do flanco do teu Filho copiado.
Corre água, tempo e pus no sangue quente:
Outro bem não me é dado.
Tudo e sempre assim seja,
E não o que a alma tíbia só deseja.

Se te pedir piedade, dá-me lume a comer,
Que com pontas de fogo o podre se adormenta.
O teu perdão de Pai ainda não pode ser,
Mas lembre-te que é fraca a alma que aguenta:
Se é possível, desvia o fel do vaso:
Se não é, beberei. Não faças caso.

Vitorino Nemésio (1901-1978)

 

 

 

20.02.2009

Silêncio, Madredeus 

 

 

 

19.02.2009

Vós que viveis tranquilos
Nas vossas casas aquecidas,
Vós que encontrais regressando à noite
Comida quente e rostos amigos:
Considerai se isto é um homem
Quem trabalha na lama
Quem não conhece a paz
Quem luta por meio pão
Quem morre por um sim ou por um não.

Primo Levi (1919-1987)

 

 

 

18.02.2009

Atravessar a cidade com Bernardo Sassetti

 

 

 

 

17.02.2009

Tempo a gente tem
Quanto a gente dá
Corre o que correr,
Custe o que custar...

Tempo a gente dá
Quanto a gente tem
Custa o que correr,
Corre o que custar...

O tempo que eu perdi
Só agora eu sei
Aprender a dar
Foi o que ganhei

E ando ainda atrás
Desse tempo
Teee... empo de não correr,
E ele me encontrar,
Ah... não se mexer!
Beija-flor no ar

O rio fica lá
A água que correu
Chega na maré,
Ele vira mar...

Como se morrer
Fosse desaguar!
Derramar no céu,
Se purificar...

Ah... deixar pra trás,
Sais e minerais,

Evaporar...

Evaporar
Interoretação: Little Joy
Composição: Rodrigo Amarante

 

 

 

13.02.2009

Adriana Calcanhoto, Traduzir-se

Poema: Ferreira Gullar; música: Fagner

 

 

 

12.02.2009

Se me aparto de ti, Deus de bondade,
Que ausência tão cruel! Como é possível
Que me leve a um abismo tão terrível
O pendor infeliz da humanidade!

Conforta-me, Senhor, que esta saudade
Me despedaça o coração sensível;
Se a teus olhos na cruz sou desprezível,
Não olhes para a minha iniquidade!

À suave esperança me entregaste,
E o preço de teu sangue precioso
Me afiança que não me abandonaste.

Se, justo, castigar-me te é forçoso,
Lembra-te que te amei, e me criaste
Para habitar contigo o Céu lustroso!

Marquesa de Alorna (1750-1839)

 

 

 

11.02.2009

O canto da Esperança

I

Deixai voar a andorinha,
que da alvorada ao raiar,
ruflando a asa escurinha,
vai novos climas buscar!

Quer no poente ou no levante,
precisa a alma de amar.
Bem basta os tristes que ficam
sem sol, sem ninho, sem par!...

II

Deixai que uma ave emigrante,
ansiosa por viajar,
vá noutro país distante,
numa palmeira arrulhar.

Deixai-a ir! - De asa leve,
que suba aos céus a cantar.
Bem basta os tristes que ficam,
sem sol, sem ninho, sem par!...

III

Deixai a Esperança a toda a hora,
correr nas nuvens, voar,
em busca do Ideal, embora
canse o peito, falte o ar.

Deixai-a ir. - Vai ao Cristo
pedir que a ensine a curar,
com meigas falas, os tristes,
sem sol, sem ninho, sem par!...

IV

Eis canta. - E ao seu canto terno,
- as campas saltam ao ar,
- rompe em soluços o Inferno,
- Chora e ri a alma do Mar.

Eis canta. - E o Orfeu divino
desce da Cruz a sangrar,
e enxuga os olhos dos tristes,
sem sol, sem ninho, sem par!...

V

Eis canta. - E os Quatro Evangelhos
brilham como uns sóis no ar,
tomba o Inferno de joelhos,
as Fúrias põe-se a chorar.

Eis canta. - E essa voz macia,
perdão... amor... Ave Maria,
beijo de mãe... flauta... luar,
ergue ao Céu todos os tristes,
sem sol, sem ninho, sem par!...

Gomes Leal (1848-1921)

 

 

 

10.02.2009

Deus fala na língua poética

Adélia Prado 

 

 

 

09.02.2009

Ilumina, ilumina, ilumina,
Senhora divina, ilumina
Eu tenho tanta estrada em meu caminho
E muitas ilusões pra tropeçar

Quem segue a tua luz não vai sozinho
Tem sempre uma estrela pra guiar
Transforma minha voz na voz do vento
Que eu levo no meu canto
O sentimento de cantar
Retira dos olhos de Deus este brilho divino
Para o meu destino iluminar

Ilumina, ilumina a escuridão, ilumina
Ilumina quem traz o perdão, ilumina
Ilumina quem trata da flor
Ilumina quem me iluminou
Iluminado seja o amor.

Maria Bethânia

 

 

 

05.02.2009

A caminho do Corvo

Poema de Vitorino Nemésio (1901-1978) dito por Vasco Pereira da Costa

 

 

 

04.02.2009

Todos os dias, todos os segundos sinto que há uma eternidade para contar

 

Pedro Costa (n. 1958)  

 

 

 

03.02.2009

Há o silêncio de antes da palavra.
E aquele que, depois dela, deixa sítio
para subirem pausas
com outras dentro desenvolvendo o limbo
por onde suba inviolável, alta
a melodia do que foi esquecido.
Esse silêncio pauta.
Vai decifrando vestígios
de quanto o precedeu no gasto mapa
de que é possível compulsar o ritmo.
E estar à escuta com, ao fundo, a alma
a desprender-se. Subindo
até o silêncio recobrir a água
e desnudar a solidão do espírito.

Fernando Echevarria (n. 1929)

 

 

 

02.02.2009

Aquela nuvem

Eugénio de Andrade (1923-2005) 

 

 

 

20.01.2009

Se eu quiser falar com Deus

Voz: Elis Regina. Letra: Gilberto Gil 

 

 

 

16.01.2009

Adília Lopes

 

 

 

14.01.2009

Abraça-me Senhor,
traspassa-me com o fogo
consome-me de caridade,
para que esteja em ti e tu em mim.
Céus e terra, anjos e santos
ajudai-me a louvar o Senhor.
Espíritos ardentes, Serafins
vós que bem conheceis o amor e sua potência,
vinde em meu socorro, pois de amor desfaleço.
Minha única esperança.
Glória, refúgio e alegria.
Meu amado,
a ternura por Ti é o meu coração
tornas cada aurora eterna
luz esplendente, meu íntimo paraíso,
único príncipe merecedor de ser amado.
Quando me farás um sinal?
Quando me atrairás a Ti para ser comigo um só espírito?
Ó amado
amado, digo, com todas as forças
minha doçura, minha vida, escuta-me.
Não olhes para como sou indigno.
Apenas a Tua misericórdia esteja em mim.

Pedro de Alcântara (séc. XVI)

 

 

 

13.01.2009

A criação do mundo

 Marcel Marceau (1923-2007)

 

 

 

12.01.2009

Queria de ti um país

Mário Cesariny (1923-2006)

 

 

 

09.01.2009

Cânone da Mãe de Deus

Canto ortodoxo romeno

 

 

 

08.01.2009

António Lobo Antunes entrevistado por Mário Crespo

 

 

 

07.01.2009

João Pedro Oliveira

 

 

 

05.01.2009

Começam a chegar pessoas
trazendo presentes para
o recém-nascido

——  De sua formosura  
deixai-me que diga:  
é belo como o coqueiro  
que vence a areia marinha.  

——  De sua formosura  
deixai-me que diga:  
é tão belo como um sim  
numa sala negativa.  
  
——  é tão belo como a soca  
que o canavial multiplica.  

——  Belo porque é uma porta  
abrindo-se em mais saídas.  

——  Belo como a última onda  
que o fim do mar sempre adia.  

——  é tão belo como as ondas  
em sua adição infinita.  
  
——  Belo porque tem do novo  
a surpresa e a alegria.  

——  Belo como a coisa nova  
na prateleira até então vazia.  

——  Como qualquer coisa nova  
inaugurando o seu dia.  

——  Ou como o caderno novo  
quando a gente o principia.  

——  E belo porque o novo  
todo o velho contagia.  

——  Belo porque corrompe  
com sangue novo a anemia.  

——  Infecciona a miséria  
com vida nova e sadia.  

——  Com oásis, o deserto,  
com ventos, a calmaria.  

João Cabral de Melo Neto (1920-1999),  Morte e Vida de Severina

 

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