«Mesmo para cá das convicções religiosas ou espirituais, a imagem do menino Jesus da Lapinha madeirense é a da pura ternura. O menino encara-nos a bendizer o mundo, a bendizer-nos, que somos submetidos à simples manifestação do seu amor.»
É com estas palavras que o escritor Valter Hugo Mãe inicia a sua coluna na mais recente edição do "Jornal de Letras", sublinhando que as representações de Jesus «da Lapinha madeirense são cândidas, distribuem a vulnerabilidade e a beleza, como se estivessem a pedir sobretudo a esperança».
«Creio que é por isso que me fascinam, são crianças deslumbrantes a pedir que não percamos a esperança», declara o escritor, para quem «muito estranho» entrar numa sala onde as crianças levantam as mãos para abençoar o visitante.
«Somos o centro desse gesto, como se fôssemos sagrados intensamente, como se fôssemos avidamente convidados ao mistério antigo de Deus. Subitamente, sendo que as imagens têm por média uns vinte ou trinta centímetros, somos nós que nos apequenamos, sobretudo porque destituídos da mesma pureza ou, mais tragicamente, da mesma esperança», assinala.
A exposição, considera o autor, é um convite «a legitimar a experiência de viver»: «Quero dizer, uma centena de crianças pergunta a que altura estamos nós de cumprirmos nossos sonhos e correspondermos às nossas convicções éticas. As vitrinas todas perguntam sobre a nossa dignidade».
Depois de referir que o menino da Lapinha oferece «uma generosa capacidade para propor a alegria», Valter Hugo Mãe escreve sobre o encantamento do Jesus madeirense que tem em casa: «Fico sob o gesto daquela criança que, mesmo aquém de convições religiosas, é a ternura inteira no móvel onde guardo livros».
Rui Jorge Martins