D.R.
O mistério pascal é descrito nos evangelhos através de uma série de eventos com um significado espiritual profundo. Desde a decisão de Pôncio Pilatos à crucifixão, especial enfâse tem sido dada àqueles que conduziram ao sofrimento e morte de Jesus Cristo. A fim de que os visualizássemos e para que todos os compreendessem, foram criadas e desenvolvidas outrora as catorze estações da Via Crucis.
Todavia, o mistério é duplo. A primeira parte corresponde aos eventos acima descritos, mas existe uma segunda parte igualmente importante: a Resurreição de Cristo e os acontecimentos que se lhe seguiram e levaram à Ascensão de Jesus e ao Pentecostes. Estes não têm sido considerados igualmente fundamentais pela tradição, o que cada vez mais é inadmissível. Demasiada enfâse é dada ao sofrimento, e quase nenhuma à esperança e à vitória da vida sobre a morte. A expressão que subsume o todo: per crucem ad lucem – pela Cruz para a luz – tem sido apenas parcialmenteconsiderada.
Por conseguinte, em 1991, na Sexta-feira Santa, o Papa João Paulo II apresentou a Via Lucis – catorze estações mediante as quais se torna possível meditar e rezar sobre a Resurreição, a Ascensão de Jesus e o Pentecostes. Não existe ainda consenso sobre quais destes acontecimentos em concreto devem ser escolhidos como estações, nem têm as autoridades da Igreja dirigido quaisquer recomendações a esse respeito – portanto, existem muitas variações (como aconteceu, de resto, ao longo do tempo com a Via Crucis).
Para a Capela Imaculada de Braga foi pintada uma série de onze telas – tantas quanto o espaço disponível permitiu. Porém, a interpretação dos quadros autoriza uma certa complexidade, pelo que representam mais do que onze estações. Ali também foi incluído o sacramento da Reconciliação, essencial naquele espaço e portanto colocado no centro da série.
As estações constantes na Capela são as seguintes:
1. Cristo ressuscitou; no túmulo vazio estão dois anjos a receber os discípulos.
2. Noli me tangere. Enlutada, Maria Madalena encontra Jesus fora do túmulo, mas apenas o reconhece quando ele pronuncia o seu nome. Ela, então, exclama: Rabbuni!, e quer tocá-lo. Mas ele diz: Não me detenhas, pois ainda não subi para o Pai.
3. Jesus aparece aos discípulos, que não o reconhecem senão quando parte o pão.
4. Jesus aparece novamente aos discípulos, que saúda dizendo: A paz esteja convosco. Assim como o Pai me enviou, também Eu vos envio a vós.
5. Jesus aumenta a fé de Tomé, o discípulo incrédulo, deixando que ele toque as suas chagas.
6. O sacramento da Reconciliação.
7. A pesca junto ao lago de Tiberíades. Os pescadores estavam com pouca sorte: a faina é fraca. Jesus aparece e diz-lhes que lancem as redes para o lado direito do barco. Fazendo o que ele diz, apanham grande quantidade de peixes e reconhecem-no.
8. Os discípulos são enviados. Disse-lhes: Vinde comigo e eu farei de vós pescadores de homens. (Mt 4, 19)
9. Em Mt 16, 18, Jesus diz: Também Eu te digo: Tu és Pedro, e sobre esta Pedra edificarei a minha Igreja.
10. A Ascensão de Cristo.
11. O Pentecostes. À luz do Espírito Santo, todas as línguas se apresentam como uma só e todos os povos das diferentes nações, de súbito, se entendem.
A Via Crucis requer uma forma-linguagem dramática: fortes contrastes, formas gráficas, uma mensagem clara, tons escuros, imagens descamadas até ao essencial.
A Via Lucis incita a uma maior abstração. Cristo deixou de estar entre nós – mostra-se, mas apenas de forma efémera, quase transparente. Gradualmente, deixa a sua forma terrena para juntar-se ao mundo espiritual, legando aos discípulos a missão de espalhar a luz. A série representa este empreendimento e a forma como Jesus ajuda os discípulos a enfrentarem os momentos de confusão e desamparo, preparando-os desta forma para a grande missão. As cores tornam-se mais claras, mais amenas, a forma é mais conceptual. Além isso, foi utilizado o ouro para sublinhar a preponderância e o valor destes acontecimentos.
Estas pinturas a têmpera foram executadas sobre painéis de madeira de tília. A têmpera é a técnica mais antiga conhecida e aquela que é tradicionalmente utilizada na pintura dos ícones. Trata-se de uma técnica reconhecida e usada na pintura contemporânea em virtude da sua superior capacidade de manutenção, por muitos anos, da luminosidade das cores e do brilho que estas irradiam nas diferentes luzes do dia.