"O bom samaritano" | © Christopher Ruane
A primeira palavra de Jesus no Evangelho do quinto domingo da Páscoa (João 14, 15-21) é «se»: «Se me amardes». Um ponto de partida tão livre, tão humilde, tão frágil, tão confiante, tão paciente. Não diz: tendes de me amar. Nenhuma ameaça, nenhuma obrigação, podereis aderir e podereis recusar em total liberdade.
Mas, se me amardes, sereis transformados numa outra pessoa, tornar-vos-eis como Eu, prolongamento dos meus gestos, eco das minhas palavras: se me amardes, observareis os meus mandamentos. Não por dever, mas como expansão para o exterior daquilo que já aperta dentro, como a linfa da vida na primavera, quando aperta no córtex duro dos ramos e abre-os, para nascer em forma de gema e folhas.
Até agora o mandamento de Jesus dizia: Amarás Deus, amarás o teu próximo, amar-vos-eis uns aos outros como Eu vos amei; agora acrescenta-se a si próprio aos objetivos do amor. Não dita regras, faz-se mendigo do amor, respeitoso e generativo. Não reivindica o amor, espera-o.
Mas amá-lo é perigoso. Com efeito, nos sete versículos do trecho evangélico Jesus reitera um conceito, ou melhor, um sonho: unir-se a mim, habitar em nós. E fá-lo com palavras que dizem união, companhia, encontro, intimidade, numa divina uniformidade, humilde e sublime: estarei convosco, irei para junto de vós, em vós, para vós, vós em mim e Eu em vós.
Jesus procura espaços, espaços no coração, espaços de transformação: se me amardes, tornar-vos-eis como Eu. Eu posso tornar-me como Ele, adquirir nos meus dias um sabor de Céu e de história boa; sabor de liberdade, de mansidão, de paz, de força, de inimigos perdoados, e depois de mesas cheias, de pequeninos abraçados, de relações boas e fecundas que são a beleza do viver.
Quais são os meus mandamentos de que fala Jesus? Não são o elenco das Dez Palavras do monte Sinai; não são as ordens exigentes ou os conselhos sábios dados naqueles três anos de itinerância livre e feliz do rabi de Nazaré.
Os mandamentos a observar são, antes, aqueles gestos que reassumem a sua vida, com os quais não há engano possível: é verdadeiramente Ele. Ele que se perde atrás da ovelha perdida, atrás de publicanos e prostitutas, que faz das crianças os príncipes do seu Reino, que ama em primeiro, ama em perda, ama sem esperar retribuição.
«Como Eu o fiz, assim fareis também vós.» Ele que se cinge com uma toalha e lava os pés, que parte o pão, que no jardim estremece juntamente com o tremente coração da sua amiga («mulher, porque choras?»), que na praia prepara o peixe sobre brasas para os seus amigos. Mandamentos que confortam a vida. Enquanto que nas suas mãos arde o orifício dos pregos incandescentes da crucificação.