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Quaresma e Tríduo Pascal: Rito, fé e cultura

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Quaresma e Tríduo Pascal: Rito, fé e cultura

Da Quaresma, que começa na Quarta-feira de Cinzas e termina na termina pela tarde de Quinta-Feira Santa, antes da missa vespertina da Ceia do Senhor, ao Tríduo Pascal, ponto culminante do ano litúrgico que se inicia com esta eucaristia e conclui no domingo de Páscoa, apresentamos algumas das celebrações e ritos católicos da Igreja que, não raro, marcam também as sociedades com raízes ligadas ao cristianismo.

 

Cinzas

No rito romano o início da Quarema é qualificado pelo símbolo austero das Cinzas que marca a liturgia da Quarta-feira de Cinzas. Fazendo parte do antigo conjunto de ritos da penitência a que se submetiam os pecadores convertidos, o gesto de se cobrir com cinzas significa o reconhecimento da própria fragilidade e mortalidade, necessitada de ser redimida pela misericórdia de Deus.

Bem longe de ser um gesto puramente exterior, a Igreja conservou-o como símbolo da atitude do coração penitente que cada batizado é chamado a assumir no itinerário quaresmal. Por isso, os fiéis que acorrem a receber as Cinzas deverão ser ajudados a perceber o significado interior implicado neste gesto que orienta para a conversão e para o compromisso da renovação pascal.

Depois de aspergir as cinzas com água benta, o sacerdote impõe-as aos presentes na missa que se aproximarem dele e diz a cada um «Arrependei-vos e acreditai no Evangelho» ou «Lembra-te, homem, que és pó da terra e à terra hás-de voltar».

 

Veneração a Cristo crucificado

No Tríduo Pascal – desde a missa vespertina de Quinta-feira Santa ao Domingo de Páscoa – a Sexta-feira Santa é o dia por excelência da “Adoração da Santa Cruz”. Mas a piedade popular gosta de antecipar a veneração cultual da Cruz. No decurso da Quaresma, na sexta-feira que, por uma tradição cristã antiquíssima, é dia comemorativo da Paixão de Cristo, os fiéis orientam espontaneamente a sua piedade para o mistério da Cruz.

As expressões de devoção a Cristo crucificado, numerosas e variadas, alcançam particular relevância nas igrejas dedicadas ao mistério da Cruz ou naquelas em que se veneram relíquias consideradas autênticas. Com efeito, a “Invenção da Santa Cruz” que, segundo a tradição, teria acontecido na primeira metade do século IV, com a subsequente difusão pelo mundo inteiro de veneradíssimos pedacinhos, determinou um notável incremento do culto à Cruz.

Nas manifestações de devoção a Cristo crucificado, os elementos habituais da piedade popular, como cantos e orações, gestos como a exposição, o beijo, a procissão e a bênção com a cruz, cruzam-se de diversos modos, dando lugar a exercícios de piedade.

Na fé cristã, a Cruz é expressão do triunfo sobre o poder das trevas e, por isso, é apresentada toda incrustada de pedras preciosas, tendo-se tornado símbolo de bênção, quer quando é traçada sobre si próprio quer quando o é sobre outras pessoas e objetos.

Importa mostrar aos fiéis a referência essencial da Cruz ao acontecimento da Ressurreição: a Cruz e o sepulcro vazio, a Morte e a Ressurreição de Cristo são inseparáveis na narração evangélica e no desígnio de Deus.

 

Paixão de Cristo

O texto bíblico, pormenorizado na narração dos vários episódios da Paixão de Cristo, fizeram com que os fiéis voltassem também a sua atenção para aspetos singulares daqueles acontecimentos e fizessem deles objeto de devoção particular.

O “Ecce Homo” (Eis o Homem), Cristo vilipendiado, «com a coroa de espinhos e o manto de púrpura» (João 19,5), que Pilatos mostra ao povo; as santas chagas, sobretudo a ferida do lado e o sangue vivificante que dela jorra; os instrumentos da Paixão, como a coluna da flagelação, a escadaria do pretório, a coroa de espinhos, os cravos e a lança do trespassamento; o Santo Sudário ou lençol da deposição do corpo de Cristo.

 

Leitura da Paixão

A Igreja recomenda que na Quaresma as comunidades cristãs profiram a leitura bíblica da Paixão de Cristo, sobretudo à quarta e sexta-feira. Fora da celebração litúrgica, poderá ser dramatizada, confiando a vários leitores os textos correspondentes às diversas personagens; como também pode ser intercalada com cantos e momentos de silêncio meditativo.

 

Via-sacra

Entre os exercícios de piedade com que os fiéis veneram a Paixão de Jesus poucos são tão amados como a Via-sacra, que percorre o último trajeto da caminhada percorrida por Jesus durante a sua vida terrena, desde o Monte das Oliveiras, onde numa «propriedade chamada Getsémani» (Marcos 14,32) Jesus ficou «cheio de angústia» (Lucas 22,44), até ao Monte Calvário, onde foi crucificado entre dois malfeitores (cf. Lucas 23,33), ao jardim onde foi deposto num sepulcro novo, escavado na rocha (cf. João 19, 40-42).

Testemunho do amor a este exercício de piedade são as incontáveis vias sacras colocadas nas igrejas, nos santuários, nos claustros e também ao ar livre, no campo ou ao longo da encosta de uma colina.

A Via-sacra, ou "Via Crucis", é a síntese de várias devoções surgidas na Idade Média: a peregrinação à Terra Santa, durante a qual os fiéis visitam devotamente os lugares da Paixão de Jesus; a devoção às «quedas de Cristo» sob o peso da cruz; a devoção aos «passos dolorosos de Cristo» que consiste em ir processionalmente de uma igreja para outra em memória dos percursos feitos por Cristo durante a sua Paixão; a devoção às «estações de Cristo», isto é, aos momentos em que Jesus para ao longo da caminhada para o Calvário por ser obrigado pelos algozes ou por estar muito cansado ou, porque procura dialogar com os homens e mulheres que assistem à sua Paixão.

Na sua forma atual, já testemunhada na primeira metade do século XVII, a Via-sacra, difundida sobretudo por São Leonardo de Porto Maurício (m. 1751), aprovada pelo Vaticano e enriquecida com indulgências, consta de 14 estações.

Na Via-sacra confluem várias expressões da espiritualidade cristã: a conceção da vida como caminhada ou peregrinação; como passagem, através da cruz, do exílio terreno à pátria celeste; o desejo de se conformar profundamente com a Paixão de Cristo; as exigências do seguimento de Cristo, pelo qual o discípulo deve caminhar atrás do Mestre, levando diariamente a sua cruz (cf. Lucas 9,23).

A Igreja recomenda que a Via-sacra termine de tal modo que os fiéis se abram à expectativa da vida eterna, pelo que pode concluir-se com a memória da ressurreição de Cristo.

Os textos para a Via-sacra são incontáveis e continuam anualmente a ser produzidos. Uma realização sábia da Via-sacra, em que palavra, silêncio, canto, caminhada processional e paragem de reflexão se alternam de maneira equilibrada, contribui para criar frutos espirituais.

 

Domingo de Ramos

A Semana Santa inicia-se no Domingo de Ramos, celebração que une o triunfo de Cristo e o anúncio da sua Paixão.

A procissão que comemora a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém tem um caráter festivo e popular. Os fiéis gostam de conservar nas suas casas e por vezes nos lugares de trabalho as palmas ou ramos de oliveira ou de outras árvores que foram benzidos e levados em procissão.

 

Quinta-feira Santa

A piedade popular é sensível à adoração solene do Santíssimo Sacramento que segue a celebração da Missa na Ceia do Senhor (Quinta-feira Santa à tarde). O Corpo e Sangue do Senhor, presentes nas hóstias e no vinho consagrados, são retirados do sacrário e transferidos para o “lugar da reposição”. Com este esvaziamento assinala-se a morte de Jesus, que depois de descido da cruz foi colocado no túmulo, onde terá permanecido cerca de 40 horas.

A reposição do Corpo e Sangue de Cristo é orientada essencialmente para a comunhão na ação litúrgica – e não “missa” – de Sexta-feira Santa, bem como para os doentes. O Sacramento é guardado num tabernáculo fechado e não deve ser exposto.

Durante a manhã os padres das dioceses congregam-se em torno do seu bispo na sé, como sinal da unidade eclesial e da renovação do seu sacerdócio. É a denominada "missa crismal", onde o bispo consagra o Santo Crisma, usado nos doze meses seguintes nas unções do Batismo e da Confirmação, e benze os óleos a aplicar nos catecúmenos (que se preparam para receber o Batismo) e na Unção dos Doentes.

 

Ação litúrgica de Sexta-feira Santa

Na ação litúrgica da tarde, a Igreja medita na Paixão, intercede pelo mundo, adora a Cruz e comemora a sua origem do lado aberto de Jesus (c. João 19, 34).
Entre as manifestações da Sexta-feira Santa, além da Via Sacra, sobressai a procissão do “Senhor morto”, que volta a propor o pequeno cortejo de amigos e discípulos que, depois da deposição da Cruz do corpo de Jesus, levam-no ao lugar em que estava «o sepulcro talhado na rocha, onde ainda ninguém tinha sido sepultado» (Lucas 23, 53).

Em geral esta procissão realiza-se num ambiente de austeridade, silêncio e oração.

 

Representação da Paixão de Cristo

Na Semana Santa, sobretudo na Sexta-feira, têm lugar representações da Paixão de Cristo, que muitas vezes se podem considerar exercícios de piedade. Estas representações sacras mergulham as suas raízes na liturgia cristã. Algumas, nascidas em ambiente monacal, através de um processo de dramatização progressiva, passaram para o adro da igreja.

Em muitos lugares a preparação e execução destas representações é confiada a confrarias, cujos membros assumiram especiais compromissos de vida cristã. A Igreja preconiza que estas dramatizações sejam fiéis à expressão sincera e gratuita de piedade e não assumam os carateres próprios das manifestações folclóricas que fazem mais apelo ao interesse dos turistas do que ao espírito religioso. Por outro lado, são de rejeitar as práticas penitenciais que consistem em fazer-se crucificar com pregos.

 

Virgem das Dores

A piedade popular realçou a associação da Mãe de Jesus à Paixão do seu Filho. Entre elas destacam-se o “Planctus Mariae”, intensa expressão de dor, que com frequência contém elementos de elevado mérito literário e musical, na qual a Virgem chora a morte e o extravio da humanidade. Na “Hora da Desolada Mãe das Dores” os fiéis “fazem companhia” a Maria, que ficou mergulhada em profunda dor depois da morte do filho único.

 

Encontro do Ressuscitado com a Mãe

A afirmação litúrgica segundo a qual Deus encheu de alegria a Virgem na ressurreição do Filho foi traduzida e quase representada pela piedade popular no exercício do “Encontro da Mãe com o Filho ressuscitado”: na manhã de Páscoa encontram-se dois cortejos, um levando a imagem da Mãe das Dores, o outro a de Cristo ressuscitado.

A “Procissão do Encontro” sucede igualmente na Quaresma, embora em contexto diverso: um cortejo levando a imagem de Cristo com a cruz às costas, a caminho do Calvário, cruza-se com outro que transporta a imagem da Virgem. O encontro pode constituir também uma das estações da Via Sacra.

 

Sábado Santo

A mais importante celebração do ano litúrgico, a Vigília Pascal, decorre habitualmente no fim do dia, entrando pelo Domingo de Páscoa. A celebração pascal realizava-se antigamente durante o dia, e daí surge a expressão “Sábado de Aleluia”, ainda hoje usada.

Num dia pontuado pelo silêncio e recolhimento, os fiéis juntam-se pela manhã nas paróquias para rezar o Ofício de Leitura e as Laudes, incluídos na denominada Liturgia das Horas.

A Vigília Pascal começa com a "Liturgia da luz": acende-se o fogo e nele se ilumina o Círio Pascal, que dá luz às velas dos fiéis; seguem-se as leituras bíblicas e a homilia; na terceira parte decorre a Liturgia batismal, que inclui a entoação da Ladainha dos santos, a bênção da água, os batismos e, para os já batizados, a renovação das suas promessas; por fim, a Liturgia eucarística, com a apresentação de dons e a comunhão.

 

Visita pascal (Compasso)

O Tempo Pascal, a começar no Domingo de Páscoa, é um período privilegiado para a bênção anual das famílias nas suas casas, que tem grande tradição e ritual próprio em algumas dioceses de Portugal.

Pode ser dirigida por um padre, diácono, religioso, seminarista ou outro leigo, homem ou mulher, frequentemente acompanhado por um grupo que entra nas casas cujas famílias tenham pedido a bênção; a cruz pode também ser dada a beijar pelas ruas ou coletividades.

O compasso varia entre regiões mas normalmente terá sempre alguns destes elementos: a ressurreição de Cristo é proclamada com sinos e Aleluias; ao entrar, dá-se a paz à casa; a cruz, que pode estar ornamentada, é beijada pelos moradores; a residência pode ser abençoada com água benta trazida numa caldeirinha; o pároco ou seu representante recebe o folar, que além de designar bolo ou pão, significa dinheiro ou outro presente; o grupo que faz a visita pascal é convidado a servir-se da mesa; nas povoações do interior ouve-se o rebentar de foguetes durante o dia.

 

Bênção da mesa familiar

Além da bênção dos ovos, símbolo da vida, é costume abençoar-se a mesa familiar: com a água benzida na Vigília Pascal, que os fiéis levam para suas casas, o chefe de família ou outro membro da comunidade doméstica abençoa a mesa de festa.

 

Diretório sobre a piedade popular e a liturgia
Edição: Rui Jorge Martins
Publicado em 27.02.2015 | Atualizado em 17.04.2023

 

 
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Na fé cristã, a Cruz é expressão do triunfo sobre o poder das trevas e, por isso, é apresentada toda incrustada de pedras preciosas, tendo-se tornado símbolo de bênção, quer quando é traçada sobre si próprio quer quando o é sobre outras pessoas e objetos
Na Via-sacra confluem várias expressões da espiritualidade cristã: a conceção da vida como caminhada ou peregrinação; como passagem, através da cruz, do exílio terreno à pátria celeste; o desejo de se conformar profundamente com a Paixão de Cristo; as exigências do seguimento de Cristo, pelo qual o discípulo deve caminhar atrás do Mestre, levando diariamente a sua cruz
A procissão que comemora a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém tem um caráter festivo e popular. Os fiéis gostam de conservar nas suas casas e por vezes nos lugares de trabalho as palmas ou ramos de oliveira ou de outras árvores que foram benzidos e levados em procissão
Durante a manhã os padres das dioceses congregam-se em torno do seu bispo na sé, como sinal da unidade eclesial e da renovação do seu sacerdócio. É a denominada "missa crismal", onde o bispo consagra o Santo Crisma, usado nos doze meses seguintes nas unções do Batismo e da Confirmação, e benze os óleos a aplicar nos catecúmenos (que se preparam para receber o Batismo) e na Unção dos Doentes
Na Semana Santa, sobretudo na Sexta-feira, têm lugar representações da Paixão de Cristo, que muitas vezes se podem considerar exercícios de piedade. Estas representações sacras mergulham as suas raízes na liturgia cristã. Algumas, nascidas em ambiente monacal, através de um processo de dramatização progressiva, passaram para o adro da igreja
A Vigília Pascal começa com a "Liturgia da luz": acende-se o fogo e nele se ilumina o Círio Pascal, que dá luz às velas dos fiéis; seguem-se as leituras bíblicas e a homilia; na terceira parte decorre a Liturgia batismal, que inclui a entoação da Ladainha dos santos, a bênção da água, os batismos e, para os já batizados, a renovação das suas promessas; por fim, a Liturgia eucarística
O compasso varia entre regiões mas normalmente terá sempre alguns destes elementos: a ressurreição de Cristo é proclamada com sinos e Aleluias; ao entrar, dá-se a paz à casa; a cruz, que pode estar ornamentada, é beijada pelos moradores; a residência pode ser abençoada com água benta trazida numa caldeirinha; o pároco ou seu representante recebe o folar
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