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Sobre a aplicação da eutanásia a um menor

É uma notícia chocante [a da aplicação da eutanásia, pela primeira vez no mundo, a um menor, na Bélgica, em setembro de 2016], tanto mais que cada um de nós que está em idade adulta e tem filhos se pôs na pele daqueles pais e experimentou pensar como teria gido no seu lugar. Eu fiquei chocada sobretudo pelo consenso do menor que a lei belga prevê se ele é capaz de o dar (menor quer dizer até aos doze anos). O que lhe terão dito para lhe arrancar aquele terrível assentimento?

Eu só sei que teria dito ao meu filho para não aceitar a eutanásia, porque qualquer instante como ele teria sido para mim abençoado, ainda que ele estivesse gravemente doente: nunca teria aceitado de estar junto dele e sentir só a sua respiração alguns minutos menos do que aqueles que nos teriam sido concedidos por Deus, pelo destino, pela natureza… Porquê eliminar tempo à mais preciosa das relações humanas? Porquê considerar vida digna, relação digna, só aquela entre pessoas saudáveis, só aquela com crianças saudáveis que brincam, comem gelados, fazem birras para dormir?

Deste episódio emerge na raiz uma desvalorização fundamental da relação humana, como ligame que une construindo sentimentos, pensamentos, sofrimentos, iluminações. Esse ligame que faz de nós pessoas autênticas, capazes de compaixão. Capazes de olhar não só para a morte dos nossos queridos, mas também para a nossa morte. Sem relações humanas dignas deste nome, ficamos privados de espessura, seres que se contentam com prazeres efémeros e de míseras satisfações.



«Além da cura, o único conforto para o sofrimento é dar e receber amor. Como se se pudesse eliminar o sofrimento da vida eliminando quem sofre, isto é, eliminando os doentes, como se se pudesse viver num infinito anúncio publicitário»



Não consigo, realmente, imaginar como puderam os pais dizer ao seu filho que não podiam mais com aquela relação, que queriam dissolvê-la. Em vez de o assegurar com a sua presença, fazendo-lhe sentir que o amavam totalmente, mesmo no fim da vida. Pobre pequeno, que além da doença teve de experimentar este abandono!

E não convencem as justificações que se baseiam em sofrimentos insuportáveis: hoje, a medicina paliativa pode agir sobre o sofrimento, ainda que ao preço da perda de consciência do paciente. Se, verdadeiramente, já não está consciente, se verdadeiramente não sente e não compreende… Muitas pessoas que regressaram do coma e da sedação médica descreveram que mesmo quando a nós pareciam ausentes, sentiram as palavras dos presentes, tiveram pensamentos e sensações. Era preciso estar junto do pequeno até ao fim, ajudando-o com todos os cuidados paliativos possíveis para acalmar a sua dor, era preciso fazer-lhe sentir que a sua vida tinha sentido mesmo assim, que o ligame com os pais era verdadeiro e estava vivo, mesmo se ele não corria e não brincava, mesmo se ele não era o orgulho dos pais mas a causa do seu tremendo sofrimento. Que, seguramente, é imenso.

E que será ainda mais forte depois desta decisão. Porque, além da cura, o único conforto para o sofrimento é dar e receber amor. Como se se pudesse eliminar o sofrimento da vida eliminando quem sofre, isto é, eliminando os doentes, como se se pudesse viver num infinito anúncio publicitário.


 

 
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