É urgente evangelizar a cultura e evangelizar na cultura
(...) É urgente evangelizar! Urgente evangelizar o meio envolvente, que tanto ganhará no reencontro com o Evangelho de Cristo! Urgente evangelizar a cultura e evangelizar na cultura, para que os diversos sectores e ambientes se refresquem na água viva do Espírito! Urgente incentivar o testemunho laical, da família à escola, da escola à profissão, da prisão ao hospital, ao tempo livre até, para que realmente liberte.
O nosso horizonte próximo será necessariamente a missão. E a missão de vizinhança, que especialmente urge. Aplica-se também à nossa diocese a constatação feita por João Paulo II, há escassos cinco anos, na exortação apostólica pós-sinodal Ecclesia in Europa, nº 46: “Com efeito, a Europa faz parte já daqueles espaços tradicionalmente cristãos, onde, para além duma nova evangelização, se requer em determinados casos a primeira evangelização. A Igreja não pode subtrair-se ao dever dum corajoso diagnóstico, que lhe permita predispor as terapias mais oportunas. Mesmo no ‘velho’ continente existem extensas áreas sociais e culturais onde se torna necessária uma verdadeira e própria missio ad gentes”.
Mas falemos, para já, de “nova evangelização”. Nova evangelização capaz de reavivar o brasido religioso que ainda subjaz a tantas manifestações do nosso povo católico. Sofre desvios por falta de catequese, sofre concorrência por via doutras propostas, não católicas ou neo-pagãs… No essencial número 34 da exortação apostólica pós-sinodal Christifideles Laici, de há vinte anos, João Paulo II já foi peremptório: “Noutras regiões ou nações, porém, conservam-se bem vivas ainda tradições de piedade e de religiosidade popular cristã: mas esse património moral e espiritual corre o risco de esbater-se sob o impacto de múltiplos processos, entre os quais sobressaem a secularização e a difusão das seitas. Só uma nova evangelização poderá garantir o crescimento de uma fé límpida e profunda, capaz de converter tais tradições numa força de liberdade autêntica”.
É o que temos por diante, a nova evangelização. E nesta nos empenharemos todos, clérigos, consagrados e leigos, em corresponsabilidade activa e criativa. Vamos divisando o ano de 2010 como ocasião propícia para uma “missão diocesana” que não podemos pospor. Cumpre-se a primeira década do novo milénio: - Porque não tentar?! E não pensemos em grandes acções, extraordinárias e vultosas, embora alguns momentos envolventes e festivos possam acontecer. Será sobretudo a altura para todas as comunidades cristãs da diocese – paróquias e capelanias, congregações, associações e movimentos – oferecerem aos circunstantes o Cristo vivo que transportam e as transporta a elas, com aqueles “novo ardor, novos métodos e novas expressões” que João Paulo II requeria para a “nova evangelização”, há um quarto de século.
Os primeiros agentes desta missão serão precisamente as comunidades, embora se requeira o precioso concurso daquelas congregações e associações que nasceram para a missão popular, há mais ou menos tempo. Pois, como diz também o citado número da Christifideles Laici, “é urgente, sem dúvida, refazer em toda a parte o tecido cristão da sociedade humana. Mas a condição é a de se refazer o tecido cristão das próprias comunidades eclesiais”.
E, se as comunidades cristãs hão-de ser o sujeito principal da missão, elas serão também o seu melhor fruto e maior lucro. Como diz ainda o mesmo trecho: “Esta nova evangelização, dirigida não apenas aos indivíduos mas a inteiras faixas de população, nas suas diversas situações, ambientes e culturas, tem por fim formar comunidades eclesiais maduras, onde a fé desabroche e realize todo o seu significado originário de adesão à pessoa de Cristo e ao seu Evangelho, de encontro e de comunhão sacramental com Ele, de existência vivida na caridade e no serviço. Os fiéis leigos têm a sua parte a desempenhar na formação de tais comunidades eclesiais, não só com uma participação activa e responsável na vida comunitária e, portanto, com o seu insubstituível testemunho, mas também com o entusiasmo e com a acção missionárias dirigida a quantos não crêem ainda ou já não vivem a fé recebida no Baptismo”.
Não tenhamos dúvidas neste ponto, porque será decerto como sempre foi: a vida duma diocese – como da Igreja toda – nunca se resolve dentro de si mesma, no sentido intimista do termo, ou em reorganizações tentadas para melhorar o funcionamento interno. A vida da Igreja apenas progride na retomada franca e generosa da missão, no anúncio de Cristo e no serviço ao mundo. As comunidades amadurecem quando a generalidade dos seus membros, na variedade dos ministérios e carismas, se unificam nas duas projecções que unicamente hão-de ter: o louvor divino e o apostolado multiforme. Em absoluta circularidade, aliás: o louvor divino impulsiona-nos necessariamente à evangelização e à caridade universais, de um só Pai para uma só humanidade, através da Igreja de Cristo unida na missão que o Espírito impulsiona; retornando tudo em acção de graças ao mesmo Pai, que tudo origina. (...)
D. Manuel Clemente, Bispo do Porto e Presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais
Homilia na Missa Crismal, 20.03.2008
21.03.2008
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