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A esperança num abraço

Parece a reedição em versão pop da parábola do bom samaritano. A campanha Free Hugs («abraços grátis»), nascida há vários anos na Austrália e agora difundida em todo o mundo, propõe-se distribuir «atos de benevolência» de modo totalmente casual e gratuito.

O vídeo que Juan Mann – idealizador da campanha – realizou num centro comercial de Sidney, num momento da sua vida de particular solidão, teve mais de setenta milhões de visitas. Neste vídeo o protagonista, com um ar vagamente hippie (barba crescida, cabelos compridos), vai em busca de um gesto de carinho da parte de estranhos. Segurando um enorme cartaz com a escrita «abraços grátis», inicialmente obtém desconfiança e o compreensível temor que se trate de um louco. Mas, quando uma pequena velhinha, curiosa por aquela escrita tão insólita, deu um passo em frente e se deixou abraçar, então desencadeou uma emulação contagiosa entre os viandantes. Porque os gestos espontâneos são contagiosos, como os risos. Deste modo, vencida a desconfiança inicial, desencadeou até uma competição pelo abraço mais original, quase uma forma de "happening".

Depois, o fenómeno através da rede transmigrou para o mundo inteiro: não só nos Estados, mas inclusive no Japão e na Europa. Um destes vídeos que obteve maior difusão foi rodado em Sondrio. Também na pequena cidade lombarda se verificaram as mesmas dinâmicas de interação entre desconhecidos que se observaram no vídeo originário de há alguns anos (realizado contudo do outro lado do mundo): desconfiança inicial e depois entusiasmo envolvedor. Isto porque, onde se verifica uma solicitação sincera de socorro ou só um pedido momentâneo de contacto humano, parece que em cada um se desencadeia um impulso incondicionado de solidariedade para com o próximo.

A Free Hugs Campaign, que inicialmente surgiu como uma solicitação pública de abraço por parte de um indivíduo e dirigida à multidão indistintamente, transformou-se numa improvisada e rara ocasião de interação e contacto entre estranhos num lugar público. O que emerge desta experiência é que também uma massa indistinta de pessoas – como as que animam um centro comercial ou um aeroporto, onde aparentemente cada um se mantém distante, preocupado exclusivamente com as próprias vicissitudes pessoais – tem em si uma solicitação latente de envolvimento humano e proximidade com o outro que, todavia, não tem ocasião para manifestar.

Isto porque a nossa sociedade é altamente vigiada, onde os dramas ao ar livre são raros, na qual as ocasiões para exercer uma forma de caridade são organizadas racionalmente, circunscritas em nichos sociais distantes e distintas dos espaços da vida diária. De facto, também os mendigos não se distribuem casualmente nas nossas cidades mas partilham com método quase científico sempre as mesmas encruzilhadas principais.

E eis que é suficiente uma insólita e imprevisível circunstância e os mesmos espaços públicos tão pessimista e precipitadamente julgados humanamente estéreis – Marc Augé definiu-os com o neologismo não-lugares, ou seja, territórios assinalados pelo consumo de massa, pela satisfação frenética do desejo, lugares de trânsito no quais as pessoas se cruzam sem nunca iniciar qualquer tipo de relação – ao contrário, voltam a pulsar de humanidade e fraternidade.

Pois ninguém, por mais que esteja mergulhado nos próprios problemas, é deveras prisioneiro do próprio horizonte estreito de vida mas ao contrário é sempre capaz de se abrir, onde haja uma ocasião imprevista, para um gesto gratuito de esperança simbólica.

 

 

 

 

Cristian Martini Grimaldi
In L'Osservatore Romano
© SNPC | 15.03.12

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