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Pré-publicação

"A primeira geração incrédula"

«Porque é que na Igreja se veem cada vez menos jovens e desaparecem, ano após ano, os grupos de jovens paroquiais? (...) Como justificar o analfabetismo cristão, e sobretudo bíblico, das novas gerações, num espaço cultural do qual a Bíblia representa, sem dúvida nenhuma, um dos grandes códigos de sentido e do qual muitas vezes se recordam as raízes cristãs?»

"A primeira geração incrédula", do italiano Armando Matteo, (Paulinas Editora), procura dar uma resposta a estas questões, ao mesmo tempo que aponta caminhos possíveis para uma nova abordagem da Igreja à relação com os jovens.

Na semana em que o Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura organiza a sua Jornada Nacional, dedicada ao tema "Culturas Juvenis Emergentes", com inscrições ainda aberta, oferecemos a pré-publicação de alguns excertos desta obra.

 

A primeiro geração incrédula

«Podemos dizer que agora também os jovens – ou talvez sobretudo os jovens – deixaram de ter antenas para Deus, para a fé e para a Igreja.

Os sinais mais evidentes de tal incredulidade e desinteresse em relação a Deus e à Igreja são pelo menos três: uma ignorância profunda da cultura bíblica; uma escassa participação na formação cristã pós-crismal; uma notável desenvoltura na deserção da assembleia eucarística dominical.

Tudo isto nos diz que eles não sentem interesse nenhum pelas questões abordadas pelo Cristianismo. Interesse é entendido aqui em sentido forte, como algo que toca o próprio ser, o próprio viver, o próprio agir e esperar.

Alguns jovens, ao serem entrevistados, não negam a sua necessidade do sagrado, mas depois demonstram concretamente que não sabem quase nada da práxis cristã relacionada com a fé e com a oração. Com efeito, até podem dizer «sou crente», mas depois ignoram completamente a Bíblia.

Tal afirmação, na realidade, aplica-se – segundo um inquérito recente – a oitenta e seis por cento daqueles que se professam católicos e que correspondem a oitenta e oito por cento da população total [em Itália]. Também podem dizer, «sou católico », mas depois nunca puseram os pés na igreja, praticamente desde o dia do crisma. Só 9,4 por cento dos jovens declara que frequenta pelo menos uma vez por semana a vida paroquial.

Uma profissão de cristianismo que, no entanto, não cultiva familiaridade alguma com a gramática bíblica do sentido do humano, que não se apercebe da urgência de um seu contínuo aprofundamento e que, sobretudo, deserta do encontro semanal com Aquele que toda a comunidade dos crentes professa como Senhor do tempo e da história, não serve para grande coisa. Não serve para quem afirma tê-la, não serve para a comunidade crente que poderia alegrar-se com essa opção de princípio.

Assim, o sentido de religiosidade de que os jovens se sentem portadores também ultrapassa a questão da fé: em alguns casos, pode responder «à necessidade de ter uma referência moral (mesmo vaga), que permita aquietar a consciência e dar livre espaço a um estilo de vida fundamentalmente a-religioso» – são as conclusões do inquérito Iard sobre jovens, religião e vida quotidiana –, e, em muitos outros, a um uso do cristianismo, na linha da pertença sem crença, que serve sobretudo para pôr a ridículo a própria identidade cultural, num mundo cada vez mais multicultural e multirreligioso.

É esse tipo de raciocínio que nos leva a afirmar que hoje nos encontramos perante aquela que pode ser definida como a «primeira geração incrédula» do Ocidente: uma geração que não se põe contra Deus nem contra a Igreja, mas uma geração que está a aprender a viver sem Deus e sem a Igreja.

Entre os muitos «sem» que (...) marcam a geração dos nossos jovens de vinte-trinta anos («sem pressa de crescer, sem trabalho estável e perspetivas seguras, sem uma intenção próxima de constituir família, sem as prerrogativas sociais possuídas pelos seus coetâneos do passado, sem espaços nem papéis de relevo capazes de oferecer segurança e de fazer sentir o seu cunho geracional»), há outro «sem» que se impõe aqui: uma geração pura e simplesmente «sem» Deus e «sem» Igreja.

Como é óbvio, estes rapazes e estas raparigas, estes jovens da «primeira geração incrédula», não surgem do nada. Trata-se, com efeito, de uma geração à qual ninguém narrou nem testemunhou a força, a beleza, a importância humana da fé; de uma geração que ninguém ajudou a desenvolver o sentido da transcendência, da invocação, do desejo, da criaturalidade, da oração, da comunidade (aliás, muitíssimos também são filhos únicos, criados por pequenos «padrinhos» da própria família e dotados de um excesso de afeto e de presentes).

 

O elo em falta

No Ocidente, durante um período muito longo, a transmissão da fé era uma simples questão «de casa», não de Igreja. Nascer e tornar-se cristão eram acontecimentos que ocorriam em perfeita sincronia. Para usar uma imagem muito plástica, aprendia-se a fé enquanto se era amamentado pela própria mãe. Além disso, nessa missão de iniciação/mistagogia ao mundo da fé, também davam uma mão muito importante as professoras daquele «pequeno mundo antigo» que era a Europa, sobretudo a Itália, até finais dos anos oitenta.

Aqueles que nasceram antes dessa data receberam, com efeito, no seio da família e mediante a formação escolar elementar, um primeiro e eficaz anúncio da fé. Aqui, «primeiro» não se deve entender apenas em sentido cronológico, mas no sentido de iniciação idónea. Pensemos na aprendizagem de uma língua: como é difícil aprender uma língua (estrangeira) em adulto e como é quase natural quando se é criança. A primeira língua é chamada, precisamente, «língua materna». A par da língua materna, os jovens criados antes de 1980 receberam também o alfabeto do Evangelho, mas depois, como se verá, afastaram-se dele ou a sua prática foi diluída.

De qualquer modo, a respeito da transmissão da fé, a comunidade dos crentes, no passado, podia confiar seguramente nesta mistagogia anónima e válida do mistério cristão, realizado pelas avós, pelas mães e pelas professoras. Cabia-lhe depois consolidar a fé e predispor as condições para a sua prática: na liturgia comunitária, nas obras de caridade, no testemunho público, no empenho pelo bem comum.

A certa altura, esta correia de transmissão entre as gerações viria a ser quebrada. A iniciação ao humano – dever essencial da família e da escola – já não se inspira na gramática cristã da existência: por isso, hoje em dia, nascer e tornar-se cristão são duas coisas diferentes. As crianças já não se tornam cristãs, enquanto são amamentadas pela mãe, para retomar a imagem atrás evocada. Esta nova situação começou a verificar-se há pelo menos trinta e cinco/quarenta anos, desde que a sociedade começou a explorar novas modalidades de referência ao humano, em relação às sugeridas e transmitidas no passado, fortemente inspiradas por um sentido cristão geral da vida.

Do ponto de vista da religião cristã, eis agora a novidade do nosso tempo: os jovens não receberam informação nenhuma acerca da verdadeira conveniência da fé, não sabem por que razão deveriam crer ou por que razão deveriam rezar. Como resultado, abandonam a Igreja mal recebem o sacramento do Crisma, mantêm-se à devida distância das paróquias e dos oratórios mal se alargam as malhas da custódia familiar, não se preocupam com o seu analfabetismo cristão, arrumando em lugar seguro o Evangelho ou a Bíblia adquiridos para a catequese. Não se apercebem, por fim, da íntima necessidade de celebrar o dia do Senhor como momento para recolher e relançar a grande aventura que é a vida de cada um de nós. Ninguém os ajudou a desenvolver, no seu coração, antenas para Deus. São incrédulos, pura e simplesmente incrédulos.

Talvez se deva, porém, refletir sobre a qualidade do ensino da religião cristã na escola, opção muitas vezes mais desejada pelos pais do que pelos filhos, mas que só raramente tem sabido assumir um tom e um estilo em consonância com aquilo que com ele se visa obter. Com maior frequência, infelizmente, tem sido a ocasião propícia para convencer os jovens da inutilidade da fé para a vida.

 

Armando Matteo
In A primeira geração incrédula, ed. Paulinas
17.06.13

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