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Arquitectura

A capela de S. Bento, de Peter Zumthor (3/4)

A capela de São Bento, em Sumvitg, na Suiça, é uma das mais pequenas obras de Peter Zumthor, mas também uma das suas mais conhecidas. A sua origem deve-se a um concurso promovido para substituir a antiga capela do século XVI, destruída em 1984 por uma avalanche, e onde se propunha uma implantação do novo edifício, não sobre as ruínas existentes, mas num local menos exposto. É deste modo que a capela se vem a localizar numa encosta próxima, a que se acede por um pequeno caminho serpenteante que sobe desde a aldeia, numa típica imagem do ambiente rural.

O desenho da capela assume-se herdeiro de uma vasta tradição arquitectónica religiosa, para o que terá contribuído o acompanhamento ao projecto realizado pelo P. Daniel Schönbächler, monge do mosteiro de Disentis, filósofo, teólogo e professor de arte contemporânea. Como as antigas igrejas, distingue-se claramente dos restantes edifícios, mas apesar da sua assumida e explícita contemporaneidade, dialoga com as vizinhas casas de madeira como se estivesse estado sempre ali.

“Apesar da forma do edifício ser estranha, a presença de uma obra de arquitectura contemporânea com raízes que penetram bastante fundo na história da arquitectura, evoca memórias que me parece valerem bem mais a pena do que qualquer citação directa de uma forma tradicional.”

Conceptualmente, a capela proposta por Zumthor para cerca de 40 pessoas e construída inteiramente em madeira, enquadra-se por inteiro no modus operandi do arquitecto suíço, onde respeito pela tradição e atenção ao enquadramento são conceitos chave.

“Em Sogn Benedetg, a madeira, material de construção utilizado habitualmente pela população local, foi usada na capela. O novo edifício mostra-nos esta tradição local e a habilidade das pessoas no trabalho com este material. Isto representa uma outra imagem da Igreja – daquela que não é apenas uma lição ensinada por peritos, mas duma que é feita também dos contributos das comunidades locais.”

A planta da capela, orientada no tradicional eixo nascente-poente, tem a forma de uma folha, que geometricamente é um lemniscado de Bernoulli – curva algébrica do quarto grau, usada para desenhar o símbolo do infinito \infty -, conceito à partida forte e repleto de conteúdo no traçado de um espaço religioso. O modo como esta curva se desenvolve, provoca um efeito peculiar no espaço interior da capela, tornando-o mais centralizado que alongado, quebrando o efeito perspéctico e conduzindo a atenção para um ponto nuclear da capela, que, aqui, coincide com o local onde se encontra o altar.

No entanto, e apesar da centralidade criada, a sequência de sete bancos de madeira que acompanham o perímetro da pequena nave, caracterizam a assembleia desta capela como do tipo processional. A este nível e tal como refere o monge beneditino Frédéric Debuyst, “neste lugar isolado, a pesquisa litúrgica não foi impulsionada para mais além.”

A capela vive, assim, da sua arquitectura de detalhe excepcional, onde a mestria de Peter Zumthor, no domínio das possibilidades da madeira enquanto material de construção, se revela totalmente. Trinta e sete pilares de madeira afastados das paredes definem o ritmo da curva e do espaço, enquanto suportam a cobertura, estrutura em madeira que recria uma imagem de veios numa folha ou do interior de um barco. A combinação destes dois elementos – pilares e cobertura – sugerem um grande baldaquino, que cobre e unifica a totalidade do espaço. No cimo das paredes de madeira e a separá-las da cobertura, uma banda de altas janelas não permite observar a paisagem circundante, mas tão só iluminar naturalmente o interior a partir do alto. No exterior, o revestimento de lamelas de madeira decapadas à mão por um artesão local, dão coesão a todo o edifício, ao cobrirem igualmente o espaço vazio criado pela nave suspensa.

Com isto tudo, a capela de Peter Zumthor surpreende pela simplicidade da sua complexidade. Pacificamente enquadrada na paisagem, melhor ainda se integra na história da arquitectura religiosa, ao inovar na continuidade, mostrando que as novas linguagens arquitectónicas são capazes de pertencer à tradição arquitectónica cristã.

 

Visite a capela de S. Bento

 

 

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A igreja, a capela e o oratório de Peter Zumthor (1/4)

 

Saiba mais sobre a exposição "Peter Zumthor: Edifícios e Projectos 1986-2007", integrada no «warm-up» da ExperimentaDesign Lisboa 2009

 

João Alves da Cunha
Arquitecto

09.10.2008

 

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