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I Domingo da Quaresma

Encontrar a fonte no deserto

Jesus está cheio do Espírito Santo depois do seu baptismo (Lucas 4,1) mas tem a barriga vazia. O Espírito condu-lo ao deserto. A um lugar onde não encontra nada, onde a vida não é possível. Jesus é confrontado consigo próprio e como o que traz no seu interior.

 

No deserto, a prova do encontro consigo próprio

O encontro de si mesmo na solidão pode ser um tempo benéfico, um tempo de descoberta de si, longe dos ruídos e das distracções de toda a espécie. Mas nunca se está totalmente só no deserto, longe disso. Cada pessoa leva consigo aquelas vozes já escutadas, vindas de outros lugares, que tornam difícil distinguir o que vem de Deus, o que vem de si, o que a habita verdadeiramente e o que não é mais do que uma miragem. Aceitar ouvir todas estas vozes e entrar em diálogo com elas implica consentir atravessar o deserto como uma prova. O que exige força de carácter e um bom discernimento.

~ImagemBotticelli

 

As Escrituras no coração da vida de Jesus (Lucas 4, 1-13)

No deserto, Jesus tem fome. O confronto consigo próprio exige tempo. E à medida que ele vai passando, as necessidades humanas tornam-se prementes. É nestas circunstâncias críticas que o verdadeiro carácter da pessoa se revela em plenitude. É quando estamos com problemas, sozinhos e sem meios que conhecemos o que vai no nosso coração e quem verdadeiramente somos. As necessidades pressionam-nos a satisfazê-las, deixando-nos livres para nos trairmos e para nos tornarmos noutra coisa...

ImagemWilliam Blake

É então que o diabo nos diz: “se deixares de seres quem és, saberás saciar as tuas necessidades”. No caso de Jesus, a proposta traduz-se por: “Se és Filho de Deus, diz a esta pedra que se transforme em pão (4, 3)”. Jesus responde com a ajuda das Escrituras que O nutrem, citando o livro do Deutronómio (8, 3): “Nem só de pão vive o homem”. Jesus está esfomeado mas não deixa que a sua fome o conduza ou lhe imponha uma identidade outra. Alimentado pela Palavra de Deus, não se deixa tomar como um deus; vive a sua fome humana e deixa que a pedra permaneça uma pedra.

ImagemDuccio

O demónio decide mudar de estratégia. Promete a Cristo todos os reinos da terra, em troca da sua submissão. Jesus quer fazer o bem à sua volta; inquieta-se com o sofrimento dos outros. Se ele tivesse o poder absoluto sobre a terra, poderia, talvez, resolver todos os problemas. O poder de fazer o bem em torno de si é muito tentador mas é um ardil. Não se pode decidir em vez dos outros; o próprio Deus abstém-se de o fazer! A tentação de deter o poder é uma mentira. Nada do que o diabo oferece lhe pertence. Só Deus é o Todo-Poderoso. A Ele pertencem toda a Terra e todos os reinos. Se Deus se guarda de administrar todas as coisas como um rei, os seus filhos seriam loucos se o tentassem...

ImagemKramskoy

Por uma segunda vez, Jesus apoia-se no livro do Deuteronómio (6, 13-14) para reconhecer a soberania e a sabedoria de Deus: “Ao Senhor, teu Deus, adorarás e só a Ele prestarás culto” (Lucas 4, 8). Jesus quer ajudar o seu próximo, mas imita, humildemente, o exemplo de Deus. Por isso não seguirá o demónio nos seus delírios de grandeza.

ImagemJuan de Flandes

Depois de duas tentativas frustradas, o diabo compreende o peso que Jesus concede à Palavra de Deus. Por conseguinte cita o Salmo 90, 11-12 (que é lido neste Domingo). Se Jesus crê na Palavra de Deus, deverá atirar-se do alto do Templo de Jerusalém, pois está escrito: “Aos seus anjos dará ordens a teu respeito, a fim de que eles te guardem; e também: Hão-de levar-te nas suas mãos, com receio de que firas o teu pé nalguma pedra” (Lucas 4, 9-11). O demónio aproveita a ocasião para embaraçar Jesus a partir do que Ele mais valoriza: a Palavra de Deus. Cita a Escritura mas desfigura-a e altera-lhe o sentido para servir os seus fins. Mas Jesus, que conhece todos os livros sagrados, percebe o estratagema e cita outra passagem do livro do Deuteronómio (6, 16) que desmarcara o jogo do diabo: “Não tentarás ao Senhor, teu Deus” (Lucas, 4,13).

Imagem

Jesus tem fome mas o demónio esgota-se. Cristo soube centrar-se na sua fome real e aceitá-la, em vez de tentar escapar a essa realidade nas miragens do poder e da grandeza que o demónio lhe colocou debaixo dos olhos. Esfomeado, Cristo soube discernir o que verdadeiramente O alimentava. Atravessou a prova com coragem e as miragens esfumaram-se.

ImagemIlja Repin

 

A memória, para uma fé viva (Deuteronómio 26, 4-10)

A primeira leitura é extraída do livro do Deuteronómio, que Jesus brilhantemente citou para combater a astúcia do demónio. Quando os Israelitas tomaram posse da terra que Deus lhes ofereceu, após a libertação do jugo egípcio, recordam-se das maravilhas feitas em seu favor. As Escrituras servem para recordar a experiência de terem sido salvos, onde, quando, como, porquê e por quem. Se os Hebreus pronunciarem fielmente estas palavras contidas nos livros santos, geração após geração, realizarão um rito sagrado. Então terão um guia interior para se precaverem contra todas as tentações que se lhes apresentem. Os acasos da vida não os conduzirão como folhas à mercê do vento. Eles permanecerão solidamente centrados na verdade que os faz viver.

ImagemBriton Riviere

 

A Palavra está próxima de ti (Romanos 10,8-13)

S. Paulo assegura aos cristãos que estão em Roma: ninguém deve sentir-se desguarnecido diante da provação e indigno de ser salvo por Deus. “Todos têm o mesmo Senhor, rico para com todos os que o invocam”, como dizia o profeta Joel (3,5). “Todo o que nele acreditar não ficará frustrado”, de acordo com o profeta Isaías (28,16). Orientar a sua consciência de acordo com o olhar divino é possível, mesmo na hora da prova, porque é “junto de ti que está a palavra: na tua boca e no teu coração” (10,8), segundo o livro do Deuteronómio (30,14). Não foi o que Jesus fez no deserto? Quando se arriscava a sucumbir diante das suas necessidades, ao ouvir as palavras enganadoras do demónio, foi o seu desejo de Deus que O guardou no caminho certo. Ao invocar Deus, encontraremos a Palavra que nos salva.

 

Rodolfo Felices Luna
Universidade de Sherbrooke, Faculdade de Teologia, Ética e Filosofia (Canadá)
In Interbible
Trad.: rm
© SNPC (trad.) | 17.02.13

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