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Literatura

Crença e criação em Gonçalo M. Tavares

A revista “Atual” (“Expresso”) de 6.11.2010 entrevistou o escritor Gonçalo M. Tavares, não a uma mesa mas no trajeto entre o seu ateliê com vista para o Campo Pequeno e o rio. Excertos de um percurso pontuado pela inquietação da crença.

Acredita em Deus?
Essa é a pergunta mais íntima que me podem fazer. A crença é significativa no meu percurtso.

É batizado?
Sou. Mas não é a crença de ser crente. Quero perceber o que é ser crente. Vejo a crença como ‘um a mais’. Perante um crente, nunca me sinto mais reflexivo ou racional. Fico numa situação de inferioridade. A crença é um dos pontos centrais do meu trabalho. Um crente tem uma energia e uma força que eu nao tenho. Os meus livros falam das máquinas, mas em confronto com a crença. Em “Aprender a Rezar na Era da Técnica”, parti de uma imagem que nunca aparece no livro – um homem a rezar ao lado de uma máquina industrial de grandes dimensões, em funcionamento, e dois sons a competir: o som da máquina e o som da oração. (...)

FotoIgreja de S. Domingos

[Na Igreja de São Domingos]
Choca-me a intrusão da tecnologia no espaço religioso. Na catedral do México ouvi uma oração gravada. Sinto que são dois mundos incompatíveis. Não gosto de ver uma aparelhagem numa igreja. É uma invasão. Mas ao mesmo tempo é impressionante como as orações resistem em microfones quando elas surgiram do meio da natureza. É interessante pensar nesses espaços no meio das cidades – estão no meio de qualquer coisa que é a tecnologia. São esconderijos do antigo. Gosto de ver terra nas igrejas, e há pouco disso. Podia haver outro espaço religioso, sem religião. Uma espécie de jardim japonês fechado. Nunca estive tão próximo da crença como agora. (...)

A sua relação com a religião também reflete a passagem do século XX para o século XXI?
Há um regresso mais político da religião, mas a religião nunca esteve ausente. Há uma personagem do Hans Christian Anderson a quem pedem para rezar, e ele só se lembra da tabuada. Depois pedem-lhe a tabuada, e só se lembra da oração. Continua a haver um conflito entre quem acredita que se vai salvar pela oração e quem pensa que vai ser a tabuada, a racionalidade, a tecnologia. No final do século XX; o cientista era a figura mais forte, fazia com que as pessoas morressem mais tarde. (...)

FotoCais das Colunas. Foto: Francisco Santos

[Cais das Colunas]
[Percorremos a Rua Augusta. Para Gonçalo, o rio não tem significado especial.] Este é um sítio mais tranquilo. A proximidade da água, como se a água fosse um espaço natural religioso, diz-nos ‘mais devagar’. Mesmo ao ar livre, entramos noutro espaço, o que tem a ver com o sagrado. E vê-se que as pessoas estão diferentes. É extraordinário. Até os lisboetas param aqui. Os movimentos na igreja e aqui são próximos. Estamos ao ar livre e no meio da confusão. Gosto de elementos que nos digam ‘mais devagar’. Devagar, devagar, devagar... Um livro que mantém a velocidade do mundo exterior não oferece muito.

 

Entrevista conduzida por Cristina Margato
In Atual (Expresso), 6.11.2010
08.11.10

GOnçalo M. Tavares

 

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