Saber parar
Quantas vezes o homem moderno se resigna, porque não tem tempo ou não sabe arranjar tempo para se deter, olhar-se, e tomar consciência de si mesmo. À força de renunciar, não ousa sequer concentrar-se, porque seria brutalmente posto em face de responsabilidades que lhe fazem medo. Correr dá-lhe a impressão de viver. Mas, de facto, só se atordoa, foge a si próprio e condena-se a uma vida instintiva. Já não é um homem, mas um animal. Aceitar deter-se é o primeiro ato que lhe poderá permitir restituir-se a si mesmo.
Se forças constantemente o teu carro, fatigarás o motor.
Se viveres sempre «sob pressão», o teu corpo e o teu espírito ficarão precocemente envelhecidos.
À força de correr, não encontrarás ninguém e, o que é mais grave ainda, não te encontrarás a ti próprio.
Se quiseres compreender o que há de mais profundo em ti, é preciso que te saibas deter.
Comendo de pé, digeres mal. Senta-te.
Pensando a correr, refletes mal. Senta-te.
Não esperes que Deus te detenha para tomares consciência de que existes. Seria tarde de mais, já não poderias merecer.
O vigilante, esgotado pelos seus alunos, gostaria de fugir à aula.
A dona de casa que «deixa andar» tudo de qualquer forma sente-se mal no seu lar.
O homem que não se domina «abandona-se», e passa diante da sua porta sem ousar regressar a casa.
Se te atrasas a pagar a renda da casa, não desejas encontrar o senhorio.
Se por negligência há muito que não procuras o teu amigo, envergonhado, receias abordá-lo.
Se tens medo de te deter, é porque tens medo de te reencontrar contigo mesmo, e se tens medo disso, é porque já não estás habituado a ti, não te reconheces, temes as tuas próprias censuras e exigências.
Não tens tempo para parar? Sê leal, há momentos livres nas tuas atividades. Não te apresses a preenchê-los com ruído, com um jornal, uma conversa, uma presença…
Enquanto esperas no barbeiro, não te agarres logo a uma revista. Pára.
Estás no autocarro, apertado entre a multidão, embalado pelo barulho anónimo. Detém o teu devaneio.
O almoço não está pronto, não tornes a sair «só um minuto» para ver um colega. Detém-te.
Beneficias de um momento de silêncio, não ponhas um disco a tocar. Detém-te…
Se o nadador levanta a cabeça, é para «tomar fôlego».
Se o automobilista se imobiliza diante do posto de gasolina, é para «encher o depósito».
Se tu te deténs, é para tomar consciência de ti mesmo, reunir todas as tuas forças, pô-las em ordem e dirigi-las a fim de te comprometeres inteiramente na tua vida.
Aceitar parar, é aceitar olharmo-nos a nós próprios; e aceitar isto é já um compromisso, porque é fazer penetrar o espírito no interior da nossa casa.
Não te reconhecerás nem te compreenderás plenamente senão à luz de Deus.
Não agirás eficazmente, senão em união com a ação de Deus.
Quando te encontrares contigo mesmo, procura simultaneamente encontrar-te com o Senhor.
Ao longo dos teus dias, aproveita todas as ocasiões que a vida te oferece para te recuperares e comunicares com Deus:
a espera do autocarro,
o motor do teu carro que aquece antes de se pôr em andamento,
os três minutos do ovo quente,
o leite que levanta fervura,
o biberão quente de mais,
ao telefone, a linha que não está livre,
a luz encarnada na estrada…
Não «mates o tempo»: mesmo que seja muito limitado, é providencial: o Senhor preenche-o, Ele convida-te à reflexão e à decisão para te tornares mais homem.
Michel Quoist
25.02.2009
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