

Jesus cura cego (det.) | Eustache Le Sueur | Galeria Sanssouci, Potsdam, Alemanha«Naquele tempo, quando Jesus ia a sair de Jericó com os discípulos e uma grande multidão, estava um cego, chamado Bartimeu, filho de Timeu, a pedir esmola à beira do caminho.
Ao ouvir dizer que era Jesus de Nazaré que passava, começou a gritar: "Jesus, Filho de David, tem piedade de mim". Muitos repreendiam-no para que se calasse. Mas ele gritava cada vez mais: "Filho de David, tem piedade de mim".
Jesus parou e disse: "Chamai-o".
Chamaram então o cego e disseram-lhe: "Coragem! Levanta-te, que Ele está a chamar-te". O cego atirou fora a capa, deu um salto e foi ter com Jesus.
Jesus perguntou-lhe: "Que queres que Eu te faça?".
O cego respondeu-lhe: "Mestre, que eu veja".
Jesus disse-lhe: "Vai: a tua fé te salvou".
Logo ele recuperou a vista e seguiu Jesus pelo caminho.» (Marcos 10, 46-52, Evangelho do 30.º Domingo do Tempo Comum)
Um retrato traçado com três dramáticas pinceladas: cego, mendigo, só. Um mendigo cego: o último da fila, um náufrago da vida, um farrapo confinado à escuridão na margem de uma estrada de Jericó.
Depois, imprevistamente, tudo se desencadeia: passa Jesus e reacende-se o motor da vida, sopra um vento de futuro. Com o Senhor há sempre um "depois".
E Bartimeu começa a gritar: Jesus, tem piedade. Não há grito mais evangélico, não há prece mais humana e ardente: piedade dos meus olhos apagados, desta vida perdida.
Mas a multidão ergue um muro ao seu grito: cala-te! O grito de dor está fora de todo o lugar. É terrível pensar que diante de Deus o sofrimento esteja fora de lugar, que a dor esteja fora do programa.
E, todavia, para muitos de nós é assim, desde sempre, porque os pobres perturbam, mostram-nos o rosto negro e duro da vida, esse lugar onde nunca queremos estar e onde tememos cair.
Em vez disso, o cego sente que um outro mundo é possível, e que a sua chave tem-na Jesus. Com efeito, o rabi escuta e responde, escuta e relança.
E assim se liberta toda a energia da vida. Notemos como cada gesto daqui em diante parece excessivo, exagerado: Bartimeu não fala, grita; não despe a capa, atira-a; não se levanta do chão mas salta.
A fé é isto: um excesso, dos mais ilógicos e belos. Algo que multiplica a vida: «Vim para que tenhais o cêntuplo nesta vida». Acreditar faz bem. Cristo cura toda a existência.
Jesus cura o ser humano, antes de curar o cego. Porque alguém se aproxima dele. Alguém o toca, mesmo que só com a voz. E então emerge do seu naufrágio humano: o último começa a redescobrir-se um como os outros, começa a viver porque foi chamado com amor.
A cura de Bartimeu desencadeia-se quando «salta» e deixa todo o amparo para se precipitar, sem ver, para aquela voz que o chama: guiado, orientado apenas pela palavra de Cristo que então ressoa no ar.
Também nós, cristãos, nos orientamos na vida como o cego de Jericó, sem ver, apenas seguindo o eco da Palavra de Deus, que continua a semear olhos novos, olhos de luz sobre a Terra.
Ermes Ronchi
Jesus cura cego (det.) | Eustache Le Sueur | Galeria Sanssouci, Potsdam, Alemanha