«Melhor de quanto eu me conheça a mim próprio, conheces-me tu, ó Deus. Mais próximo de mim do que eu próprio, estás tu, ó Senhor. Tu conheces o que penso e projeto. Conheces os caminhos, os claros e os escuros. Tu me rodeias de todo o lado. A minha vida está na tua mão, onde quer que eu esteja.»
Neste dia dedicado pela liturgia à cruz de Cristo, procuremos tirar poucos minutos para abandonar o caminho rumoroso da cidade no qual caminhamos para atravessar o umbral de uma igreja.
Na penumbra recortada do lume das velas, experimentemos permanecer em silêncio diante da cruz, símbolo de morte e de vida, considerada já por S. Paulo «escândalo», ou seja, pedra de tropeço. Os pensamentos poderão ser aqueles da oração que citei, composta por um músico alemão, mestre de capela de Lubecca, Johannes Petzold (1912-1985).
Também o Corão declarava que «Deus está mais próximo de nós do que a nossa aorta», isto é, mais do que nós conseguimos ser íntimos de nós próprios. Esse Deus que procuramos fora de nós e que acusamos de ser mudo e distante, na realidade está em nós, «in interiore homine", como dizia Santo Agostinho.
Ele, por isso, vê e segue o nosso vaguear pelos caminhos claros do bem e pelos caminhos escuros do mal. Ainda que queiramos por vezes afastá-lo, evitá-lo, libertarmo-nos da sua presença incómoda, a nossa vida está sempre na sua mão.
«São-te conhecidos os meus caminhos, a minha palavra não está ainda na língua e tu, Senhor, já a conheces toda. Pelas costas e à minha frente me circundas e pousas sobre mim a tua mão» (Salmo 139, 3-5).
P. (Card.) Gianfranco Ravasi