

Papa Francisco | D.R.De Estrasburgo à Turquia. O papa Francisco passará do centro das instituições europeias ao país que confina com o autoproclamado Califado dos fundamentalistas islâmicos. É uma semana que vai ao coração dos problemas da Europa e do Médio Oriente aquela que o papa argentino inicia hoje, com uma viagem de poucas horas a Estrasburgo. Uma viagem que tem um único precedente: a visita de João Paulo II às instituições europeias, a 11 de outubro de 1988.
Em 25 anos tudo mudou: caiu o Muro de Berlim, Maastricht deixou de ser apenas uma cidade na margem do rio Mosa, a Europa está cada vez menos no centro do mundo, o papa, pela primeira vez após doze séculos, não vem do Velho Continente. E nas fronteiras da Europa o mundo está cada vez mais em tumulto, lacerado por conflitos que instrumentalizam a religião.
Na sua visita relâmpago ao Parlamento Europeu e ao Conselho da Europa, o papa Bergoglio falará às instituições que representam 28 países e mais de 500 milhões de cidadãos. Uma Europa que vive em alguma desorientação, como sublinhou o presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz.
A determinar este estado de alma está não só a crise de identidade, o enfraquecimento do espírito dos pais fundadores da União, o crescimento de um forte sentimento contra a Europa dos burocratas que mede o estado de saúde de um país em termos de “spread”, e não de emprego, bem-estar e serviços para os seus cidadãos. A provocar esta perda está também uma crise económica que atingiu vastas camadas da população.
Até hoje, Francisco não falou especificamente da Europa. Em setembro, disse que a «mãe Europa» parecia ter-se tornado numa «avó»: envelhecida, menos vital, menos central nos processos de globalização. Mas ainda que não tivesse quase nunca encarado o tema diretamente, é como se se tivesse sempre falado dele.
Como não recordar, com efeito, a viagem a Lampedusa, em julho de 2013, para assinalar os milhares de migrantes, incluindo mulheres e crianças, mortos no mar, na esperança de juntar as fronteiras da Europa? E como não recordar a visita do último mês de setembro à Albânia, «periferia» do continente, símbolo da pacífica e construtiva convivência entre cristianismo e islão? E também os muitos aprofundamentos sobre a solidariedade, o trabalho, a economia, que não deve idolatrar o dinheiro nem reduzir a autoridade do papel da política?
De Estrasburgo chegará um convite para redescobrir o espírito dos pais fundadores da Europa, a solidariedade, a atenção aos mais frágeis, a capacidade de reavivar o papel das democracias dos povos diante do excessivo poder dos mercados. Redescobrindo as suas raízes, a cuja construção o cristianismo deu um contributo fundamental, o Velho Continente poderá reencontrar um papel igualmente perante os conflitos que inflamam países pouco distantes das suas fronteiras. E é emblemático que apenas 48 horas depois de regressar de Estrasburgo, Francisco volte a partir de avião para a Turquia, confrontando-se com a realidade de um país entre Ocidente e Oriente, quase em contacto com o caos e o terror dos fundamentalistas do denominado Estado Islâmico.
O objetivo principal da segunda viagem da semana, que durará três dias, culminará em Istambul com o abraço ao amigo patriarca Bartolomeu, gesto de fraternidade com os ortodoxos. Mas será impossível não olhar para o que sucede aos cristãos para lá das fronteiras, à guerra interna no mundo muçulmano entre xiitas e sunitas, ao sofrimento de todas as minorias religiosas. Para pedir à Turquia, à Europa e às Nações Unidas para pôr fim à guerra e aos massacres, com respostas que não podem ser apenas militares, como a trágica experiência das últimas décadas na região infelizmente demonstrou.
Andrea Tornielli
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