O presidente do Pontifício Conselho da Cultura, cardeal Gianfranco Ravasi, comentou o debate sobre a descentralização da Igreja e a discussão sobre o ministério papal, no âmbito do Sínodo dos Bispos sobre a família, que termina este domingo no Vaticano.
«Todo o percurso, o itinerário do Novo Testamento, é marcado por uma espécie de fio condutor constante, ligado à mensagem de Cristo, que continua a permanecer. Mas, ao mesmo tempo, há uma declinação contínua desta mensagem em formas e em tipologias muito diferentes. Pensemos apenas no confronto entre a mensagem dos quatro Evangelhos que reflete sensibilidades também diferentes», apontou o prelado, participante no Sínodo, citado pela agência de notícias da Santa Sé.
No que diz respeito «ao problema do matrimónio e da indissolubilidade deste último», o evangelista Marcos «é radical, como o é na afirmação do próprio Cristo», sublinhou, antes de acrescentar: «Mateus repete a mesma radicalidade, mas introduz esta misteriosa exceção, o que quer dizer que sente o problema pastoral de maneira complexa».
«Nós temos um exemplo precisamente na experiência de "conciliar", certamente sinodal, de Jerusalém - Atos dos Apóstolos, capítulo 15 -, em que, de um lado, está seguramente registada a distinção entre posições diferentes, judeo-cristãs e das Igrejas que vêm dos Gentios. E por outro lado há a tentativa de chegar a uma mediação, alcançada no decreto do Concílio denominado de Jerusalém. E esta é uma mediação que, vê-se, não resolve completamente o problema, que será resolvido depois progressivamente, no interior da história do cristianismo», defendeu Ravasi.
Referindo-se à descentralização e ao serviço desempenhado pelo papa enquanto sucessor do apóstolo Pedro, o cardeal italiano explicou o «fundamento muito relevante» que os dois temas têm na Bíblia.
«No Novo Testamento temos, de um lado, o relevo petrino, certamente - imaginemos as imagens da rocha, das chaves, a imagem do ligar e desligar, que tem um significado profundo, incluindo doutrinal, e não só prático, pastoral. Mas, por outro lado, temos também, por exemplo, o ligar e desligar, que no capítulo 16 de Mateus é de Pedro, e no capítulo 18 é dado a todo o colégio apostólico», observou.
Gianfranco Ravasi mencionou também a «tipologia de leitura da mensagem cristã presente nos quatro Evangelhos diversificados entre eles», a par de «uma tipologia nas escolhas de Paulo, que reflete a multiplicidade das suas comunidades».
«Por um lado há o reconhecimento do eixo central, que é Cristo-Pedro, mas do outro há também uma riqueza e uma variedade extraordinárias no interior de cada comunidade com as presenças apostólicas. Precisamente a esta luz poder-se-ia quase percorrer todo o Novo Testamento, tendo em conta não esta dualidade, mas este contraponto harmonioso, que cria harmonia; não é, por isso, uma dialética, mas é sobretudo uma intersecção de posições, de situações, que são diferentes, teologicamente fundadas e pastoralmente necessárias», declarou.
Ravasi realçou igualmente que a família constitui uma oportunidade para abordar a relação entre crentes e não crentes.
Os denominados casamentos com disparidade de culto não são «apenas uma questão de tipo jurídico e também litúrgico pastoral, simplesmente, mas é também uma das grandes ocasiões para poder afirmar o diálogo inter-religioso antes de tudo, e também o diálogo com os não crentes», afirmou.
Trad. / edição: Rui Jorge Martins