Naquele tempo, o rei Herodes mandara prender João e algemá-lo no cárcere, por causa de Herodíades, a mulher do seu irmão Filipe, que ele tinha tomado por esposa. (…) João dizia a Herodes: «Não podes ter contigo a mulher do teu irmão». Herodíades odiava João Batista e queria dar-lhe a morte, mas não podia, porque Herodes respeitava João, sabendo que era justo e santo, e por isso o protegia. Quando o ouvia, ficava perturbado, mas escutava-o com prazer.
Entretanto, chegou um dia oportuno, quando Herodes, no seu aniversário natalício, ofereceu um banquete aos grandes da corte, aos oficiais e às principais personalidades da Galileia. Entrou então a filha de Herodíades, que dançou e agradou a Herodes e aos convidados. O rei disse à jovem: «Pede-me o que desejares e eu to darei». E fez este juramento: «Dar-te-ei o que me pedires, ainda que seja a metade do meu reino». Ela saiu e perguntou à mãe: «Que hei de pedir?». A mãe respondeu-lhe: «Pede a cabeça de João Batista». Ela voltou apressadamente à presença do rei e fez-lhe este pedido: «Quero que me dês sem demora, num prato, a cabeça de João Batista».
O rei ficou consternado, mas por causa do juramento e dos convidados, não quis recusar o pedido. E mandou imediatamente um guarda, com ordem de trazer a cabeça de João. (Marcos 6, 17-29, Evangelho de 29.8.2016)
Foi o dom de Deus que faz graça, o filho da velhice de Zacarias e Isabel
Foi o asceta da sobriedade nas terras solitárias do deserto.
Foi a voz, grito profético diante da vinda terrível e misericordiosa do Senhor.
Foi a mão que imergia nas águas do Jordão, na onda que restaura a vida e destrói o pecado.
Foi o mestre que ensinava aos seus discípulos as palavras e os gestos da oração.
Foi o dedo, indicador dirigido a mostrar o Cordeiro, o Homem das dores que, na humilhação, não abriu a boca, como cordeiro conduzido ao matadouro.
Foi o amigo do Esposo, capaz de se alegrar diante das bodas de Deus com a humanidade.
Foi um profeta, aliás, mais do que um profeta: não uma cana batida pelo vento, que se deixa vergar pela sedução de palavras fáceis ou cómodas, mas a franqueza de quem fala com tons tempestuosos e sem hesitações.
Foi a lâmpada que arde e resplandece, à luz da qual há alegria, porque a sua luz é testemunho da verdade.
Mas agora essa lâmpada extingue-se, porque a sua luz é sufocada pela violência de um poder cego e surdo, pela banalidade do capricho que espezinha a vida de um outro, na ridícula tentativa de calar, pelo sangue, uma verdade demasiado incómoda, e todavia demasiado verdadeira.
Na efusão do sangue, no martírio consumado na penumbra de um cárcere, João leva ao cumprimento a sua parábola de diminuição: desde o início da sua missão, com efeito, Batista sabia que Cristo devia crescer, devia encontrar espaço, visibilidade e escuta para manifestar a presença de Deus no mundo, enquanto ele era chamado a diminuir, a fazer-se pequeno, marginal.
João viveu verdadeiramente à frente do Senhor: no nascimento e na morte, da inesperada conceção ao ministério público até ao sangue do seu assassinato, foi prenúncio, mensageiro e precursor de Cristo, o pioneiro da novidade do Deus que vem. Como canta a Igreja do Oriente: «Nascendo de uma estéril, precedeu o nascimento desde uma Virgem; e com a decapitação foi precursor da crucificação daquele que criou o universo».
Agora aquele que gritava no deserto torna-se mudo, a voz que preparava a Palavra cala-se, mas a morte não tem o poder de sufocar o seu grito, porque na eloquência do sangue «o ouvido escuta, a voz confessa e o coração perdura naquele que desaparece…» (J.-Y. Hameline).
Ir. Emanuele