A Missão de Observação Permanente da Santa Sé na ONU e a organização jurídica Alliance Defending Freedom (ADF) vão expor uma retrospetiva sobre a vida, obra e legado de Madre Teresa de Calcutá na sede das Nações Unidas, em Nova Iorque.
A exposição sobre a fundadora das Missionárias da Caridade, que vai ser declarada santa no próximo domingo, no Vaticano, pelo papa Francisco, intitula-se “A vida de Madre Teresa e o seu legado para a ONU” e decorre de 6 a 9 de setembro.
A mostra culmina, no dia 9, com uma conferência em que participarão vários oradores internacionais, incluindo personalidades próximas de Madre Teresa.
São esperados na sessão muitos membros dos Missionários da Caridade, bem como 150 pessoas servidas pela congregação, seguindo-se um jantar com todos os convidados na igreja da Sagrada Família, próxima da sede da ONU.
«Madre Teresa foi uma verdadeira advogada pela santidade de vida e pela família», afirmou o diretor internacional executivo da ADF, acrescentando que «às vezes ela usava palavras para apresentar as suas ideias, mas as suas ações e exemplo falaram mais alto do que as suas palavras».
Para Doug Napier, Madre Teresa «agiu fielmente e incansavelmente», sendo essa «paixão que faz dela um grande modelo para qualquer pessoa que trabalhe com ou nas Nações Unidas».
«Assegurar que a pessoas como a Madre Teresa seja permitido viver a sua fé e impactar o mundo de uma maneira positiva devia ser uma prioridade para todas as nações», vincou o responsável.
«Esta exposição e conferência, que terão lugar no coração das Nações Unidas, deverá recordar-nos da sua sabedoria, do seu extraordinário trabalho e do seu amor radical por todo o ser humano, os pobres, os doentes, os que ficaram por nascer e os mortos», acrescentou.
Madre Teresa na ONU
Quando a 26 de outubro de 1985 Madre Teresa discursou, em Nova Iorque, na ONU, por ocasião dos 40 anos da instituição, o então secretário-geral, Perez de Cuellar, apresentou a religiosa católica afirmando ser ela «a mulher mais poderosa do mundo», e acrescentou: «Ela é as Nações Unidas, ela é paz neste mundo».
Depois de iniciar a intervenção com uma oração pela paz a partir de S. Francisco de Assis, Madre Teresa salientou que a criação de cada ser humano se deve a um único motivo: «Amar e ser amado. Não há outra razão. Não somos apenas um número no mundo. Somos filhos de Deus».
«Na última vez que estive na China, perguntaram-me: “O que é para si um comunista?”. Eu respondi: “Um filho de Deus, meu irmão, minha irmã”. E é exatamente isso que vós e eu somos chamados a ser: irmão, irmã», disse.
«Como é que a paz chega? Através de obras de amor. Onde é que começa? Em casa. Como é que começa? Rezando juntos. Porque a família que reza junta permanece junta. E se permanecerem juntos, amar-se-ão uns aos outros como Deus ama cada um de vós. Porque a oração dá um coração limpo, e um coração limpo pode ver Deus. E se virdes Deus em cada um, se temos a alegria de ver deus em cada um, amar-nos-emos uns aos outros. É por isso que nenhuma cor, nenhuma religião, nenhuma nacionalidade deve estar entre nós», prosseguiu.
Madre Teresa lembrou depois um casal que se dirigiu à casa das Missionárias da Caridade para lhe oferecer uma significativa quantia: «Perguntei-lhes: “Onde é que conseguiram tanto dinheiro?”. E eles responderam: “Casámo-nos há dois dias. Antes do casamento, decidimos que não compraríamos vestes de casamento, que não teríamos festa e que lhe daríamos esse dinheiro”. E eu sei o que significa no nosso país [Índia], numa família hindu, não ter vestes de casamento, não ter festa de casamento. Então perguntei-lhes outra vez: “Mas porquê? Porque é que fizeram isso?”. E eles responderam: «Amamo-nos tanto um ao outro que quisemos partilhar a alegria do amor com as pessoas que a Madre Teresa serve”. Como é que experimentamos a alegria de amar? Como é que o experimentamos? Dando até que doa. (…) Doeu a Jesus amar-nos, porque Ele morreu na cruz, para nos ensinar como amar. E esta é a maneira que nós temos também de amar: até que doa».
«Nós temos muitas pessoas belas; viram-nas nas fotografias, a nossa gente pobre, a nossa grande gente. Tenho estado com elas durante muitos anos e nunca ouvi uma queixa. Há alguns dias, recolhi um homem das ruas, comido vivo pelos vermes. Levei-o para a nossa casa. E o que disse este homem? “Vivi como um animal nas ruas, mas agora morrerei como um anjo. Amado e cuidado”. Levou-nos três horas a limpá-lo, a remover cada pedaço daqueles vermes que o estavam a comer vivo. E nem uma palavra dele. E enquanto estávamos a rezar com ele, a rezar poe ele, ele olhou para a irmã e disse: “Irmã, vou para casa ter com Deus”. E morreu. Havia um sorriso tão maravilhoso, tão bonito no seu rosto. Ele foi para casa ter com Deus. Nunca vi um sorriso como aquele. E todavia ali estava aquele homem, comido vivo, sem queixas, sem praguejar, apenas dizendo “vou para casa ter com Deus”. E que bela maneira de ir para casa ter com Deus. Com um coração limpo, um coração puro, repleto de alegria. Repleto com a ternura e amor que recebeu das irmãs que olharam por ele», contou Madre Teresa.
A intervenção continuou com a crítica à interrupção voluntária da gravidez: «Todos nós queremos paz, e contudo, e contudo temos medo das armas nucleares, temos medo desta nova doença [SIDA]. Mas não temos medo de matar uma criança inocente, essa pequena criança por nascer, que foi criada para esse mesmo propósito: amar a Deus e amar a vós e a mim. Isto é uma grande contradição, e hoje sinto que o aborto se tornou o maior destruidor da paz. Tenos medo das armas nucleares, porque nos toca, mas não temos medo, a mãe não tem medo de cometer esse terrível assassínio. Mesmo quando o próprio Deus nos fala disso, dizendo «mesmo se a mãe se esquecesse de ti, Eu nunca te esquecerei. Eu gravei-te na palma da minha mão, tu és precioso para mim, Eu amo-te”. Estas são as próprias palavras de Deus para vós, para mim, para essa pequena criança por nascer. E é por isso que se nós queremos realmente paz, se formos sinceros nos nossos corações a querer paz, hoje, tomemos a forte resolução de nos nossos países, nas nossas cidades, não permitirmos que uma só criança se sinta não desejada, se sinta não amada. E ajudemo-nos uns aos outros a fortalecer isso. Que nos nossos países essa terrível lei de matar os inocentes, de destruir vida, destruir a presença de Deus, seja eliminada do nosso país, da nossa nação, do nosso povo, das nossas famílias».
O discurso de Madre Teresa na sede das Nações Unidas regressou depois aos desequilíbrios na distribuição da riqueza: «Todos nós falamos da terrível fome. O que eu vi na Etiópia, o que eu vi noutros lugares, especialmente nestes dias em lugares terríveis como a Etiópia, mas as pessoas, às centenas e aos milhares estão diante da morte apenas por um pedaço de pão, por um copo de água. Houve pessoas que morreram nas minhas próprias mãos. E todavia esquecemos, porquê eles e não nós? Amemos novamente, partilhemos, rezemos para que este terrível sofrimento seja eliminado do nosso povo».
«E não tenhamos medo porque Deus está connosco se lho permitirmos, se lhe dermos a alegria de um coração puro. Rezemos, rezemos uns pelos outros. E rezai também por nós, para que possamos continuar o trabalho de Deus com grande amor», afirmou a religiosa, distinguida com o Prémio Nobel da Paz.
A terminar, Madre Teresa acentuou que a resposta às carências materiais é fundamental para a sobrevivência, mas por vezes, quando há meios para tal, é mais fácil solucionar a fome e a sede do que a falta de amor.
«Temos muitas pessoas pobres em todo o mundo, mas considero que a pobreza da solidão, a pobreza de não ser querido, amado, cuidado, apenas deixado, como descarte da sociedade, é uma pobreza muito difícil e muito, muito pesada, muito difícil de eliminar. Eu recolhi das ruas pessoas esfomeadas, e ao dar-lhes de comer, ao dar-lhes uma cama para dormir, eliminei o sofrimento, mas para os sós, os que não são queridos, não é tão fácil», assinalou Madre Teresa, que antes de concluir frisou a importância de «partilhar a alegria de amar», embora «não se possa dar o que não se tem», e é por isso que «é preciso rezar».
Agências