O sínodo dos bispos sobre a família deu «um passo novo» quanto aos batizados divorciados e recasados civilmente, considera o padre italiano Antonio Spadaro, diretor da revista "La Civiltà Cattolica" e autor e organizador de vários artigos e livros sobre o papa Francisco, entre os quais "A felicidade treina-se em cada dia - Novas homilias em Santa Marta", que a Paulinas Editora disponibiliza a partir de segunda-feira.
Em artigo publicado na mais recente edição da revista "Brotéria", o religioso jesuíta, que está a acompanhar o papa na viagem ao México, e que foi hoje entrevistado pela jornalista Aura Miguel, da Renascença, analisa o relatório final da assembleia que decorreu entre 4 e 25 de outubro, no Vaticano.
O documento sinodal acentua a «estrada do discernimento de cada caso sem pôr qualquer limite à integração como aparecia no passado», pelo que «a Igreja toma consciência que não se pode mais falar de uma categoria abstrata de pessoas e trancar as práticas da integração dentro de uma regra geral e válida em todos os casos. Não se afirma até onde pode chegar o processo de integração, mas também não se põem limites precisos e intransponíveis», sustenta Spadaro.
«A tensão sobre a situação sacramental dos divorciados recasados pelo civil nasce da própria "Familiaris consortio"», exortação apostólica do papa S. João Paulo II sobre a família cristã no mundo atual, que no número 84 refere: «Exorto vivamente os pastores e a inteira comunidade dos fiéis a ajudar os divorciados, promovendo com caridade solícita que eles não se considerem separados da Igreja, podendo, e melhor devendo, enquanto batizados, participar na sua vida».
Para o P. Antonio Spadaro, «esta "abertura" põe um problema sério» sobre o que é essa «comunhão eclesial»: «Como é possível ser uma verdadeira comunhão eclesial sem chegar, mais tarde ou mais cedo, à comunhão sacramental?», questiona.
«Postular que é possível uma comunhão eclesial plena sem uma comunhão sacramental não parece um caminho que nos possa deixar tranquilos. Note-se também que não se faz mais menção à "comunhão espiritual" como estrada alternativa ao sacramento, como tinha acontecido até ao Sínodo extraordinário», acrescenta.
O religioso salienta que no que diz respeito ao acesso aos sacramentos «o sínodo ordinário [realizado em 2015] pôs então as bases, abrindo uma porta que no sínodo anterior [outubro de 2014] tinha permanecido fechada. Mais, há um ano não tinha sido possível sequer certificar por maioria qualificada o que tinha sido debatido sobre o tema, o que tinha efetivamente acontecido. Portanto, pode falar-se de um passo novo».
«A coisa mais importante deste sínodo, de facto, foi a imagem de uma Igreja que se aproxima da realidade para olhá-la de frente, para ver as pessoas com as suas histórias concretas. A Igreja não pretende "julgar" antes de "ver" e tocar a vida dos seus filhos com uma mão capaz de acompanhar e curar», frisa Antonio Spadaro.
O artigo analisa o relatório final do sínodo a partir de múltiplos ângulos, como «sinodalidade e diversidade» e «a franqueza ("parresia") e o primado», elenca «oito nós críticos», recorda algumas das imagens utilizadas durante o encontro - o comboio, a porta, a tocha e o navegador - e enfatiza o papel do discernimento, acompanhamento, integração e reconciliação nas «situações complexas».
Rui Jorge Martins