Daniel Augusto da Cunha Faria nasceu em Baltar, Paredes, a 10 de Abril de 1971. Licenciou-se primeiro em Teologia (1996), com uma tese sobre Frei Agostinho da Cruz. Cursou depois Estudos Portugueses, na faculdade de Letras do Porto. Durante esse período (1994 - 1998) a opção monástica criava solidez. Faleceu a 9 de Junho de 1999, quando estava prestes a concluir o noviciado no Mosteiro Beneditino de Singeverga.
A sua obra poética é uma das mais fascinantes da segunda metade do séc.XX português.
«A relação da poesia de Daniel Faria com "a noite escura" da experiência mística não é muito diferente daquela que podemos identificar em muita poesia moderna… [A poesia de Daniel Faria] consegue recuperar uma voz que é ao mesmo tempo saudação, exclamação, celebração e louvor, uma voz que, ao mesmo tempo que traz à presença (com o mesmo tom encantatório da invocação), permanece estranha e impessoal para o próprio poeta e, por isso, não pode ser remetida para a asserção subjectiva.» (António Guerreiro, in "Expresso", 7 Abril 2001)
Caminho sem pés e sem sonhos
só com a respiração e a cadência
da muda passagem dos sopros
caminho como um remo que se afunda.
os redemoinhos sorvem as nuvens e os peixes
para que a elevação e a profundidade se conjuguem.
avanço sem jugo e ando longe
de caminhar sobre as águas do céu.
de Explicação das Árvores e de Outros Animais (1988)
Deve ser o último tempo
A chuva definitiva sobre o último animal nos pastos
O cadáver onde a aranha decide o círculo.
Deve ser o último degrau na escada de Jacob
E último sonho nele
Deve ser-lhe a última dor no quadril.
Deve ser o mendigo à minha porta
E a casa posta à venda.
Devo ser o chão que me recebe
E a árvore que me planta.
Em silêncio e devagar no escuro
Deve ser a véspera. Devo ser o sal
Voltado para trás.
Ou a pergunta na hora de partir.
de Explicação das Árvores e de Outros Animais (1988)
Sobre a água estarei solto de caminhos
Dos que vierem nenhum barco é para ti
Não deixes a candeia acesa
Dorme: basta-me essa luz
de Explicação das Árvores e de Outros Animais (1988)