Orar é útil?
Se Deus sabe tudo, se Deus é imutável nos seus desígnios, não será talvez inútil invoca-lo e fazer-lhe pedidos?
São objeções antigas, e todavia regressam hoje, agravadas pelo peso de uma relação entre oração e vida que não se soube resolver a nível espiritual. Sem confundir utilidade com utilitarismo e inutilidade com gratuidade, pode afirmar-se que a autêntica oração cristã tem utilidade, ou seja, produz frutos não só espirituais, mas também humanos.
A oração não é a fórmula mágica para preencher os nossos limites ou fugir deles, mas, ao contrário, funda-se nossa debilidade, e é possível só a partir do reconhecimento da nossa condição radical de pobreza enquanto criaturas. Aquele que começa a orar suplicando e pedindo antes de tudo com o Espírito Santo, fá-lo dando voz à sua não-autossuficiência, confessando que por si próprio não pode salvar-se, reconhecendo ser dependente de uma Presença que o precede e de quem se dispõe a receber tudo.
Este reconhecimento elementar da própria limitação é o primeiro grau a ultrapassar para ter acesso à sua íntima verdade, é um ato salvífico já humanamente, e por si só bastaria para testemunhar a utilidade da oração.
Além disso, hoje constatamos que as dificuldades da oração nascem, em boa parte, da imagem de homem atualmente dominante. O paradigma de homem vencedor é, com efeito, o do homem tecnológico, que se confia ao saber tecnológico para superar limites e obstáculos até há pouco tempo considerados inultrapassáveis.
Trata-se de um homem que se coloca como senhor do aparato tecnológico, com o qual medeia a sua relação com a realidade; um homem que é, portanto, animado pela necessária de encontrar em todas as suas atividades uma eficácia imediatamente quantificável.
O perigo desta mentalidade aplicada à oração é o desnaturamento da própria oração, enquadrara numa visão mecanicista em que aquilo que parece essencial é a possibilidade de programar e quantificar o seu resultado concreto, o seu “útil”.
A imagem do homem estabelecida pela cultura científico-tecnológica faz do homem o centro e o protagonista de uma relação que, ao contrário, tem o seu início só em Deus, e arrisca-se, no melhor dos casos, a reduzir a oração a uma simples atividade de reflexão, com vista ao ajustamento do próprio equilíbrio psicológico.
Por isso, é preciso reafirmar: o dom da graça que pode florescer na planta da oração perseverante, irrigada pela chuva da eficaz Palavra de Deus, não pode ser reduzido a um propósito perseguido com o esforço voluntarista, ou mediante o auxílio das ciências humanas. Compreender isto é um outro “ganho” não despiciendo para a nossa vida espiritual.
Haverá acolhimento?
O mal-estar em relação à oração de petição depende também do ceticismo no que respeita à possibilidade de acolhimento e cumprimento do pedido. Diz-se muitas vezes: «Rezei tanto, mas não mudou nada»… Isto, na realidade, não pode ser afirmado pelo cristão, que, do mistério da oração é sempre diretamente remetido para o mistério da fé, e, por isso, ao mistério de Deus: nunca se sai da oração igual a como se entrou.
Mas pode pedir-se alguma coisa na oração? Ao crente moderno sucede experimentar um certo mal-estar em relação às orações que formulam pedidos concretos; esta discrição indu-lo a evitar pedidos específicos a Deus, quase que o desculpando antecipadamente da falta de acolhimento, e, em todo o caso, deixando-lhe sempre aberta um caminho de saída com formulações genéricas e vagas.
Infelizmente, esta atitude conduz a negligenciar um aspeto fundamental da oração de petição, que se encontra constantemente também na estrutura das súplicas do Antigo Testamento: a apresentação da própria situação concreta perante Deus, para chegar, através da oração, a julgar e a decidir com Ele a sua vida.
O salmista, por exemplo, apresenta a Deus a sua condição de doença, de tentação, de pecado, de perigo de morte, de perseguição injusta, pedindo-lhe para estender sobre essas situações o seu poderoso braço que salva…
A oração dos Salmos, tão repleta de pedidos de saúde, cura e vida plena, educa o cristão a falar a Deus a partir do reconhecimento da própria condição de criatura e das necessidades a ela ligadas; mas condu-lo também, precisamente porque ele sabe que o que «está escrito» pelos Salmos se cumpriu em Jesus Cristo, a reconhecer que «em Jesus Cristo todos os seus pedidos são escutados» (Dietrich Bonhoeffer).
Assim, o grande acolhimento da oração consiste em fazer crescer o orante, na concretude da sua existência cristã, à estatura de Cristo; em conformá-lo, sobre a orientação do Espírito Santo, ao próprio Filho.
A oração é uma componente eficaz da história?
No atual contexto cultural pode entrever-se, da parte dos cristãos, o esquecimento de um aspeto essencial da oração: a sua capacidade de agir em sinergia com o querer de Deus até ser uma componente autêntica da história. E pelo contrário: não haverá, talvez, na atual procura pelo miraculoso e pelo sobrenatural uma tentativa, ainda que desajeitada, de exprimir um artigo fundamental da fé bíblica, hoje envolvido por cética reserva, ou seja, a fé no Deus que opera e se manifesta realmente na história?
Aqui é preciso, além disso, recordar o significado profundo da oração de petição pelos outros, a intercessão. Etimologicamente, “inter-cedere” significa «dar um passo atrás», «interpor-se» entre duas partes, indicando assim um compromisso ativo, um tomar a sério tanto a relação com Deus quanto com os outros homens.
A intercessão não nos conduz a recordar a Deus as necessidades dos homens, mas conduz-nos a abrir-nos à sua necessidade, fazendo memória deles diante de Deus, e recebendo novamente os outros de Deus, iluminados pela luz da sua vontade.
A intercessão ensina a entrar em qualquer situação humana em plena solidariedade com o Deus feito homem «por nós, homens», como recitamos no Credo, Símbolo da fé.
Através da intercessão, reconhecemos a nossa desmesurada limitação no fazer o bem pelo outro, e dispomo-nos a assumi-lo para além das nossas possibilidades: interceder é o sinal mais evidente e o fruto mais amadurecido da nossa responsabilidade para com os irmãos, porque é o ato com que assumimos responsabilidade por eles, inclusive fora do espaço público, quando isso não é pedido pelas convenções sociais, nem produz uma gratificação pessoal.
E o culminar da intercessão não consiste em palavras pronunciadas diante de Deus, mas num viver diante dele na posição do Crucificado, fiel a Deus e solidário com os homens até ao fim.
A intercessão por excelência, na qual participa também a do cristão, é aquele de Cristo que estende os braços na cruz, invocando o perdão para os seus crucificadores; deste modo, Ele abre-os a um abraço a toda a humanidade, fazendo da debilidade extrema da própria morte o ato de amor, através do qual se manifesta nele o poder misericordioso de Deus. Nesse ato, o crente reconhece e confessa a intercessão plenamente eficaz, sem limites, portadora de salvação para todos.