«Foi para mim uma grande surpresa. Já não estou em idade de receber prémios; mas tive uma grande satisfação e honra, não por mim, mas pela grande admiração que tenho pelo Padre Manuel Antunes, velho amigo, que cultivou a exigência crítica e deixou-nos uma obra notável a que regresso sempre com grande proveito.»
Foi com estas palavras que Eduardo Lourenço reagiu à atribuição do Prémio Árvore da Vida-Padre Manuel Antunes ao ensaísta português, hoje anunciada, testemunha Guilherme d’Oliveira Martins, administrador executivo da Fundação Calouste Gulbenkian.
«Falar de Eduardo Lourenço é invocar o grande intérprete de Portugal. E o certo é que a sua reflexão abre horizontes, recusando uma visão fechada ou retrospetiva da nossa identidade, abrindo-lhe novas dimensões, não mitológicas, mas capazes de integrar o imaginário crítico num diálogo diacrónico e sincrónico de diversos tempos e culturas, observa o ex-coordenador nacional do Ano Europeu do Património Cultural 2018.
A 16.ª edição da distinção atribuída pela Igreja católica, através do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, para destacar um percurso ou obra que, além de atingirem elevado nível de conhecimento ou criatividade estética, refletem o humanismo e a experiência cristã, distingue um «ensaísta enciclopédico», assinala, em texto que pode ser lido, na íntegra, nos artigos relacionados.
«O diálogo entre razão e fé é algo que sempre esteve presente na sua reflexão crítica, do mesmo modo que os temas ligados à espiritualidade, bem presentes numa análise sistemática da obra de grandes autores cristãos, avultando a interrogação e a compreensão das raízes do pensamento espiritual de Antero de Quental», observa.
Eduardo Lourenço «é uma personalidade multifacetada que se singulariza pela coerência entre um pensamento independente e uma permanente atenção à sociedade portuguesa, à sua cultura, numa perspetiva ampla, avultando a reflexão sobre uma Europa aberta ao mundo e não fechada numa qualquer fortaleza de egoísmo e de preconceito», aponta Guilherme d’Oliveira Martins, que integrou o júri do Prémio.
Para Guilherme d’Oliveira Martins, «a leitura da obra de conjunto de Eduardo Lourenço é fundamental», e «ao contrário do que tantas vezes se disse, o caráter fragmentário dos ensaios não prejudica a articulação das diferentes componentes da sua criação cultural».
Eduardo Lourenço «escreve não para recuperar o país, que não perdeu, mas para o “pensar” com a mesma paixão e sangue-frio intelectual com que pensava quando “teve a felicidade melancólica de viver nele como prisioneiro de alma”», destaca.