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Que espaço para os “buscadores”?

«Enquanto as seitas só aceitam aqueles que são plenamente observantes e comprometidos, a Igreja deve manter um espaço aberto para os buscadores espirituais, para aqueles que, apensar de não se identificarem plenamente com os seus ensinamentos e as suas práticas, sentem no entanto uma certa proximidade ao cristianismo.»

Palavras de Tomáš Halík num recente encontro europeu, em Praga, com vista ao sínodo sobre a sinodalidade. Não é nova na teologia contemporânea esta atenção aos “buscadores”, categoria que entrou em campo no contexto da era secular atual de Charles Taylor e retomada, em vários escritos, pelo teólogo checo.

Mas no contexto quotidiano de uma normal comunidade cristã, que espaço, que atenção, que olhar, que tempo é reservado aos buscadores que, hoje, são a maioria (ou pelo menos são muito mais do que aqueles que participam com convicção nas atividades de paróquias, associações, movimentos)?

A impressão é que não haja vestígios dessa atenção. Porque a quase totalidade das iniciativas de uma comunidade é hoje absolutamente autorreferencial, e o mesmo se diga dos seus códices comunicativos e gestuais. E no entanto, há buscadores que poderiam falar e escutar, buscadores com quem seria belo e enriquecedor partilhar um trecho do caminho, sem a pretensão de os “converter”, sem a prosápia de quem pensa que não tem nada a aprender, sem a presunção de não ter nada a colocar em comum porque “o outro não compreende”.



Talvez seja este o maior obstáculo: sair do esquema apologético, da tentação do proselitismo, do temor de dever sempre apodar a etiqueta “católico”, o medro de perder a identidade própria



Trata-se do vastíssimo âmbito da espiritualidade, ainda vive atualmente, mais ou menos ocultamente. E esta nova atenção aos buscadores tocaria também outras questões: o nó da cultura, o nó dos jovens, o nó da atenção interior e a abertura ao transcendente a não reduzir ao culto e à liturgia.

Mas, de verdade, que pensamento há sobre os buscadores no quotidiano paroquial?

Experimento avançar algumas propostas. Porque não pensar num momento ao entardecer recorrente, talvez no fim de semana, de simples abertura de um “espaço físico espiritual” que se torne também um “espaço interior espiritual”? Onde talvez se pudesse escutar alguma palavra universal de abertura ao mistério, seja esta uma página de literatura, de filosofia, de Evangelho? O buscador não é hostil às grandes narrativas bíblicas, que trazem consigo valores de alcance antropológico transversal. O importante é fazer ressoar a Palavra, dar espaço ao Espírito que em cada ser humano provoca uma ressonância, mesmo quando não se o reconhece.

E que dizer de algum momento artístico, com artes figurativas, a música, o teatro, sem, contudo, cair na apologia, hoje muitas vezes intelectualmente pobre e humanamente abstrata? Talvez seja este o maior obstáculo: sair do esquema apologético, da tentação do proselitismo, do temor de dever sempre apodar a etiqueta “católico”, o medro de perder a identidade própria.



Na mudança de paradigma que estamos a viver, não poderemos nem esperar apenas que alguém chega e peça para entrar na “Igreja institucional”, nem explorar momentos de crise como gazua para “dizer Deus” (já Bonhoeffer advertia com severidade para tais instrumentalizações da dor pessoal)



E ainda: porque não pensar em “oásis de silêncio”, onde só se está para permanecer, num ambiente apropriado, à escuta de ressonâncias interiores num clima de serenidade, de atenção ao íntimo? Penso também em espaços extra eclesiais, talvez ao ar livre, onde apenas se contemple a criação, em comunhão com o próprio eu na sua inteireza e em comunhão com aqueles que desejam estar juntos.

Todavia, será fundamental o “como” se comunicam essas iniciativas, para ser claro que o propósito é criar lugares de diálogo, de cultivo das relações, da atenção a si próprio. Em certo sentido era o que foi várias vezes propostos, a partir de um convite de Bento XVI, com o nome “Átrio dos Gentios”, mas de alcance mais reduzido, com uma medida mais quotidiana e local.

Será necessário unir ideias, energias, disponibilidade. Será decisivo tentar construir caminhos partilhados com os buscadores, dar-lhes inclusive responsabilidade, dar-lhes a palavra. Pôr-se à escuta. Pôr-se inclusive na sua escola, no que diz respeito, por exemplo, à liberdade, à lealdade, à franqueza.

Na mudança de paradigma que estamos a viver, não poderemos nem esperar apenas que alguém chega e peça para entrar na “Igreja institucional”, nem explorar momentos de crise como gazua para “dizer Deus” (já Bonhoeffer advertia com severidade para tais instrumentalizações da dor pessoal), nem procurar apenas alianças para simples fins posteriores (também aqui caindo nas instrumentalizações recíprocas, basta pensar numa certa maneira de entender a política). Devemos evitar situarmo-nos como uma “seita”, que divide o mundo entre os nossos (bons) e os outros (não bons), que devem simplesmente ser integrados, pois não é esta a perspetiva evangélica que narra o modo de Deus.

Trata-se de um olhar diferente, paritário, equilibrado: o outro interessa-nos por si, e não porque o vemos apenas como um objeto a conquistar para a nossa causa de fé.

O Espírito depois soprará, sugerirá, acolherá, conduzirá. Mas no deserto de hoje, precisamos de caminhar juntos (sínodo) com a humanidade que, de alguma forma, está à procura de um significado, de vida boa, de um Mistério que, também para o crente, está sempre além, é sempre surpreendente.


 

Sergio di Benedetto
In Vino Nuovo
Trad.: Rui Jorge Martins
Imagem: Annado/Bigstock.com
Publicado em 08.10.2023

 

 
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