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Exposição

No Caminho sob as Estrelas – Santiago e a Peregrinação a Compostela

Durante muitos anos esquecido, o Caminho de Santiago é hoje uma realidade que começa a despontar em terras do Baixo Alentejo. A ideia de que este itinerário de peregrinação para Compostela se iniciava apenas no Norte de Portugal é um mito. A Diocese de Beja, o Município de Santiago do Cacém e o Governo Regional da Galiza unem esforços para dar a conhecer o notável património espiritual, artístico e antropológico associado ao Caminho numa exposição que tem como palco um dos mais belos monumentos do Gótico alentejano, a igreja matriz de Santiago do Cacém, alvo de importantes obras de requalificação.

O culto de Santiago, na sua irradiação europeia e internacional, e o fenómeno da peregrinação que lhe está associado são o mote para uma exposição, iniciativa tripartida do Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja, do Município de Santiago do Cacém e da Xunta de Galicia que se prefigura como um dos acontecimentos culturais do Verão.

A exposição, que estará patente na Igreja Matriz de Santiago do Cacém até 30 de Outubro, apresenta cerca de 120 peças, do século XIV ao século XXI, algumas nunca antes saídas de território galego.

Centrando-se na figura de Santiago Maior (Apóstolo, Peregrino, Cavaleiro, Referência da Reconquista), a iniciativa é comissariada por José António Falcão, director do Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja. “No Caminho sob as Estrelas – Santiago e a Peregrinação a Compostela” reúne cerca de 150 obras de arte e documentos, dos séculos X a XXI, vindas de museus, igrejas e colecções particulares de Espanha e Portugal, mas também de França, Alemanha, Itália, Inglaterra, Flandres, México, Peru, Bolívia e Colômbia. Em paralelo, numa intervenção contemporânea, foi encomendada uma peça à artista Joana Vasconcelos, a incluir futuramente no Tesouro da Colegiada de Santiago.

Para além do valor dos elementos de arte sacra, releva da exposição uma forte dimensão histórica e antropológica, integrando peças de grande interesse desse ponto de vista (como é o caso de um Santiago Mata-Espanhóis, trabalho peruano do séc. XIX, entre outros).

Santiago do Cacém constitui, pelo seu significado histórico, uma referência fundamental para a identidade do Alentejo Litoral. É nesta cidade que se encontra o principal conjunto monumental da zona. Existe actualmente um esforço muito grande para recuperar as suas raízes e o seu património, sem esquecer a ligação ao Caminho de Santiago, ao culto do apóstolo e à Ordem Militar de Santiago da Espada. De facto, não é possível de ignorar a clareza de muitos indícios das raízes de Santiago do Cacém: sinais da vinda de colonos galegos nos séculos XII-XIII (topónimos como Galiza, Espanha, Melides e Santo André são muito explícito a este respeito), ligações ao culto de Santiago e a Compostela, testemunhos da presença da Ordem Militar de Santiago de Espada, que neste concelho teve uma das suas principais e mais ricas comendas.

O projecto foi realizado com o apoio institucional da Sociedade Anónima do Xacobeo, instituição estatal galega ligada ao turismo de Santiago de Compostela e traduz um investimento autárquico e diocesano de meio milhão de euros. Pretende-se que a exposição contribua para a afirmação de Santiago do Cacém como um destino privilegiado do turismo cultural, para a valorização do centro histórico da cidade e para a divulgação da cultura galega, numa lógica de estreitamento de relações entre dois territórios ibéricos que conduza a uma aproximação estratégica.

A iniciativa marca o princípio de um ciclo de parcerias com a Xunta de Galicia que prevê a realização próxima dos Encontros Galaico-Portugueses, com carácter regular, de ciclos de concertos e, ainda, a criação de um Centro de Estudos Jacobeus. Este último ficará sediado no edifício dos antigos Paços do Concelho em Santiago do Cacém e terá como missão promover o estudo e a divulgação do património ligado ao culto de Santiago Maior, ao fenómeno das peregrinações e à sua ligação à História Local. A nova instituição levará a cabo cursos de Verão com o apoio de universidades portuguesas e estrangeiras, exposições temáticas, conferências e outras actividades culturais relacionadas com estes objectivos. Disporá igualmente de um centro de documentação e de uma biblioteca especializada, organizados com o apoio da Xunta de Galicia.

 

Uma longa conjuntura histórica a recuperar

A região de Santiago do Cacém possui uma profunda vinculação ao culto de Santiago Apóstolo, ao Caminho de Santiago e à Ordem Militar de Santiago de Espada (aqui estabelecida desde o século XIII até à sua extinção, em 1834). Esta vinculação remonta a épocas muito antigas e prende-se à existência de uma via de peregrinação que unia o “Promontório Sacro” – o Cabo de São Vicente – ao Noroeste Peninsular e passava ao longo da planície litoral, bordejando o oceano Atlântico e vencendo os rios Mira e Sado.

O Caminho de Santiago constituiu, após a queda do Império Romano, uma estrutura fundamental para a circulação de pessoas, bens e ideias por todo o continente europeu. O Conselho da Europa reconheceu a importância matricial desta realidade histórica, declarando o Caminho como o primeiro Itinerário Cultural Europeu. É fundamental que também o Sul do nosso país reencontre os seus percursos neste âmbito e possa actuar em rede com outras regiões do velho continente para a afirmação de uma herança cultural comum.

Santiago do Cacém deve o seu nome e boa parte da sua prosperidade precisamente à ligação à devoção de Santiago Maior e à passagem dos peregrinos, que tinham na igreja matriz desta localidade (notável edifício da época gótica, encastrado no conjunto do castelo e da autoria de um arquitecto aragonês ou catalão) um santuário complementar no seu itinerário para Compostela e dispunham de outras infra-estruturas de acolhimento, como o Hospital do Espírito Santo. A Ordem Militar de Santiago, que recebeu extensos territórios na região após a Reconquista, tomou também a seu cargo a protecção e o apoio espiritual aos peregrinos, cuja circulação significava riqueza e importância política e religioso, mas exigia também assistência.

O segmento do Caminho de Santiago que passava pelo Alentejo Litoral caiu no esquecimento a partir das invasões francesas, nos inícios do século XIX, mas tem-se notado um gradual recrudescimento da passagem dos peregrinos, sobretudo a pé, a cavalo e de bicicleta, que vêm solicitar na igreja matriz de Santiago do Cacém e noutros templos da zona a aposição da “Compostelana” (carimbo que atesta a passagem, para poderem obter benefícios espirituais) no Passaporte do Peregrino.

 

Quem foi o apóstolo Santiago Maior

O apóstolo Santiago Maior, filho de Zebedeu e Salomé e irmão de São João Evangelista, nasceu na Galileia. Pescador, tornou-se um dos discípulos mais destacados de Jesus. Sofreu o martírio em Jerusalém no ano 44. A tradição aponta-o com o evangelizador da Península Ibérica e diz ter recebido em Saragoça a aparição de Nossa Senhora do Pilar. Desde os meados do século IX que lhe é prestado o culto em Santiago de Compostela, local para onde terão sido levadas as suas relíquias.

Santiago aparece geralmente representado como apóstolo, peregrino ou guerreiro. Este último tipo, o mais difundido no Sul de Portugal, recorda a lenda da sua aparição na batalha de Clavijo, em 834, triunfando sobre os Mouros. Padroeiro das Espanhas, deu também a uma Ordem militar que teve importante papel na Reconquista. Os seus principais atributos são a vieira, o bastão, o chapéu e a cabaça de peregrino, a que se juntam por vezes o livro (símbolo dos apóstolos) e a palma (símbolo dos mártires). Como cavaleiro, empunha uma espada. A sua festa litúrgica celebra-se no dia 25 de Julho.

 

Mais informações: dphadb@sapo.pt

Departamento do Património Histórico e Artístico da Diocese de Beja | RTP

Publicado em 24.08.2007

 

 

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Santiago Peregrino
Santiago Peregrino,
Escola Espanhola, Século XV, madeira policromada e dourada, Santiago de Compostela, Museo das Peregrinacións






































Porta-Paz
Porta-Paz
Trabalho compostelano, Século XVI, Azeviche, Pontevedra, Museo de Pontevedra










































Relicário Relicário do Santo Lenho
Trabalho português, Século XIV (inícios), chapa do reverso da cruz interior/Século XVI (finais) – Século XVII (inícios), relicário, Prata, rubis, quartzos, vidro, madeira, cera, lacre, cobre, papel, Santiago do Cacém, Tesouro da Colegiada de Santiago









































Pergaminho
Executória de Fidalguia de Cristóbal Sánchez
Vizinho da Vila de Paradiñas, Valhadolide, 8 de Julho de 1556, Escola espanhola,  Pergaminho iluminado, Santiago de Compostela, Museo das Peregrinacións
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