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Arte Popular

Motivos religiosos são uma constante nos trabalhos de artesãos portugueses

Em artigo publicado na edição de 15.12.2007 do Expresso, Alexandra Carita compara as obras produzidas pelos artesãos e aquelas que são elaboradas pelos chamados "artistas plásticos", concluindo que "a riqueza e diversidade da arte popular nacional continua viva", havendo "muitas Rosas Ramalho".

Com a devida vénia, reproduzimos alguns fragmentos do texto apresentado na revista Actual, incluindo uma breve referência a quatro artesãos que representam a vitalidade da arte popular e dos motivos cristãos a ela associados.

"Muitas vezes passa de geração em geração, outras, nasce espontâneamente, fruto de um talento natural sempre associado à paixão e encarado como um meio de libertação da labuta diária. São os artesãos deste país, esquecidos pelo tempo mas reconhecidos pela mesma elite cultural que consome diariamente as obras dos mais contemporâneos artistas plásticos nacionais e estrangeiros.

"O relacionamento, porém, do mesmo público com os artesãos e com os artistas plásticos é totalmente diferente e pode ser um ponto de partida para que se perceba a particularidade de uns e de outros perante o universo da criação. Quem contacta com um artista plástico para lhe comprar uma peça, seja numa galeria, seja no seu próprio ateliê, intervém, fala, comenta a peça. Em contrapartida, esse artista raramente tem muito para dizer sobre a sua obra, prefere o discurso crítico feito por terceiros para a acompanhar ou, na ausência deste, que o seu cliente a interprete à sua maneira, como quiser. Quem procura um artesão emudece perante a narração fluente do significado daquilo que fez, ouve a história que está por detrás de cada peça. O traço mais comum a todos os artesãos é a oralidade, sem dúvida. Uma oralidade que a arte dita erudita já teve, mas que foi destruindo. "Os artistas plásticos tendem a relacionar-se com as classes médias altas e altas, os artesãos têm relacionamentos muito mais abrangentes", explica Raquel Henriques da Silva, professora de História de Arte da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa. De facto, há um clima mítico à volta de cada artesão, muitas vezes incomodativo e perturbador para essa elite cultural que não está habituada a uma naturalidade tão forte e ao mesmo tempo tão insconsciente. É muito raro um artesão saber que existe um reconhecimento artístico absolutamente válido sobre a sua obra, e todo o artista plástico o conhece. (...)

"Curiosa também é a facilidade com o artesão consegue gerir as heranças e tradições, numa época em que é cada vez mais "traumático para o artista contemporâneio lidar com o passado artístico que o acompanha", diz Raquel Henriques da Silva. Se a um lhe é permitido continuar uma arte com o traço que nasce da sua personalidade, a outro é-lhe exigido que crie sempre de forma diferente."

 

Retratos de artesãos

Rosa Lopes, 36 anos, bordados, Vila Verde
É considerada a melhor bordadeira dos famosos Lenços dos Namorados, sendo procurada por alguns dos mais importantes estilistas nacionais. O lenço que mais a marcou foi o que bordou para ser oferecido a João Paulo II, em Maio de 1991.

Irmãos Sequeiros - Martinho, 49 anos; Eliseu, 39 anos; Diogo, 35 anos; escultura em pedra, Ponte de Lima
Entre outros motivos, das suas mãos saem santos e presépios.

Jorge Ortega, 86 anos, escultura em madeira, Sendas
Não sabe ler nem escrever, copia, com os olhos já cansados, as frases que dita e lhe escrevem em maiúsculas para adornar os seus trabalhos. Um machado e uma navalha são as suas únicas ferramentas. Cristos e Últimas Ceias são obras incontornáveis do seu percurso.

Irmãs Flores - Maria Inácia, 50 anos; Perpétua, 49 anos; olaria, Estremoz
As Senhoras da Conceição são das figuras que mais as dignificam, mas Santo Onofre, "só elas é que o fazem".

© Expresso

Publicado em 17.12.2007

 

 

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