Vemos, ouvimos e lemos
As «injustiças» de Deus

É maravilhoso Deus amar, não porque se mereça, mas porque quer

Os maus é que deviam morrer. Estava revoltada, dizia-me. Só por dizê-lo eu intuía que não era revolta. Era dificuldade em entender, em aceitar. Já viu, padre. Tinha apenas 32 anos. Tinha duas crianças. Morrer assim de repente. Sem explicação. Os médicos falaram em infecção. Mas nunca justificaram. Foram dois dias. Em dois dias foi. Não é justo, padre. Deus não foi justo. Ela era boa pessoa. Tinha razão neste último comentário. Reconheço que o que conheço dela fazia dela uma pessoa boa. Mas não tinha razão no penúltimo. A justiça de Deus não tem qualquer semelhança com a justiça que usamos os homens. Quem merece ou não o amor de Deus? A quem é justo Deus amar? A quem é justo Deus chamar? Porque havia de chamar apenas os maus? E o mundo ficava a abarrotar dos bons até se tornarem maus?

É maravilhoso Deus amar, não porque se mereça, mas porque quer. É assim o amor no matrimónio também. Ama-se como a pessoa é, independentemente dos seus defeitos ou fraquezas. Ele ama porque ama. Não ama porque tenha de amar. Por isso a sua justiça é diferente da dos homens, que dão consoante o que o outro merece. Que julgam consoante méritos ou deméritos. Será que Deus não poderia ou deveria amar indistintamente? O nosso problema não será a inveja da justiça de Deus, porque não conseguimos amar como Ele? Porque é que só os bons deveriam viver? E porque havemos de fazer distinções numa hora tão bonita como é a entrega total a Deus da nossa vida? Um dia, num funeral duma amiguinha jovem, disse que Deus gosta de ter o seu vaso cheio das flores mais belas. Quando encontra uma quere-la o mais depressa possível. Deus é justo porque nos sabe amar a cada um como cada um precisa. Deus é justo porque na Sua balança pesa a pessoa e mais nada.

in Confessionário dum Padre

27.06.2008

 

 

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