Um dia após a divulgação, a exortação apostólica “Querida Amazónia”, do papa Francisco, inspirou o «repúdio» de catorze bispos do Brasil ao projeto de lei federal que estabelece as condições para a pesquisa e lavra de recursos minerais, a par de geração elétrica, em terras indígenas.
A declaração “Solidariedade e compromisso”, com data de 13 de fevereiro, é subscrita por 14 bispos do departamento Regional Norte 1 do episcopado brasileiro, que abrange os estados do Amazonas e Roraima.
«Repudiamos, igualmente, entre outras iniciativas do Executivo Federal, a que atinge os povos indígenas isolados de recente contacto no Brasil, porque ameaçam o direito de existência livre desses povos, com seus usos, costumes, crenças e tradições, nos seus territórios devidamente reconhecidos e protegidos», refere o documento.
O «cuidado pastoral e compromisso com a vida e os direitos dos povos indígenas estão reafirmados pelo papa Francisco na exortação pós-sinodal “Querida Amazónia”», acentuam os prelados, que citam o número 14 do texto.
«Às operações económicas, nacionais ou internacionais, que danificam a Amazónia e não respeitam o direito dos povos nativos ao território e sua demarcação, à autodeterminação e ao consentimento prévio, há que rotulá-las com o nome devido: injustiça e crime», frisa o papa.
Francisco sublinha que «quando algumas empresas sedentas de lucro fácil se apropriam dos terrenos, chegando a privatizar a própria água potável, ou quando as autoridades deixam mão livre a madeireiros, a projetos minerários ou petrolíferos e outras atividades que devastam as florestas e contaminam o ambiente, transformam-se indevidamente as relações económicas e tornam-se um instrumento que mata».
«É usual lançar mão de recursos desprovidos de qualquer ética, como penalizar os protestos e mesmo tirar a vida aos indígenas que se oponham aos projetos, provocar intencionalmente incêndios florestais, ou subornar políticos e os próprios nativos», assinala a exortação, que além da versão disponível na internet, pode ser adquirida a partir de hoje em versão impressa.
A menos de um mês do sínodo para a região pan-amazónica que decorreu em outubro, no Vaticano, o departamento Regional Norte 1 reuniu-se em assembleia, tendo o P. Zenildo Lima, reitor do Seminário de S. José da arquidiocese de Manaus, declarado que «onde os povos indígenas estão presentes, nós temos mais dinamismo de preservação e de cuidado com a natureza, com a Casa Comum».
«A gente reconhece que há um embate pela frente. O desafio é saber como conter esse avanço tão violento, tão predatório que tem uma conceção diferente e olha para esse território como propriedade que deve ser explorada até o seu esgotamento», disse.
O presidente da Comissão Episcopal para a Amazónia, o arcebispo D. Cláudio Hummes, destacou, esta quinta-feira, que o papa optou, na exortação, por mencionar desde o início os pobres, que são «machucados, injustiçados, abandonados, são marginalizados, sem perspetiva de futuro», realçando que «os indígenas nunca estiveram tão ameaçados»: «Eles são, sobretudo aqueles que mais nos interpelam nessa questão».