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Diocese do Porto

Pastoral da Cultura apresenta propostas teatrais sobre "A Espera"

O Secretariado da Pastoral da Cultura da diocese do Porto preparou para novembro e para o Advento – as quatro semanas que antecedem o Natal – três peças de teatro subordinadas ao tema da “Espera”.

Os ensaios foram gravados em DVD, para que as paróquias e movimentos possam reproduzir as peças no seu contexto.

Transcrevemos seguidamente os textos incluídos no livrinho que acompanha o DVD. As fotografias referem-se aos ensaios das cenas, interpretadas por Ana Perfeito, Elisabete Pinto, Ricardo Simões e Tiago Fernandes.

 

Introdução
Joaquim Azevedo, diretor do Secretariado Diocesano da Pastoral da Cultura

No âmbito da “Missão 2010” e, mais especialmente, no mês de novembro, faz todo o sentido viver dramaticamente a Espera. O ser humano, do nascimento à morte, está em permanente Espera. Por vezes na maior da desesperança, por vezes no maior dos descuidos, outras vezes no galho da árvore, lá onde cantam os pássaros. Sempre com o coração aos saltos, sabido longe de casa.

O mês de novembro, na diocese do Porto, é dedicado à Esperança, ou seja, estamos comprometidos com o objetivo inequívoco de levar as razões da esperança cristã a todos os homens e mulheres de boa vontade. Porque acreditamos que isso é o melhor que lhes pode acontecer, não por mérito nosso, mas pelo sopro do Espírito.

FotoA Subversão da Espera

Entre várias iniciativas que se desenvolverão neste mês, o teatro constitui uma das mais significativas. Solicitei a colaboração de vários autores para elaborarem projetos originais sobre a Espera.

Aos três que agora aqui se apresentam – “A Subversão da Espera”, de D. Carlos Moreira Azevedo; “Esperança Godot”, de Castro Guedes, e “Para Onde vai a Luz Quando se Apaga?”, de José Tolentino Mendonça – presto um público e sentido gesto de gratidão. Valeu a pena esperar.

Agora vamos à ação. Grupos paroquiais, movimentos e obras, todos os que queiram encenar estas palavras de Esperança têm aqui mais uma prova de que Jesus de Nazaré veio inaugurar um Tempo Novo, de Justiça e Paz, de Bem e Verdade.

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Aproveitem. Usem o DVD com a proposta da encenação do nosso grande amigo e competente e prestigiado encenador Jorge Castro Guedes. Inventem outras, se assim entenderem. Mas façam teatro, levem mais além das pequenas fronteiras, em que nos sentimos quentinhos com os iguais a nós, esta Boa Nova de Esperança.

Além destes textos sugiro ainda o Auto de Natal, de autoria de D. Manuel Clemente (“Natal em Teatro”, Edições Paulinas). (...)

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«Há espera de esperar, não só estar à espera!»
Castro Guedes, encenador

«Com um certo atrevimento (que é coisa que se permite aos artistas) gostaria de esperar que este sinal, em boa hora chegado pela mão do Secretariado Diocesano da Pastoral da Cultura do Porto, com a colaboração da Universidade Católica (Pólo do Porto), seja a anunciação de um advento para que a arte reocupe um lugar profundamente religioso, de onde nunca saiu, mesmo em tempos de interpretações mais extremadas ou injustas entre o mundo laico e o mundo clerical.

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Aliás em plena Idade Média o teatro renasce no seio da Igreja com a Confraria dos Sans-Soucis, realizando os atos da Paixão, em quadros ambulantes na rua, enquanto o antifonário litúrgico vai-se transformando em litúrgia dramática e esta em drama litúrgico até se desdobrar em mistérios, milagres e moralidades, tudo formas teatrais religiosas, que ainda hoje se podem perscrutar e encontrar indícios no teatro contemporâneo de natureza não religiosa especificamente.

FotoEsperança Godot

De resto, como se diz no texto de Dom Carlos Azevedo, «o essencial não é saber se Deus existe»... «o essencial é saber quem é e como é. E é nesse Deus que Cristo trouxe em Filho do Homem que me revejo na conceção de todo este espetáculo, porque, creio – neste projeto de que não sou autor, mas tão só um técnico (teatral) ao serviço dele – o mais importante na mensagem do Advento que aqui se traz é uma espera com esperança e não o esperar sem crer, num Mundo em que se anuncia um apocalipse civilizacional justamente pela descrença, mas que é possível recuperar em esperança de Salvação.

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Metida esta foice em seara alheia (mas é impossível falar da forma sem ter presente o conteúdo), o que me compete, como encenador, chamar mais a atenção é para esse outro lado do teatro tantas vezes esquecido: o teatro não é literatura. O texto dramático tem, deve ter, um valor literário intrínseco, mas a palavra escrita é apenas o ponto de partida para ela ser dita. E dizê-la não é só reproduzi-la melhor ou pior interpretada em termos de perceção auditiva. É colori-la com o sentimento através daquilo a que chamamos “inflexões”, sentido último do texto em situação e do subtexto, que é o que se quer dizer para lá do dito. Todavia este colorido não se obtém só no modo de dizer, mas também no gesto, no movimento dos atores (a que no léxico teatral se chama “marcações”), no significado que se pode ler nos próprios cenários, indumentárias, luzes, som... Mas tendo sempre por centro o ator e a sua inimitável capacidade de ser o outro, a personagem que vive.

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Ele há muitas estéticas e estilos para se fazer teatro e a riqueza do próprio teatro reside nessa sua mesma pluralidade. Ai de nós que – como em sistemas politicamente totalitários aconteceu – elegêssemos um cânone único para fazer teatro. Mas é natural que cada criador (aqui leia-se encenador, que “recria” o texto) tenha cânones que escolheu, às vezes nem sequer somente pessoais, mas também resultantes dos termos da eficácia da mensagem em direção aos públicos a que se destina a representação e tendo em conta os recursos de quem o vai fazer. Neste caso replicá-lo, seguindo uma matriz cénica que pode sofrer adaptações e reinterpretações consoante cada local em que é feita, numa margem de liberdade tolerante: isto é, que não se apague de todo o arquétipo do proposto.

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Mas não são só os públicos que vão ver que contam. Também os atores e os meios materiais (cenário, guarda-roupa, luzes...) podem fazer variar os cânones do criador ou, melhor, a sua adequação ao propósito final. Ora, tendo em conta quer experiências passadas onde trabalhei diretamente com amadores (alguns pela primeira vez pisando um palco), ora a essencialidade dos próprios textos, abalancei-me a propor uma encenação ritualizada em que cada palavra ressoa e cada gesto é marcado em tempo definido, numa movimentação simplificada, as com um quê de simbólico. O conotativo cede muitas vezes ao denotativo.

FotoPara Onde Vai a Luz Quando se Apaga?

Julgo que, assim, não só o cânone serve a espiritualidade e mensagem da obra (ao caso desmultiplicada por peças diferentes que convergem para o mesmo fim, podendo serem todas feitas ou só mesmo uma delas sem grande prejuízo para o objetivo do projeto e o respeito pelo bem artístico, como me pareceu ser o mais facilmente entendível pelos públicos e facilmente fazível pelos atores que imagino (e imagino com base em coisas feitas por mim diretamente) serem os destinatários últimos do que somos apenas os intermediários de um modelo ou proposta. A concentração, para os que estão em palco e para os que olham para o palco, torna-se maior, numa tensão suave (passe o paradoxo), que permita à arte cumprir o seu primordial papel: o da sublimação do Ser em sendo outro e nesse outro se revendo em si mesmo.

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Daí, em termos práticos, o seminário realizado com a presença viva dos atores e algumas explicações num espaço de perguntas e respostas dos “porquês” do modo de fazer: dizer, mexer, olhar, dar tempo... E também de um ensaio previamente registado em vídeo que permite olhar (sobretudo para o que vai fazer as vezes de encenador) um plano geral em que se “lê” toda a cena; e também em planos individuais (sobretudo destinados a cada intérprete) que, assim, pode seguir em todas as situações as ações e reações da personagem que vai interpretar. Porque, muito importante, é também aquilo a que em teatro chamamos a “contracena”: isto é, o sentir do que se ouve, representando também quando se está em silêncio: a personagem de cada um não existe só quando fala ela... Como na vida o saber ouvir importa tanto ou mais do que o fazer-se ouvir apenas, o sentir o sentimento do outro é tão ou mais decisivo do que o nosso próprio expressado para melhor sermos: tal e qual como na criação da personagem, criatura cénica.

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E como o teatro é, por excelência, uma arte de ocnjunto, cada um e cada coisa que nestes espaço se move implica com a(s) outra(s) num conjunto de ações- reações a que importa estar atento (tarefa do encenador) no resultado de uma leitura globalizante e não só individual de cada personagem ou de cada gesto, movimento ou fala de per si. Por isso também – porque do corpo e da alma que nesse corpo se expressa em representação, a matéria-prima da obra é gente e não óleo, letras ou sequer imagens virtuais – o teatro é a mais humana de todas as artes, que só acontece, efemeramente, no momento em que se apresenta diante de terceiros, a público. E é (permitam-me outra vez a ousadia de um artista, ao finalizar este texto) uma sagração da vida. Vida que nos diz que “há espera de esperar”, esperar com esperança.

 

In A Espera, Secretariado Diocesano da Pastoral da Cultura (Porto)
19.11.10

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