«Continuemos a caminhar na esperança!»
«É importante saber: eu posso sempre continuar a esperar, ainda que pela minha vida ou pelo momento histórico que estou a viver aparentemente não tenha mais qualquer motivo para esperar. Só a grande esperança-certeza de que, não obstante todos os fracassos, a minha vida pessoal e a história no seu conjunto estão conservadas no poder indestrutível do Amor e, graças a isso e por isso, possuem sentido e importância, só uma tal esperança pode, naquele caso, dar ainda a coragem de agir e de continuar»: palavras de Bento XVI na encíclica "Spe salvi".
E ao deixar Portugal, a 14 de maio de 2010, o papa deixou o convite: «Continuemos a caminhar na esperança». Um apelo que recordamos neste Advento, talvez o tempo litúrgico onde mais se acentua a espiritualidade da espera
A psicóloga Helena Marujo e o teólogo católico João Manuel Duque consideram que cultivar a esperança é uma atitude essencial para resistir às consequências da crise económica, sustentar a confiança e acolher o Natal.
«O que se faz sem horizontes para fazer caminhos? A vida sem esperança é um deserto árido ou um deambular perdido e sonâmbulo», sublinha a especialista em psicologia positiva na entrevista publicada na mais recente edição do semanário Agência Ecclesia.
O diretor adjunto do Núcleo de Braga da Faculdade de Teologia sublinha, por seu lado, que só a esperança pode «salvar» um tempo em que se sentem «os efeitos da injustiça» a nível pessoal e social.
«O mais profundo cerne da esperança será (…) a esperança de que a injustiça não tenha a última palavra sobre as relações humanas», acrescenta.
Para Helena Marujo o Natal pode fortalecer a esperança se for assumido como «um sinal de luz» ou um «acordar» que reenvia para o « brilho de quem repensa e luta por renascer, por manter viva a confiança numa humanidade com um futuro que inspire».
“Este Natal, mas do que nunca na nossa história recente, tem de ir para além da fogosidade e superficialidade que a todos já cansa”, afirma.
O nascimento de Jesus, que veio ao mundo para o libertar de tudo o que faz «sofrer profundamente», cumpre a «esperança milenar» que a Bíblia testemunha, aponta João Manuel Duque, acrescentando que o Natal celebra a «antecipação» de «um reino» em que todas as opressões serão superadas.
A esperança, explica Helena Marujo, resulta da integração simultânea de três atitudes: ter objetivos, acreditar que se consegue atingi-los e possuir a «capacidade de desenhar caminhos para chegar a essas metas».
João Manuel Duque reforça a importância da confiança ao salientar que a esperança «é a capacidade de acreditar» na possibilidade de ultrapassar o que, no presente, é motivo de sofrimento.
Diante da crise é possível «deixar de acreditar na capacidade de criar novas formas de vida» ou optar por «reformular os horizontes» que são impostos do exterior, «decidir mais e pensar mais profundamente» e construir «caminhos» que visem «acabar com a condição de escravos em todas as áreas da vida, desde a politica ao social, da educação ao emprego», observa Helena Marujo.
Esta atitude, realça, deve ser baseada na «virtuosidade pessoal e relacional», bem como «na reconstrução de um sentido de comunidade e de bem comum».
A crise também apresenta aspetos positivos e pode ser origem de renovação ao «colocar em causa as seguranças presentes» e tornar «mais evidentes as estruturas e as relações injustas», lembra João Manuel Duque.
«É claro que a crise só terá esse efeito benéfico se, de facto, estiver ligada à esperança. No caso do desespero, a crise pode ser destrutora para o ser humano. É por isso que, nessas situações, se revela de modo mais claro que é pela esperança que somos salvos», refere o teólogo, aludindo a uma passagem da carta de São Paulo aos Romanos em que Bento XVI se baseou para intitular a encíclica "Spe salvi".
Rui Jorge Martins
In Agência Ecclesia / SNPC
11.12.12