«Um excelente roteiro da obra da segunda grande figura literária portuguesa do século XX»: É nestes termos que o crítico Diogo Ramada Curto apresenta na edição do jornal “Público” de hoje o novo livro de José Carlos Seabra Pereira sobre Aquilino Ribeiro (1885-1963).
A «primeira virtude» da obra “Aquilino – A escrita vital”, lançada em outubro pela “Verbo”, reside no «modo claro» como o diretor do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura «estrutura e desenvolve o seu argumento».
O investigador centra-se na «análise dos discursos, ou seja, da escrita e dos temas tratados» por Aquilino, bem como na sua «interpretação à luz das posições que assumiu no interior de um campo literário atravessado por conflitos».
Ainda que não seja «de leitura fácil, nem recomendável a principiantes», o volume procura explicar «como é que a escrita de Aquilino capta perspectivas antagónicas: “de genuinidade lusitana e cosmopolitismo parisino, de ceticismo anatoliano e gana elementar de viver, de enraizamento telúrico e erudição clássica, de vernaculidade intencionada e polifonia estílistica”».
O «suposto anticlericalismo» do escritor é uma das questões que o docente da Universidade de Coimbra analisa, defendendo que «o encontro “da obra aquiliniana com o mundo religioso e eclesial não reside em anticlericalismo».
«“Quando ganha cambiantes anticlericais trata-se apenas da incidência, nesse domínio (como em todos os outros), do espírito irreverente e crítico, irónico ou satírico, de matriz libertino-iluminista, que anima todo o discurso inconformista de Aquilino”», assinala o crítico do “Público” citando Seabra Pereira.
A «última virtude do livro» consiste na capacidade de «explicar que a modernidade de Aquilino vive do cruzamento entre uma cultura cosmopolita europeia, de raiz francesa, e outra de sentido local e rural, cujas descrições e alusões são irreverentes e sardónicas».
«À margem do modernismo do “Orpheu”, Aquilino — com a sua experiência de cidadão do mundo e a sua cultura de estrangeirado — tanto põe em causa imagens idealizadas relativas à harmonia da vida nos campos como se interroga acerca da urgência da modernização das aldeias», destaca Diogo Ramada Curto.
O artigo conclui com a convicção de que «é poderosa a análise da obra de Aquilino empreendida por Seabra Pereira», o que se traduz num convite para a ler.
«Autor invulgar e excelente realizador de uma poética vitalista nos géneros e subgéneros de ficção narrativa (romances, novelas e contos de índole vária), bem como em textos de hibridismo genológico, Aquilino Ribeiro desde cedo foi alvo de uma fortuna crítica que importa hoje rever, a par de uma releitura da sua obra em nova perspetiva», refere a nota de apresentação do volume.
Edição: Rui Jorge Martins