Poesia
Fernando Echevarría regressa com "In Terra Viventium"
O poeta Fernando Echevarría, que em 2005 foi o primeiro distinguido com o Prémio Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes, lançou a coletânea “In terra viventium”, que Pedro Mexia analisa na revista “Atual” (“Expresso”) deste sábado.
Transcrevemos o texto que atribui a classificação máxima ao poeta nascido em 1929.
«O título quase sacramental “In Terra Viventium” é bastante apropriado a poemas que são sobre a terra dos «viventes» e não apenas dos «vivos». A vida não é um simples estado, mas um processo, um «estarmos sendo»: «Vivos. Chegavam pelo fim da tarde./ Era visível viverem/ pois a luz ressentia-se ao chegarem./ Dir-se-ia quase um seu lugar vivente,/misto de cômputo e de saudade/ por onde se movessem,/ se ainda corpos, com o ritmo grave/ de uma gravitação que os excede./ E os leva, indo pelo fim da tarde/ e pela solidão de si que servem» (pág. 134).
E, no entanto, esta poesia não nada referencial, não se detém em «acontecimentos». Fernando Echevarría escreve poemas abstratos, vagarosos, num ritmo cuidado, denso, austero, com vocábulos arcaizantes, substantivação de verbos e uma insistência em palavras acabadas em «o» que produzem um efeito de quase-rima.
Tendo-se estreado em 1956, Echevarría viveu a fase rilkeana da poesia portuguesa, e há em “In Terra Viventium” uma presença constante do termo «o aberto», um favorito de Rilke. Aqui, esse «aberto» é de natureza metafísica, cristã ou deísta. Daí a atitude de interioridade, contenplação, escuta, a que Echevarría chama «estudo». Essa atenção paciente, e em geral noturna, filtra os ecos do mundo, «ecos do que foram factos», imagens que passam, memórias dos mortos, aves voando, árvores que se agitam: «(...) por tras da chuva, a massa dos pinheiros./ E quando a massa se desnuda até/ ficarmos só, compenetrados, vendo/ chegar a nome aquilo que o não tem» (pág. 38).
A poesia do enigma torna-se uma poesia da evidência, porque o sujeito encontra uma outra dimensão, um «outro lado», um «além» que é aqui e vice-versa, uma «luz transitiva». E os poemas desta extensa coletânea celebram essa dádiva. Escritos na «margem última» que é a velhice, fazem dos versos uma forma de pensamento, de inteligência, um «império do sentido» inatual, jubiloso, que deteta as causas em cada efeito, o efeito de cada causa. Versos capazes de uma inabalável confiança: «a transparência impugna o nevoeiro».»
Foto: Jorge Garcia / Olhares
Fernando Echevarría estudou Filosofia e Teologia. Viveu muitos anos em Paris, onde se ocupou na área do ensino. A sua poesia começa a afirmar-se nos finais dos anos 50, marcada inicialmente por uma grande concentração metafórica que acompanhava uma espécie de respiração polifónica dos motivos. Para abrigar-se progressivamente numa admirável depuração verbal, tirando partido das elipses, das sugestivas contrações discursivas, das suspensões diante do sentido. A palavra de Echevarría é um idioma decantado quase até ao limite da abstração. Mas pelas cesuras dessa língua o fulgor brilha, recôndito e intensamente presente. (in Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura)
Pedro Mexia
In Atual (Expresso), 10.3.2012
© SNPC |
11.03.12
Autor
Fernando Echevarría
Editora
Afrontamento
Ano
2011
Páginas
212
Preço
12,60 €
ISBN
978-972-3611-946
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