Cinema
"Histórias que contamos": Desvendar o passado para redescobrir o presente
Sarah Polley, atriz com 28 anos de carreira e realizadora com quatro longas metragens, passou pelos ecrãs portugueses em fevereiro deste ano com o seu peculiar "Notas de Amor". Em "Histórias que contamos", agora em estreia, a cineasta vai bem mais longe no compromisso de fazer do seu cinema lugar de significado, vinculando-nos corajosamente à sua autobiografia, num estranho e incómodo gesto de partilha.
Todas as famílias têm a sua história, e é pelo mais genuíno desejo de preservação de si mesmas, do seu património imaterial, maior prova de amor próprio e do significado que uns têm para os outros, que os mais velhos partilham partes de si com os mais novos, confiando-lhes a missão de desafiar as leis do tempo, sedimentando uma identidade coletiva que os manterá solidamente unidos para sempre, e para sempre inscritos no relato da humanidade.
Os seus episódios, particularidades, diferenças e semelhanças entre os demais, no seu tempo e no seu modo, constituem uma matriz identitária única, tecida de cumplicidades, intimidades, propósitos e acasos, encontros e contradições, verdade e ficção, segredos e revelações.
Assim é com "Histórias que contamos". Um documentário e um legado que inscreve na história do cinema e da humanidade a demanda duma mulher do nosso tempo em busca da sua mãe, feita de lugares, testemunhos e memórias plurais, passados mais ou menos remotos evocados de modo próprio que, entretecido em registos diversos, a conduz, e a nós, por caminhos imprevistos: as revelações sucedem-se e comportam verdades dolorosas sobre a identidade de Sarah.
Para lá do enredo concreto que se desenvolve, há no filme uma riqueza inequívoca no tocar de uma questão fundamental: como nos tornamos, individual e simultaneamente, escultores e esculpidos enquanto narradores e narrados de e por uma mesma história coletiva...
Margarida Ataíde
Grupo de Cinema do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura
In Agência Ecclesia | Com SNPC
22.11.13