O presidente do Parlamento Europeu, Martin Schulz, elogiou a «altíssima autoridade moral», os gestos e as intuições do papa, na véspera de Francisco receber o prémio Carlos Magno.
«O papa Francisco, que como filho de imigrantes italianos na Argentina, e depois por muitos anos arcebispo de Buenos Aires, conheceu um mundo diferente daquele privilegiado no qual nós, os europeus, vivemos, abre-nos os olhos e faz-nos refletir sobre o quanto devemos estar gratos e reconhecidos por este mundo maravilhoso que é a Europa, na qual nos é consentido viver. É isto que faz dele um grande europeu», declarou à Rádio Vaticano.
O papa recebe a distinção esta sexta-feira, no Vaticano, em cerimónia que conta com a presença da chanceler alemã, Angela Merkel, e dos presidentes do Parlamento Europeu, Conselho Europeu, Donald Tusk, e Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker.
«O número de críticos da Europa é muito grande. Mas o papa distingue-se da maior parte pelo facto de que não só avança com críticas, mas recorda-nos que poderíamos fazer melhor se nos recordássemos das nossas tradicionais formas de cooperação e, sobretudo, os nossos valores», acentuou, acrescentando que a «altíssima autoridade moral» de Francisco «induz muitíssimas pessoas à reflexão».
Questionado sobre o contributo que Francisco pode dar à Europa no contexto do acolhimento e recusa de refugiados, Schulz fez um paralelismo entre «a frase de Jean Monnet, um dos pais fundadores da União Europeia, segundo a qual a Europa deveria ser construída sobre o princípio da solidariedade da ação» e a recente visita do papa à ilha grega de Lesbos.
«Se na Europa há Chefes de Estado que afirmam estar à cabeça de um país católico e que, por isso, não podem acolher muçulmanos, enquanto o papa vai a Lesbos e leva para o Vaticano algumas famílias de religião muçulmana para lhes garantir um refúgio, então esta é uma lição de carácter extraordinário para todos aqueles que pensam como este Chefe de Estado que citei. E esta é a “solidariedade da ação”», acentuou.
Francisco, o segundo pontífice a receber o prémio, foi distinguido devido à sua «autoridade moral», que recorda, «como advertência e ao mesmo tempo como mediador, que a Europa tem a tarefa e a obrigação, sobre a base dos ideais dos seus pais fundadores, de tornar realidade a paz, a liberdade, o Estado de direito e a democracia, a solidariedade e a conservação da criação», refere o texto da Associação Carlos Magno, responsável pela escolha do premiado, citado pela Deutsche Welle.
No seu discurso no Parlamento Europeu, em novembro de 2014, o papa referiu-se ao estado de fraqueza em que se encontra a União Europeia. Por palavras criticou a falta de compaixão da política europeia perante a chegada de refugiados e, através de gestos visitou refugiados em Lampedusa e em Lesbos, de onde levou doze deles para o Vaticano, realça a associação.
«O papa Francisco é alguém que preconiza hoje em dia a unidade europeia, que pronunciou um discurso notável ante o Parlamento Europeu e que disse aos europeus para conservarem os seus valores e não voltarem a cair no nacionalismo. Que justamente na crise dos refugiados proferiu palavras sumamente importantes para a Europa. Esse é o motivo pelo qual eu creio que é merecedor do Prémio Carlos Magno», declarou Armin Laschet, membro do diretório que elege o vencedor do galardão.
O antigo eurodeputado está convencido de que o papa Francisco «vai mais além de todas as fronteiras confessionais, e muitos veem nele a autoridade moral que procuram neste tempo», e expressou a confiança de que o prémio vai contribuir para que «a sua mensagem volte a ocupar o centro das atenções».
Desde 1950 que uma associação da cidade alemã de Aachen atribui o prémio Carlos Magno a personalidades que se distinguem no contexto europeu (embora não tenham de ter nascido no continente) pela sua ação em favor da paz, como foi o caso de S. João Paulo II, o primeiro papa a receber o galardão, em 2004.
A ideia de criar o prémio foi de Kurt Pfeiffer, um dos primeiros presidentes da câmara municipal após a II Guerra Mundial, que com a iniciativa pretendeu honrar a unificação do continente.
O imperador Carlos Magno emergiu como figura de unificação da Europa ocidental, não obstante tê-lo conseguido à custa de armas e sangue. Aachen foi a sede do império que é considerado o fundamento da identidade do continente.
Rui Jorge Martins