Átrio dos Gentios
O que há de comum entre uma cidade laica e uma cidade sagrada?
O que pode haver em comum entre uma cidade secularizada, provocatória, marcada por uma vitalidade frenética e, até, desordenada, como Berlim, e uma cidade hierática, sagrada, arcaica e imóvel como Jerusalém?
Esta é a pergunta colocada pelo presidente do Pontifício Conselho da Cultura, o cardeal italiano Gianfranco Ravasi, a propósito do próximo “Átrio dos Gentios”, plataforma da Igreja católica para o diálogo entre crentes e não crentes, que decorre de 26 a 28 de novembro em Berlim.
O que há em comum é o “Átrio dos Gentios”, que em Jerusalém era a parte do templo bíblico aberta aos pagãos, aos estrangeiros, aos diferentes, recorda o prelado.
«O arcebispado de Berlim, a Conferência Episcopal Alemã e o Pontifício Conselho da Cultura pensaram em sediar um “Átrio” análogo precisamente na laica capital da Alemanha unida, lançando assim uma ponte entre história e presente, e entre sagrado e profano», explica Gianfranco Ravasi.
O cardeal lembra o filme “Asas do desejo”, em que o cineasta germânico Wim Wenders quis «fazer voar no céu cinzento de Berlim precisamente um anjo, pronto até a perder as asas da sua imortalidade para estar próximo de uma artista de circo», voltando a traçar a vivência de um ex-anjo, também ele caído numa cidade «aparentemente tão cética».
O Átrio dos Gentios, diferentemente do palácio do poder político e do templo religioso, «não tem filtros de ingresso, portões bloqueados» ou «cúpulas», mas «distende-se, livre, debaixo do céu, deixando que as palavras se cruzem, os ventos soprem e, junto ao crente, se encontre também quem é sem nenhum Deus. Todavia, ambos são pessoas que se colocam questões sobre o sentido das suas vidas: cada um procura um guia moral, interroga-se sobre o universo que o rodeia, confia-se à ciência e à técnica, ama a arte, empenha-se politicamente ou cai na indiferença».
Gianfranco Ravasi prossegue: «Eis porque no Átrio dos Gentios, espaço simbólico implantado em Berlim em várias sedes – Câmara Municipal Vermelha, a Charité [hospital universitário], o Deutsches Theater [teatro], o Bode-Museum [museu], a Parlamentarische Gesellschaft [associação de parlamentares] – vão encontrar-se para dialogar, confrontar-se, talvez também para defrontar-se, crentes cristãos e não crentes, ou crentes de outras convicções, em torno aos temas radicais do ser e do existir.
E no fim, numa surpreendente coreografia, todos se alinharão numa dúplice “procissão discursiva” entre as esculturas do Museu Bode, não certamente para entoar um hino comum, mas para representar de modo visível o significado profundo do diá-lógos, ou seja, do cruzamento – dià – entre dois lógoi, “discursos” com uma identidade, dignidade e profundidade, mas capazes de se enriquecer reciprocamente.
Com este espírito, testemunhado de maneira apaixonada também pelo papa Francisco, de Roma, a cidade do clássico e do cristianismo, também eu ficarei muito feliz por unir-me a este encontro na metrópole que incarna as feridas trágicas do último século, mas ao mesmo tempo o renascimento e as grandes expectativas da Alemanha e da própria Europa.»
O Átrio dos Gentios viaja para Roma, a 5 de dezembro, com uma sessão dedicada ao tema “Solidariedade, dever religioso ou dever cívico?”, e de 9 a 11 de abril de 2014 cruza o Atlântico na direção de Washington, para o encontro intitulado “Democracia, religião e secularismo: as mudanças dos Estados Unidos e do mundo no século XXI”.
Rui Jorge Martins
© SNPC |
23.11.13









