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Quaresma: Regressar de todo o coração ao coração de Deus

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Quaresma: Regressar de todo o coração ao coração de Deus

A Palavra de Deus, no início do caminho quaresmal, dirige à Igreja e a cada um de nós dois convites.

O primeiro é o de S. Paulo: «Deixai-vos reconciliar com Deus». Não é simplesmente um bom conselho paterno, nem sequer uma sugestão; é uma autêntica e própria súplica em nome de Cristo: «Suplicamo-vos em nome de Cristo: deixai-vos reconciliar com Deus».

Porquê um apelo tão solene e fervoroso? Porque Cristo sabe o quanto somos frágeis e pecadores, conhece a fragilidade do nosso coração; vê-lo ferido pelo mal que cometemos e sofremos; sabe quanta necessidade temos de perdão, sabe que nos é necessário sentirmo-nos amados para fazer o bem. Sozinhos não somos capazes: por isso o apóstolo não nos diz para fazermos alguma coisa, mas para nos deixarmos reconciliar por Deus, permitir-lhe perdoar-nos, com confiança, porque «Deus é maior que o nosso coração». Ele vence o pecado e ergue-nos das misérias, se lhas confiarmos. Cabe a nós reconhecermo-nos necessitados de misericórdia: é o primeiro passo do caminho cristão; trata-se de entrar através da porta aberta que é Cristo, onde nos aguarda Ele próprio, o Salvador, e nos oferece uma vida nova e feliz.

Pode haver alguns obstáculos, que fecham a porta do coração. Há a tentação de blindar as portas, ou seja, de conviver com o próprio pecado, minimizando-o, justificando-se sempre, pensando que não se é pior do que os outros; desta maneira, porém, trancam-se as fechaduras da alma e permanece-se encerrado por dentro, prisioneiro do mal.

Um outro obstáculo é a vergonha de abrir a porta secreta do coração. A vergonha, na realidade, é um bom sintoma, porque indica que queremos distanciar-nos do mal; todavia nunca deve transformar-se em temor ou medo.

E há uma terceira insídia, a de nos distanciarmos da porta: acontece quando nos fechamos nas nossas misérias, quando nelas ruminamos continuamente, ligando entre elas as coisas negativas, até nos afundarmos nas profundezas mais negras da alma. Chegamos então até a sermos familiares da tristeza que não desejamos, desencorajamo-nos e ficamos mais frágeis diante das tentações. Isto acontece porque permanecemos sós com nós próprios, fechando-nos e fugindo da luz, enquanto apenas a graça do Senhor nos liberta. Deixemo-nos então reconciliar, escutemos Jesus que diz a quem está cansado e oprimido: «Vem até mim». Não permanecer em si próprio, mas ir até Ele. Nele há alívio e paz.

Nesta celebração estão presentes os “Missionários da Misericórdia”, para receber o mandato de serem sinais e instrumentos do perdão de Deus. Queridos irmãos, que possais ajudar a abrir as portas dos corações, a superar a vergonha, a não fugir da luz. Que as vossas mãos abençoem e voltem a erguer os irmãos e as irmãs com paternidade; que através de vós o olhar e as mãos do Pai pousem sobre os seus filhos e lhes curem as feridas.

Há um segundo convite de Deus, que diz, por meio do profeta Joel: «Regressai a mim de todo o coração». Se é preciso regressar é porque nos afastámos. É o mistério do pecado: afastámo-nos de Deus, dos outros, de nós próprios. Não é difícil darmo-nos conta: todos vemos como nos custa ter verdadeiramente confiança em Deus, confiarmo-nos a Ele como Pai, sem medo; como é árduo amar os outros, em vez de pensar mal deles; como nos custa fazer o nosso verdadeiro bem, enquanto somos atraídos e seduzidos por tantas realidades materiais, que se desvanecem e no fim nos deixam pobres. Junto a esta história de pecado, Jesus inaugurou uma história de salvação. O Evangelho que abre a Quaresma [Mateus 6, 1-6. 16-18] convida-nos a sermos seus protagonistas, abraçando três remédios, três tratamentos que curam o pecado.

Em primeiro lugar, a oração, expressão de abertura e de confiança no Senhor: é o encontro pessoal com Ele, que encurta as distâncias criadas pelo pecado. Orar significa dizer: «Não sou autossuficiente, preciso de ti, Tu és a minha vida e a minha salvação».

Em segundo lugar, a caridade, para ultrapassar a estranheza em relação aos outros. Com efeito, o amor verdadeiro não é um ato exterior, não é dar alguma coisa de forma paternalista para sossegar a consciência, mas aceitar quem precisa do nosso tempo, da nossa amizade, da nossa ajuda. É viver o serviço, vencendo a tentação de se satisfazer.

Em terceiro lugar, o jejum, a penitência, para nos libertarmos das dependências em relação àquilo que passa e exercitarmo-nos para sermos mais sensíveis e misericordiosos. É um convite à simplicidade e à partilha: tirar alguma coisa da nossa mesa e dos nossos bens para reencontrar o bem verdadeiro da liberdade.

«Regressai a mim – diz o Senhor -, regressai de todo o coração»: não só com algum ato externo, mas da profundidade de nós próprios. De facto, Jesus chama-nos a viver a oração, a caridade e a penitência com coerência e autenticidade, vencendo a hipocrisia. A Quaresma seja um tempo de benéfica “poda” da falsidade, da mundanidade, da indiferença: para não se pensar que tudo vai bem se eu estou bem; para compreender que o que conta não é a aprovação, a procura do sucesso ou do consenso, mas a limpeza do coração e da vida; para reencontrar identidade cristã, isto é, o amor que serve, não o egoísmo que se serve.

Coloquemo-nos juntos a caminho, como Igreja, recebendo as cinzas – também nós nos tornaremos cinzas – e tendo fixo o olhar no Crucificado. Ele, amando-nos, convida-nos a deixarmo-nos reconciliar com Deus e a regressar a Ele, para nos encontrarmos a nós próprios.

 

Papa Francisco
Missa de Quarta-feira de Cinzas, 10.2.2016
Trad.: Rui Jorge Martins
Publicado em 11.02.2016 | Atualizado em 17.04.2023

 

 
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«Regressai a mim – diz o Senhor -, regressai de todo o coração»: não só com algum ato externo, mas da profundidade de nós próprios. De facto, Jesus chama-nos a viver a oração, a caridade e a penitência com coerência e autenticidade, vencendo a hipocrisia
A Quaresma seja um tempo de benéfica “poda” da falsidade, da mundanidade, da indiferença: para não se pensar que tudo vai bem se eu estou bem; para compreender que o que conta não é a aprovação, a procura do sucesso ou do consenso, mas a limpeza do coração e da vida; para reencontrar identidade cristã, isto é, o amor que serve, não o egoísmo que se serve
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