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Ser pobre é ser livre, disponível e cheio de compaixão

Um Pobre de Deus é um homem livre. Quem não tem nada, nem quer ter nada, não pode temer nada, porque o temor é um feixe de energias desencadeadas para a defesa das propriedades e apropriações, quando o proprietário as sente ameaçadas. Mas o que é que vai perturbar um Pobre como Jesus, que não fez outra coisa senão varrer os próprios vestígios da sua sombra, e que se dedicou a extirpar afãs de protagonismo, sonhos de grandeza, subtis apropriações? Por isso, vemos Jesus como um profeta incorruptível, como uma testemunha insubornável, absolutamente livre diante dos poderes políticos e autoridades religiosas, diante dos amigos, seguidores e familiares, diante dos resultados do seu próprio ministério, inclusive diante da lei e da religião oficial.

Pois bem: de um homem livre nasce um homem disponível, graças a certos mecanismos misteriosos que apresentam em nós certas constantes como, por exemplo: da negação nasce a afirmação; do desprendimento, a doação; da pobreza, o amor; da morte, a vida. Em suma, as energias conaturais encadeadas na grilheta do egoísmo, quando livres das cadeias, ficam disponíveis para o serviço dos outros.

E assim nasce o Servidor. Se o profeta não começa por desprender-se, despojar-se, desapropriar-se, isto é, por fazer-se pobre, não pode servir a ninguém. Pelo contrário, subtil e camufladamente, serve-se de tudo e de todos. Por exemplo: um profeta pode entregar a sua vida pelo povo, mas, eventualmente, sem dar por isso, pode transformar o povo numa plataforma para se projetar a si mesmo e para se sentir realizado: parece servir o povo mas serve-se dele.

Conclusão? Só um homem puro, só um Pobre pode servir os pobres. Qual é, então, o mistério final e vivo do Pobre de Nazaré? O caminho que vai da pobreza ao amor. Por outras palavras, quem é Jesus de Nazaré? Alguém pobre-livre-disponível-servidor, que percorreu o caminho da pobreza ao Amor.

Com quem exerceu Jesus a sua misericórdia e o seu serviço? Com os pobres, preferencialmente. Mas a palavra pobre era uma expressão ambígua tanto naquela como em qualquer outra época. Então, agora e sempre, evoca um mosaico enorme e multicor que inclui todos os carentes de categorias pessoais.

Pobres eram os perseguidos, os leprosos, os esmagados por toda a espécie de necessidades e problemas quotidianos, as multidões errantes e esfomeadas, os ignorantes em matéria da Lei. Pobres eram os doentes, os cegos, os aleijados, os inválidos, os coxos, os paralíticos. Pobres eram os pecadores, as mulheres de vida duvidosa, os cobradores de impostos, os possessos de espíritos imundos. Pobres eram os pequenos, os insignificantes, as mulheres em geral, as crianças. Essa foi a ampla plataforma sobre a qual Jesus estendeu os seus braços de misericórdia e derramou, às mãos cheias, saúde e pão.

A primeira reação do Pobre perante o sofrimento dos pobres era a compaixão. E a compaixão – outro termo equívoco – é um movimento vital, estremecido, que se origina e sobe desde as profundidades, desde os intestinos e o ventre. Algo visceral, que afeta todo o sistema neurovegetativo, como um rio que flui pelas entranhas e, em geral, se reflete em todas as zonas somáticas onde existem grandes acumulações de fibras nervosas, como o coração, o estômago, os pulmões, os intestinos.

A compaixão pode ser também fruto de uma determinada maneira de ser. Bem sabemos que Jesus era sensível por temperamento, a ponto de derramar lágrimas. O ser humano, entretanto, pode chorar também por si mesmo, por autocompaixão. Mas na verdadeira compaixão o que há, essencialmente, é um esquecimento de si, como no caso de Jesus, que, quando se comovia, e às vezes até chorava, fazia-o sempre pelos outros.

Há muitas passagens do Evangelho que atestam que, pobre como era, Jesus era incapaz de autocompaixão e não se preocupava mesmo nada consigo mesmo, como se observa nos acontecimentos da Paixão. Em resumo: a compaixão é uma paixão desencadeada pela dor alheia, uma reação de simpatia de um coração que sai de si e se dirige ao outro, uma emoção que deriva do facto de sentir e sofrer com o pobre.

Veja-se de que maneira estas características se refletem nos seguintes textos: Mateus 9,36; 14,14; 20,34; Marcos 1,14; 6,34; 8,2; Lucas 7,13.

A compaixão, por outro lado, não é apenas um sentimento. Mais do que tudo, é o motor que impelia Jesus a dar passos concretos e práticos na solidariedade e na misericórdia. Utilizava o seu poder, mediante intervenções extraordinárias, para eliminar ou solucionar aquele mal que lhe causava tanta pena, transformando-se desta maneira num libertador de todo o sofrimento, num redentor de toda a dor.

 

Ignacio Larrañaga
In O pobre de Nazaré, ed. Paulinas
25.06.13

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