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Uma nova oportunidade para o Evangelho

"Uma nova oportunidade para o Evangelho - Para uma Pastoral de Gestação", dirigido por Philippe Bacq e Christoph Theobald, propõe uma releitura das «evoluções culturais contemporâneas, abandonando deliberadamente toda a interpretação em termos de crise, de perda de valores, de desaparecimento da religião ou de dissipação da fé».

«O que está em jogo na nossa sociedade e na Igreja é deixar-se «gerar» para essa vida nova, graças à Palavra de Deus, que ressoa nos relatos primordiais. A "pastoral de gestação" tem a sua fonte de inspiração nesta convicção de fé», explica a introdução da obra recentemente lançada pela Paulinas Editora.

Do volume, que «deseja suscitar, nas paróquias, nos movimentos e nas diversas equipas pastorais um acréscimo de criatividade», apresentamos um excerto centrado na espiritualidade "experiencial" e bíblica que o agente pastoral é convidado a assumir antes de anunciar o Evangelho.

 

Onde a experiência pessoal de Deus se prende às realidades quotidianas

Tanto transmitir uma espiritualidade como transmitir a fé faz-se mais transmitindo a sua própria experiência de Deus do que fazendo belos discursos sobre Ele. Isso convida-nos a ver de forma diferente o quotidiano, a procurar nele a própria mentalidade, as próprias aspirações, as próprias atitudes fundamentais, os próprios preconceitos, as próprias forças e limitações, com um espírito de discernimento.

Essa busca de identidade pessoal e espiritual consiste numa diligência, nunca terminada, de unificação do próprio ser, de encontrar o sentido para a própria existência. Ela repousa sobre o universo de crenças e de valores de cada um, nas suas referências éticas; na visão do mundo que cada indivíduo é chamado a nomear, a identificar, a avaliar, e da qual é chamado a apropriar-se, para afirmar a sua unicidade espiritual.

Se a vida espiritual pretendida é «aquela que faz bem, que traz qualquer coisa mais à realização das potencialidades de cada indivíduo, que assegura a paz interior, a reconciliação consigo mesmo, a calma e o equilíbrio» , não se deverá dizer que a experiência humana se torna o lugar e o espaço onde Deus fala e atua?

O mundo ambíguo e complexo em que nós vivemos leva as mulheres e os homens a procurarem ultrapassar-se a si próprios no sagrado, e torna-se, para os homens e mulheres cristãos, um lugar onde se cumpre a história enquanto dom de Deus. Crer na ação de Deus é crer que Ele conduz a história, que Ele se preocupa por cada pessoa, a quem dá o ser e a vida, a liberdade e a alegria.

Na nossa sociedade secularizada, Deus faz cada vez menos sentido para muitos, mas professar a própria fé em Deus é reconhecer que Ele abre a humanidade a uma vida nova no Espírito. Ora a pedagogia divina, toda a sua presença no coração da história do povo hebreu, ensina-nos que Deus só se comunica através da experiência. Importa, portanto, iniciar as pessoas ao mistério, mediante uma experiência de fé, ocupando esta o centro da caminhada espiritual.

Para permitir que os outros construam a sua própria identidade crente, é essencial, para o agente de uma pastoral (...), deixar ressoar nele a Palavra da Escritura, antes de anunciá-la.

Os relatos iniciais da Bíblia, bem como os relatos de vida, ocuparão um lugar preponderante no seu crescimento espiritual. É verdade que cada pessoa terá os seus métodos pessoais de ler a Escritura, de meditá-la, de se deixar impregnar por ela para transformar a própria vida e inspirar as suas ações.

Embora todos os textos sagrados sejam inspirados, certos livros, entre os quais os Evangelhos e os livros sapienciais, abrem mais a porta a uma espiritualidade do quotidiano. Eles dizem mais respeito à vida, à criação e ao Deus criador que prodigaliza as suas bondades à humanidade. Eles valorizam uma nova arte de viver, uma dinâmica de libertação que brota das correntes mais próximas da modernidade.

No nosso mundo de tendência «individualizante», a espiritualidade preconizada pelos escritos sapienciais ensina as pessoas a ligarem-se a Deus, tentando compreender-se a si próprias. Esta herança bíblica convoca a pessoa a descobrir a sua sabedoria interior, a apreender o seu meio de vida como revelação do amor criador.

A visão positiva apresentada pela tradição de sabedoria favorece mais uma espiritualidade de encarnação e da criação, do que uma espiritualidade da redenção. Nela se apresenta a grandeza da pessoa humana, imagem de Deus, o valor do respeito para com ela, a importância da salvaguarda da natureza como dom de Deus.

As referências ao corpo, à qualidade de vida, ao bem-estar e à harmonia inspiram uma espiritualidade bem encarnada.

Se nos virarmos para o Evangelho, constataremos o quanto o quotidiano ali é central; ele fala do corpo, dos sentidos... aí se encontram a boca, o nariz, os olhos, as mãos e, sobretudo, os pés. É sempre o visível que nos é apresentado e é através dele que, por vezes, passa o invisível, o sopro, o vento, o Espírito.

Ler o Evangelho é entrar em contacto com pessoas, com situações, com objetos de todos os dias: um copo, um cântaro, espigas de trigo, palavras de todos os dias, palavras da vida comum, um vocabulário concreto.

É através de todo este quotidiano, diferente para cada pessoa, que surge a vida espiritual, que ela cresce, que ela alimenta a pessoa e todos os que a rodeiam.

Uma espiritualidade evangélica respeita a humanidade de Jesus, que quis ser «em tudo igual aos homens», e não se inspira unicamente no Jesus pós-pascal. Uma espiritualidade de gestação, que favorece a expressão pessoal, olha para Jesus na sua caminhada, naquilo que Ele viveu junto dos seus, naquilo que Ele diz e faz, na sua busca pessoal e nas suas descobertas, nas realidades dos seus sofrimentos, das suas dúvidas e da sua morte.

Jesus está seguro do amor e da ternura de seu Pai e, para Ele, essa ternura é a única capaz de libertar os seres humanos, de fazê-los nascer para o amor. Ler o Evangelho com esses olhos permite descobrir como Jesus não autoriza a fuga do coração, da afetividade, das relações, da condição humana.

É certamente importante conhecer a exegese, mas mais ainda ler e meditar a Escritura para refletir sobre o sentido da existência, da própria existência, e sobre a própria necessidade fundamental de transcendência. Estes textos também levantam a questão fundamental do sofrimento, do fracasso, do mal e da finitude humana.

Embora vivamos numa sociedade desenganada, deprimida e que sofre as consequências de uma crise de valores, não podemos ignorar os aspetos mais difíceis e mais radicais da mensagem evangélica. Também é do ponto de vista menos sedutor de tais realidades que a libertação interior e a transformação em profundidade devem ser analisadas.

Índice

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Esta transcrição omite as notas de rodapé.

 

In Uma nova oportunidade para o Evangelho, ed. Paulinas
© SNPC | 27.05.13

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Capa

Uma nova oportunidade
para o Evangelho

Direção
Philippe Bacq
Christoph Theobald

Editora
Paulinas

Ano
2013

Páginas
264

ISBN
978-989-673-310-0

 

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