Porto
Universidade Católica evoca poeta Guilherme de Faria
A Cátedra Poesia e Transcendência e o Centro de Estudos do Pensamento Português da Universidade Católica Portuguesa (Porto) evocam a 4 de janeiro a memória do poeta Guilherme de Faria, no 85.º aniversário da sua morte.
A sessão conta com intervenções de José Carlos Seabra Pereira (Universidade de Coimbra), Maria João Reynaud (Universidade de Coimbra), José Pedro Angélico (Universidade Católica) e José Rui Teixeira, responsável pela cátedra “Poesia e Transcendência” e membro do Secretariado da Pastoral da Cultura da diocese portuense, além de outros participantes.
Durante o encontro, com entrada livre, será apresentado o livro "Os versos de luz por escrever. Vida e obra de Guilherme de Faria", de José Rui Teixeira, que desde 2006 recupera documentos do espólio do poeta, reedita a sua poesia e organiza e participa em iniciativas académicas.
Guilherme de Faria nasceu a 6 de outubro de 1907, em Guimarães, tendo-se mudado com a família para Lisboa em 1919. A 4 de janeiro, com 21 anos, suicidou-se na Boca do Inferno, conjunto de escarpas junto ao oceano Atlântico, próximas de Cascais.
Publicou sete livros de poesia: "Poemas" e "Mais Poemas" (1922), "Sombra" (1924), "Saudade Minha" (1926), "Destino" e "Manhã de Nevoeiro" (1927) e, editado postumamente, "Desencanto" (1929).
Também póstuma, mas organizada de acordo com as suas indicações, foi a edição em 1929 da antologia "Saudade Minha (poesias escolhidas)", reeditada em 2007.
Publicou ainda "Oração a Santo António de Lisboa" (1926) e organizou uma "Antologia de Poesias Religiosas", que só seria lançada em 1947.
A poesia de Guilherme de Faria compreende-se no contexto do Neo-Romantismo lusitanista e do Saudosismo integralista, e habita o âmago da tradição lírica portuguesa.
Poeta de um passadismo nocturno, elegíaco e doce que só se realiza em diálogo com a morte redentora, Guilherme de Faria acabou por ser esquecido, devido à sua morte tão prematura, às especificidades quase anacrónicas da sua poesia e à proximidade ideológica ao Integralismo Lusitano.
O encontro decorre nas instalações do Porto (Foz) da Universidade Católica Portuguesa (auditório Carvalho Guerra).
Programa
10h00
Abertura
Manuel Vaz, presidente do Centro Regional do Porto da Universidade Católica Portuguesa; José Rui Teixeira, diretor da Cátedra "Poesia e Transcendência"
10h30
Conferência: À esquina da vida, um ímpeto de voo [a condição neo-romântica de Guilherme de Faria]
José Carlos Seabra Pereira, Univerisdade de Coimbra
11h00
Conferência: Diálogo entrecortado entre Guilherme de Faria e Afonso Lopes Vieira
Cristina Nobre, Instituto Politécnico de Leiria
12h00
Apresentação do livro "O Livro de Guilherme de Faria I. Saudade Minha [poesias escolhidas]"
José Rui Teixeira
15h00
Conferência: A saudade, o amor e a dor em «Sombra» [1924]: aproximação à poesia de Guilherme de Faria
José Pedro Angélico
15h30
Conferência: António Nobre, Guilherme de Faria e Mário de Sá-Carneiro: teias contextuais, intertextuais e intratextuais [1890-1930]
José Rui Teixeira
16h30
Apresentação do livro "Os versos de luz por escrever. Vida e obra de Guilherme de Faria", de José Rui Teixeira
Henrique Manuel Pereira, Universidade Católica
17h00
Recital de Poesia: Henrique Manuel Pereira (Universidade Católica), Sofia Lourenço (Universidade Católica)
Poesia de Guilherme de Faria
Confissão
Noite… Vejo, na sombra, os astros a fulgir… –
Alma da luz, imersa em funda escuridão,
Oh noite, vem ouvir
A minha confissão!
Tu és a treva eterna e misteriosa,
E eu sou a luz jamais amanhecida:
Sombra de horror, sonâmbula e saudosa
Da luz duma outra vida.
[…]
E sendo sombra, humana escuridão,
Quero ascender em frémitos de chama,
E ser vida de eterna redenção,
Ser a bênção de amor que o sol derrama!
Ser a névoa dum sonho, a errar, longe de tudo…
Ser a voz da oração, a ânsia dum voo…
– Mas eu quero viver, quero ser tudo,
Só não quero, Senhor!, ser o que sou!
Exaltação
Nestas horas de apática indolência,
Cansado de viver, esqueço a vida;
Mas a minha alma vive, adormecida,
Uma vida divina de inconsciência.
Revivo, então, as horas encantadas
E as lembranças que o tempo não dilui
Mas deixa, na memória, eternizadas;
E, de absorto num outro que já fui,
Nem posso ver as coisas mais vulgares,
No seu vulgar aspecto e nitidez:
Vejo a névoa pairando pelos ares,
Que tudo em névoa e bruma se desfez.
E, altas horas da noite, quando cismo,
Longe de mim, na minha solidão,
Vejo surgir, da sombra em que me abismo,
A tua graça ideal de Aparição.
Sombra humana que sou, sombra perdida,
E que, por fim, serei inútil pó disperso,
Vejo, no teu olhar, a luz anoitecida
Na sombra do meu berço!
Mas pressinto que é falso o teu fulgor,
Que em sonhos alvorece, e empalidece enfim…
– Muito embora! – O meu sonho – o teu Amor –
Eternamente há-de viver em mim!
…
Quem és, Visão de há tanto aparecida
Na escura solidão, que é a minha sorte?
– És, num sonho de amor, a eterna luz da vida;
És a vida que vai, sonhando, para a morte.
© SNPC | 21.11.13 | Atualizado em 03.01.14







